No que depende dos frigoríficos brasileiros, os investidores não têm do que se queixar neste início de 2019. Impulsionado pela JBS, a maior indústria de proteínas animais do mundo, o valor de mercado das empresas de carnes que compõem o Ibovespa – grupo que também inclui Marfrig e BRF – aumentou R$ 8,9 bilhões desde o fim de 2018. Juntas, as três empresas valem atualmente R$ 61,7 bilhões, o que significa um crescimento de 16,9% ante os R$ 52,8 bilhões do fim de dezembro.
A trajetória positiva não está descolada do ambiente geral, mas as valorizações de JBS e Marfrig são bastante superiores à do Ibovespa. Embalado pela agenda reformista do governo Bolsonaro, o Ibovespa registrou alta de 6,2% no ano até ontem. Os papéis de JBS e Marfrig, por sua vez, subiram 23,6% e 10,4%, respectivamente. As ações da BRF subiram menos (5,8%), mas por causa do tombo de ontem, motivado pela frustração dos investidores com os resultados de seu plano de venda de ativos . O valor de mercado da JBS, cujas ações sobem 46,3% nos últimos 12 meses, chegou a R$ 39,1 bilhões, o da Marfrig atingiu R$ 3,7 bilhões e o da BRF alcançou R$ 18,8 bilhões.
Em geral, as valorizações também teriam sido mais intensas não fosse o banho de água fria de quarta-feira, quando o Ibovespa teve o pior pregão desde a greve de caminhoneiros, caindo mais de 3% em meio aos receios com a forma escolhida pelo governo para encaminhar a reforma da Previdência. A desconfiança também contaminou as ações dos frigoríficos, reduzindo a magnitude da valorização no ano – até terça-feira, a JBS acumulava alta de quase 30% desde dezembro.
De qualquer maneira, a valorização da ações de JBS, Marfrig e BRF foi significativa. De acordo com analistas consultados pelo Valor, a recuperação dos papéis das três empresas reflete a melhora no ciclo de produção de carne de frango no Brasil – dona de Sadia e Perdigão, a BRF é líder nas exportações mundiais dessa proteína – e o excepcional momento para a indústria americana de carne bovina. As margens dos frigoríficos nos Estados Unidos, que em tempos normais ficavam em torno dos 4%, estão mais perto dos 10%.
Nesse caso, a maior beneficiada é a JBS, que disputa a liderança do mercado americano de carne bovina com Tyson Foods e Cargill. Com a compra da National Beef em 2018, a Marfrig também passou a participar da festa americana. O negócio deu à empresa fundada por Marcos Molina o controle do quarto maior frigorífico de carne bovina dos EUA e, de quebra, fez dela a segunda maior empresa do segmento no mundo, atrás apenas da JBS.
A exposição à economia americana tem sido o grande diferencial para os investidores de JBS e Marfrig, ressaltou um analista de um banco brasileiro. “É um momento operacional positivo”, avaliou.
Há também em curso um processo de construção de confiança e reputação – palavras que dificilmente caracterizaram o segmento desde 2007, quando JBS e Marfrig abriram o capital. Mas o fato é que, por diferentes fatores, as empresas agora agradam mais.
Nesse sentido, o caso da JBS é emblemático. A empresa dos irmãos Batista cada vez mais deixa no passado as manchetes policiais. Após a delação premiada de Joesley e Wesley, a JBS vendeu ativos, renegociou dívidas com bancos no Brasil, profissionalizou a gestão e, agora, voltou a preparar o terreno para uma oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) de suas operações internacionais nos Estados Unidos.
No mês passado, Guilherme Cavalcanti, ex-diretor financeiro da Fibria, assumiu a área financeira e de relações com os investidores da JBS com a missão de fazer a abertura de capital na bolsa de Nova York (Nyse). “O IPO tem sido uma das grandes metas da JBS”, ressaltou o analista Leandro Fontanesi, do Bradesco BBI.
A avaliação é que o IPO vai disparar um gatilho, puxando as ações da JBS. Listada nos EUA, a companhia pode ter acesso a recursos mais baratos e fazer valer sua diversificação na comparação com concorrentes como Tyson e Smithfield.
Em relatório divulgado na terça-feira, a agência de classificação de risco Fitch apontou a JBS como a mais diversificada empresa de proteínas animais do mundo, tanto em termos geográficos – a empresa está na América do Norte, Europa, América do Sul e Oceania – como em tipos de proteína (bovinos, frango e suínos).
“[A diversificação ajuda a mitigar riscos relacionados a doenças e restrições comerciais”, disse Johnny Da Silva, diretor da Fitch, em nota. Não à toa, a Tyson, ainda muito concentrada nos Estados Unidos, vem buscando aquisições no continente asiático. O faturamento anual da JBS nas exportações é de US$ 14 bilhões, três vezes mais que o da Tyson, apontou a agência de classificação de risco.
Mas, embora o momento seja favorável aos investidores de frigoríficos, o setor não está livre de riscos. “Nessa área, as bombas aparecem do nada”, disse o analista de um banco, lembrando de casos que vão desde a delação premiada dos Batista até embargos comerciais.
Entre as empresas de carnes, a BRF é a mais exposta. A companhia brasileira, que vem sofrendo seguidos golpes desde a Operação Carne Fraca, está no meio de um processo de reestruturação. Além da venda de ativos, que frustrou expectativas, a BRF terá como desafio recuperar a rentabilidade, o que deve demorar.
“O problema não é a dívida, mas o Ebitda. Eles precisariam de um Ebitda de R$ 4 bilhões para isso”, afirmou um analista. É mais realista pensar em um Ebitda de R$ 3 bilhões, o que colocaria a alavancagem mais próxima de 4 vezes. Em 30 de setembro de 2018, o índice estava em 6,7 vezes.
Fonte: Valor Econômico.