Na terça-feira dessa semana (23/12) o mundo teve uma surpresa: a confirmação de um caso de vaca louca nos EUA. Até o momento 25 países baniram as importações de carne bovina dos Estados Unidos. A descoberta de apenas um caso, em uma vaca da raça holandesa no país que tem o melhor sistema de defesa animal do mundo e rápida reação dos grandes compradores de carne do mundo merece um reflexão por parte do Brasil, maior exportador de carne do mundo em 2003.
Algumas comparações podem ser feitas e acredito que esse é um excelente momento para o Brasil aprender com os problemas dos outros países, em busca de se firmar como maior exportador de carne do mundo.
Os EUA abatem em torno de 35 milhões de cabeças por ano e testaram em 2002 mais de 20 mil animais para EEB. O Brasil abate número semelhante e testou no mesmo ano em torno de 6 mil animais. Ambos os países até 23 de dezembro estavam classificados como risco 1, isto é, o mais baixo risco, com baixíssimas chances de ocorrência da doença. Vale lembrar que vários fatores são considerados para se elaborar essa classificação, entre eles: sistema de produção, tipo de alimentação animal, sistema de produção de farinha de carne, número de animais importados de países com casos da doença confirmados, possíveis importações de farinha de carne de países onde a doença já se manifestou, etc.
O Brasil tem a seu favor o sistema de produção, que é predominantemente a pasto. No entanto, até pouco tempo atrás era permitida a utilização de cama de frango na alimentação de bovinos, o que é um risco de possível disseminação da doença. Outro ponto negativo é o número de animais importados de países com incidência da doença, especialmente de Europa.
Qual o melhor posicionamento do Brasil neste momento? Comemorar que somos um país livre da doença, temos um sistema de produção impecável, excelente produção de carne e que o estabelecimento do país como líder absoluto no comércio mundial de carne é apenas uma questão de tempo? Se analisarmos o que dizem os principais órgãos de imprensa brasileira, talvez essa seja a leitura.
Acredito, no entanto, que a confirmação do caso de EEB nos EUA sirva para reafirmar nossa necessidade de forte atenção e vigilância. O Brasil deve reforçar seu sistema de defesa animal, que parece estar sendo deixado de lado nos últimos tempos (veja a declaração dos presidentes da ABIEC e da SRB em notícia publicada hoje – 26/12 – no BeefPoint).
Os acontecimentos recentes só têm favorecido o Brasil e o momento é muito propício para fortalecermos a posição alcançada e planejar o futuro. O caso de vaca louca no Canadá e nos EUA esse ano indicam que mesmo um país com baixo risco pode ter problemas. E apesar de não haver nenhuma relação, o caso de EEB nos EUA serve para relembrar a necessidade de grande atenção ao controle e erradicação da aftosa e de outras doenças como brucelose e tuberculose. Ser o maior exportador de carne bovina do mundo tem como pré-requisito básico um status sanitário impecável.
O Brasil tem visto sua participação no mercado mundial da carne bovina crescer muito nos últimos 3 anos, principalmente devido a problemas de países concorrentes como Argentina (aftosa), Austrália (seca), Europa (aftosa e EEB), Uruguai (aftosa), etc. E também graças à grande desvalorização do câmbio. O caso de EEB nos EUA é mais um infortúnio de outros países, que está longe de merecer comemoração, que deve servir de alerta ao Brasil.
É provável que demore alguns longos meses para que a exportação de carne americana volte ao normal, mas ao que tudo indica o mercado interno não será muito afetado, uma vez que associações de produtores estão fazendo um excelente trabalho junto à mídia e o consumidor, como foi feito no Canadá esse ano, onde o consumo interno aumentou. Além disso, os exemplos de como outros países lidaram com casos semelhantes dá um bom indicativo sobre que caminho tomar.
Mesmo sendo um caso isolado e que há risco baixíssimo de contaminação, uma vez que cortes de carne não transmitem a doença, os EUA terão que utilizar toda sua capacidade e força de negociação para remover essas barreiras o mais rápido possível. Um bom exemplo é o Canadá, que até hoje não conseguiu recuperar todos os mercados que atendia até maio de 2003.
Serve como um aviso extra para o Brasil que, além de investir em promoção no exterior, uniformidade da produção, aumento da qualidade (itens ainda bastante incipientes na produção de carne bovina brasileira), é preciso ter cada vez mais atenção à sanidade de nosso rebanho. Para se perder o status de “livre de EEB” só é preciso uma vaca caída no estado de Washington e para se recuperar esse status vai levar muito tempo, trabalho e dedicação, que os EUA podem dispor, mas que custariam muito ao Brasil.
0 Comments
Parabéns Miguel por suas palavras: “O caso de EEB nos EUA é mais um infortúnio de outros países, que está longe de merecer comemoração, que deve servir de alerta ao Brasil”.
Assim deveriam ter falado os que açodadamente opinaram sobre o assunto.
Reforçar medidas preventivas sim, por essa e por outras endemias, principalmente a nível de abatedouros. Nestes, sim, é preciso estar de olho aberto.
O complicometro dos brincos e papelada, pouco adianta, salvo para os beneficiados com os novos cartórios.
Grande abraço
Muito bom e muito realista o posicionamento do Miguel quanto a este assunto. devemos encarar desta forma e não comemorar vitórias antes da hora certa.
Parabéns.