Por Liliane Suguisawa1
As medidas de ultra-sonografia proporcionam o conhecimento do nível de musculosidade e do acabamento da carcaça do animal através da mensuração da área de olho-de-lombo (AOL) e da espessura da camada de gordura subcutânea (ECG) no animal vivo.
Sob o ponto de vista do melhoramento genético de características de carcaça, esta técnica apresenta a vantagem de poder ser obtida diretamente no animal a ser selecionado evitando a demora e os gastos elevados dos testes de progênie, e de possibilitar a obtenção de medidas em grande número de animais, podendo então ser aplicada em provas de ganho de peso onde animais elite são selecionados para fins de reprodução.
Estas medidas podem ser incluídas em programas de seleção de bovinos que visam a produção de animais com maiores rendimentos cárneos para atender à necessidade de melhoramento do rebanho nacional.
Todo programa de melhoramento genético baseia-se na seleção de animais superiores para as características desejáveis, e que também sejam aptos à passar estas características eficientemente para sua progênie. Para tanto, faz-se sempre o uso de dois parâmetros, a herdabilidade (que indica o quanto a característica é realmente herdável) e as correlações genéticas (que indicam o quanto a seleção para uma característica influencia em outras). Portanto estes são os dois parâmetros que precisam ser conhecidos para o delineamento de um programa de seleção.
Há diversos trabalhos na literatura estimando os coeficientes de herdabilidades das características de carcaça, sejam estes obtidos através de experimentos previamente delineados ou por dados de campo. O interesse da comunidade científica em estimar os parâmetros genéticos para as medidas ultra-sonográficas feitas nos animais vivos tem crescido recentemente, na medida em que estas se consolidam como uma boa alternativa para predição das características de carcaça no momento do abate.
Apesar de ainda se encontrar uma certa variação nas estimativas de herdabilidade para as características de carcaça os valores encontrados (Tabela 1) indicam que as características de carcaça mensuradas por ultra-sonografia e as predições da produção de carne têm variabilidade genética, e que a seleção baseada na avaliação genética por análises de modelos mistos pode levar a progressos genéticos nestas características.
A Associação Americana de Angus em parceria com a Universidade de Iowa recentemente completou estudos designados a análise e comparação das medidas por ultra-sonografia com as características da carcaça obtidas no momento do abate. Esta pesquisa é baseada em trabalhos prévios demonstrando que a ultra-sonografia detecta nos bovinos jovens e as mesmas características que são medidas nos novilhos aos 16 e 18 meses de idade nos frigoríficos. Este estudo contabilizou medições ultra-sonográficas de 38.000 tourinhos, novilhas, e novilhos. A correlação genética entre as medidas de ultra-sonografia, e a diferença esperada na progênie (DEP) quanto às características da carcaça para marmorização, AOL e ECG foram de 0,77; 0,71 e 0,75, respectivamente.
Estes dados sugerem fortemente que se trabalha com as mesmas informações nas medições ultra-sonográficas e nas medidas obtidas na carcaça. Já se sabe que a correlação entre ECG por ultra-sonografia e o rendimento de cortes cárneos é negativa, assim à medida que há seleção para o incremento da ECG, há diminuição do rendimento de cortes cárneos na progênie nas condições norte-americanas (Robinson et al., 2001).
Além disso, a correlação genética entre marmorização e ECG tem sido muito baixa, sugerindo que a seleção para aumentar a marmorização pode ser obtida sem incremento na ECG do animal (Iowa State University & American Angus Association, 1999).
A utilização das medidas ultra-sonográficas em programas de avaliação genética, tanto nacional quanto internacional, proporcionará redução nos custos e no tempo necessário para obtenção acurada das estimativas de mérito genético da AOL e da ECG, comprovando com isto sua grande aplicação prática. Ainda, como os testes de progênie para as características de carcaça também se mostram limitados por proporcionarem avaliações acuradas de apenas uma amostra viciada de poucos animais, e também pouca informação sobre as fêmeas, a adição dos dados de ultra-som dos animais vivos, proporcionarão a oportunidade não só de avaliar amostras maiores e mais casualizadas de touros dentro de uma população, mas também avaliar o potencial genético das fêmeas (Crews & Kemp, 2002).
A incorporação das medidas ultra-sonográficas realizadas em tourinhos jovens pode afetar a taxa de mudança genética nos programas de melhoramento genético, influenciando o intervalo de gerações, a exatidão e também a intensidade de seleção (Devitt & Wilton, 2001).
Desta maneira, a utilização do ultra-som como ferramenta nos programas de melhoramento genético de bovinos de corte no Brasil se apresenta como uma alternativa muito promissora para o melhoramento das características de carcaça.
Tabela 1. Coeficientes de herdabilidade das medidas ultra-sonográficas de AOL e ECG segundo vários autores.
Referências Bibliográficas
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1Liliane Suguisawa é doutoranda em Nutrição e Produção Animal – UNESP/Botucatu