Por Carlos Vladimiro Málaga Peña 1
Nas últimas décadas a gestão da segurança alimentar tem apresentado grande evolução. Novos conceitos e abordagens quanto à segurança alimentar têm sido desenvolvidos. Hoje, a indústria de alimentos não é apenas responsável pela produção de alimentos seguros, papel sempre reconhecido, mas também por demonstrar de maneira transparente como o programa de segurança alimentar foi desenvolvido (Motarjemi, 2005).
Segundo Motarjemi (2005) a proporção de perigos é ampla e os desafios de segurança alimentar que a indústria tem que atender enorme. Satisfazer as exigências de segurança alimentar é freqüentemente complicada pela influência de fatores tais como: considerações sócio-econômicas percepção e práticas adotadas pelo consumidor.
Portanto, garantir a segurança dos alimentos em um mundo cada vez mais complexo resulta uma tarefa formidável. Para alcançá-la de maneira eficiente e efetiva, exige-se o esforço combinado de vários setores e.g. associações de consumidores, autoridades governamentais e indústrias (produção primária, processadores, produtores, distribuidores e transportadores) num conceito que a Organização Mundial da Saúde descreve como Responsabilidade Compartilhada (Motarjemi, 2005).
Desta forma, é necessário manter especial atenção quanto à validação e manutenção do sistema, procurando aplicá-lo não apenas de maneira burocrática, cumprindo com exigências legais, mas sim inculcá-lo dentro da organização como uma atividade contínua e permanente.
O APPCC é uma forma de pensamento e de trabalho; é um conceito e como tal, deve ser empregado de maneira habitual de forma a integrar-se na cultura organizacional. Contudo, ainda resta um longo caminho a percorrer, quando a real aplicação desta ferramenta na gestão contínua da segurança alimentar ao nível de indústria (Motarjemi, 2005).
Antes de tratar sobre validação é importante notar que o sistema APPCC concentra-se apenas na segurança do produto (inocuidade do alimento) e prévio a sua implementação devem existir programas considerados de suporte (pré-requisitos: BPF; PPHO), claros e apropriados para o desenvolvimento e implantação de um sistema efetivo e de fácil aplicação.
A validação está relacionada com a obtenção de evidência onde, os elementos do plano APPCC demonstrarão ser efetivos, deste modo, a validação deve ser alcançada através da avaliação de dados técnicos e científicos, reunidos e empregados na elaboração do plano.
Para garantir eficazmente a realização do processo de validação, o responsável pela segurança dos produtos na indústria (normalmente o gerente geral) deve formar a equipe de validação, que tem por objetivo garantir a conclusão e a correta identificação dos perigos bem como, seu controle eficaz sob a proposta do plano. A equipe deve estar constituída por representantes da equipe originalmente designada para o desenvolvimento do plano e por funcionários da unidade operacional que serão responsáveis pela sua execução.
Esta tarefa auxilia com o processo de transferência de responsabilidade da equipe que elaborou o plano para a equipe que executará o mesmo na rotina diária. Para referência futura, a composição da equipe de validação bem como, as atividades realizadas deverão estar claramente registradas e devidamente arquivadas, constituindo documentos que comprovam sua execução.
Indicar a conclusão satisfatória dos trabalhos é responsabilidade da pessoa responsável final pela segurança dos produtos.
Para alcançar os objetivos da validação torna-se necessário examinar de forma crítica:
1. A evidência usada para o estudo e,
2. As medidas de controle propostas (medidas preventivas, monitoramento e ações corretivas).
A validação da evidência que fundamenta o estudo deve proporcionar a justificativa da escolha dos perigos significativos e das medidas de controle propostas. Tal evidência que alicerça a seleção dos perigos significativos pode proceder de fontes variadas: literatura científica, associações de comércio, órgãos reguladores, dados históricos, conselhos profissionais ou da experiência própria. Esta deve justificar tanto a inclusão como a exclusão de todo perigo considerado pertinente durante a análise.
Segundo Motarjemi (2005), na gestão da segurança alimentar, a academia exerce um papel valioso e essencial, que consiste em:
1. Fornecer informação científica (e.g. identificação de perigos)
2. Desenvolvimento de novos métodos analíticos
3. Fonte independente de informação.
Exemplos disto são os trabalhos publicados por Lopes (2002), André (1999), Silva (1999).
A evidência de apoio, necessária para demonstrar que os valores alvo estabelecidos e os limites críticos controlarão adequadamente os perigos identificados em um nível onde a empresa cumpra com as exigências para os produtos seguros, deve ser alcançada utilizando as mesmas fontes já usadas para a escolha dos perigos e também, através da experimentação prática, que é o processo onde as propostas para o controle dos perigos são postas à prova (desafio) quanto a sua efetividade e.g. inspeção de lotes produzidos (100%), modelos matemáticos de crescimento microbiano e outros.
Para atender com o segundo objetivo, a validação das medidas de controle consiste, na verificação (cruzamento de informação) entre dados coletados para o estudo APPCC e do fluxograma de processo, garantindo que os PCC foram corretamente identificados e que os valores alvo, limites críticos e procedimentos de monitoramento estão adequados (incluir: metodologias, freqüência, valores aceitáveis, ações corretivas em caso de desvio dos limites críticos).
Esta validação deve garantir que as ações tomadas em caso de desvios do processo resultarão na adequada segregação dos produtos que não atingirem conformidades, assegurando que não alcancem o consumidor quando houver comprometimento da inocuidade. Junto às responsabilidades pelas ações corretivas e sobre o futuro dos produtos afetados bem como, mecanismos que assegurem a realização de ações para prevenir recorrências.
A continuação à figura 1, segundo Kirby (1999), mostra a seqüência do desenvolvimento e implantação do sistema APPCC.
Uma vez estabelecido o plano e seus elementos validados, é importante garantir o seu cumprimento na prática. Assim, a verificação é um processo contínuo similar ao monitoramento, normalmente realizado com menos freqüência, onde o objetivo é observar não apenas pontos específicos, mas de fato, o sistema como um todo.
Assim, o processo é descrito como a sistemática reunião e avaliação de informação (em especial das áreas problema) que demonstre a conformidade do plano e sua efetividade prática.
O processo de verificação, realizado com apropriada freqüência, deve prover a ratificação da efetividade do sistema e assegurar que seu funcionamento contínuo seja cumprido.
Quando não se podem demonstrar conformidades com o plano, existem duas ações a serem tomadas:
1. Reforçar a supervisão na aplicação do plano e
2. Modificar/aprimorar o monitoramento/métodos de controle para facilitar seu cumprimento.
O propósito da conformidade com o sistema é propiciar confiança na competência da indústria, alcançada ao demonstrar que os procedimentos e protocolos estabelecidos estão sendo satisfatoriamente cumpridos.
Como resultado do processo de verificação poderá se obter informações novas (desde que: quantificáveis e objetivas) para serem usadas na validação de mudanças do plano, denotando o dinamismo do sistema na contínua procura no aprimoramento na implementação do APPCC.
O sistema APPCC quando satisfatoriamente elaborado e implementado mostra ser uma útil ferramenta na gestão e controle da segurança dos produtos alimentícios. Difundido e reconhecido no âmbito do comércio mundial respeitando os princípios de equivalência.
Devemos recordar que instalações produtoras de alimentos têm elaborado alimentos seguros por muitos anos antes do advento do sistema APPCC. O sistema desenvolvido deve utilizar a experiência prática adquirida através do tempo. Assim, dados históricos de sistemas de qualidade preexistentes, incluindo BPF, monitoramento de CQ, reclamações de clientes e consumidores e exames em produtos acabados, podem ser usados como evidência para o processo de validação (Kirby, 1999).
Referências bibliográficas
ANDRÉ, M.C.D.P.B; SERAFIN, A. B; VIEIRA, J. D. G. at alli. Aspectos higiênico-sanitários de utensílios em salas de abate de matadouros de Goiânia. Hig. Alim. v. 13, p. 68-72, 1999.
KIRBY, R. Validation and Verification of HACCP. 2a ed. Belgium, ILSI Press. 1999.
LOPES, C. M.M. & OLIVEIRA, C.A.F. Avaliação de contaminação microbiana superficial de carcaças em diferentes etapas do abate de bovinos e suínos. Hig. Alim. v. 16, p. 71-75, 2002.
MOTARJEMI, Y. & MORTIMORE, S. Insdustry´s need and expectations to meet food safety, 5th International Meeting: Noordwijk Food Safety and HACCP Forum 9-10 December 2002. Food Control. v. 16, p. 523-529, 2005.
SILVA. J. A. Sanitização da carne bovina com ácidos orgânicos. Parte II. Hig. Alim. v. 13, p. 37-43, 1999.
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1Carlos Vladimiro Málaga Peña é Médico Veterinário, mestrando em Ciência e Tecnologia dos Alimentos pela Universidade Federal de Santa Maria, RS