Por Nelson Pineda1
Muito tem se discutido nos últimos dias sobre a certificação de propriedade como o xeque-mate a tudo aquilo que o SISBOV tem feito nos últimos meses e de forma clara existe uma forte oposição dentro do ambiente institucional e dos representantes das certificadoras, mas, na realidade este modelo de certificar propriedade não é a antítese do sistema e sim um avanço no processo de modernização da pecuária. Sairemos da simples identificação animal e avançaremos no conceito verdadeiro da certificação. A certificação de uma propriedade agrícola é na realidade um procedimento pelo qual o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento declara o reconhecimento de que uma propriedade agropecuária atende os requisitos de comprovação de procedimentos e normas pré-estabelecidos para garantir a sanidade, a qualidade, a segurança alimentar e a rastreabilidade de seus animais.
A certificação de origem e procedimentos da carne bovina e de seus derivados é possível através da certificação de propriedade, transferindo a identificação aplicada no animal na fazenda, na época de seu nascimento, para as carcaças no frigorífico, e destas para os produtos à disposição do consumidor nas gôndolas do supermercado. Durante o abate, o Serviço de Inspeção verifica e classifica os produtos segundo as normas vigentes, conferindo a certificação de qualidade através da classificação das carcaças. Dentro deste contexto, a certificação de propriedade vai garantir a rastreabilidade bovina, que é definida como o conjunto de sistemas de informações e registros de arquivos da propriedade que permite fazer um estudo retrospectivo dos produtos oriundos da bovinocultura disponíveis nas gôndolas dos supermercados, até a propriedade onde foram produzidos, passando pelos estabelecimentos onde foram industrializados, processados ou embalados.
É obvio que uma fazenda certificada precisará ter um sistema de identificação de todos os animais – de livre escolha do produtor – que permita a diferenciação precisa entre indivíduos. O sistema adotado necessariamente deverá ser auditável para permitir a ligação de forma única com o Sistema Único de Identificação Animal (SISBOV).
Finalmente parece que nós todos começamos a entender que as peculiaridades específicas da pecuária brasileira com seus múltiplos sistemas e processos de produção e o enorme volume de animais, praticamente impossibilitam a transferência da identificação única do animal para as embalagens dos produtos. Por essa razão, é praticamente impossível rastrear cada corte até a propriedade de origem e muito menos cada animal, permitindo apenas a certificação de origem do lote abatido no dia pelo Serviço de Inspeção e a transferência da origem ao conjunto de fazendas responsável pelo abate do dia. Entretanto, também precisamos entender que a identificação individual de cada animal dentro da propriedade é um requisito básico para o acompanhamento de todas as atividades na propriedade (manejo do rebanho, controle do desempenho, seleção e acasalamento, sanidade e comercialização) assim como para a rastreabilidade por lote saído da propriedade.
A certificação de propriedade deverá passar pela criação do registro de propriedades e a elaboração de protocolos de produção e controle pelo MAPA, assim como pela aceitação do pecuarista de cumprir estas normas através de compromisso formal e a auditoria do cumprimento de conformidade destas normas através do terceiro agente ou certificadora.
O conceito de certificação de propriedade permitirá a diferenciação entre os pecuaristas que aderirem ao processo de forma voluntária, o que a sua vez levará ao crescimento modular do sistema brasileiro de certificações agropecuárias. Estas certificações de propriedades poderão a nosso ver se dar em três níveis segundo o grau de manejo sanitário, identificação animal, sistema de controle e adoção de programas de qualidade da propriedade, sendo que o terceiro grau permitirá a criação de sistemas de reconhecimento e remuneração diferenciada ao produtor.
1 – Certificação Simples de Propriedade
A certificação de origem dos animais será reconhecida oficialmente pela emissão da GTA dos animais e o registro da propriedade junto aos escritórios credenciados para esta finalidade assim como o controle periódico de movimentação de rebanho. A certificação será por lote, com identificação individual da fazenda dos animais que constituem o lote.
2 – Certificação de Origem com Identificação Individual SISBOV
A certificação de origem dos animais será reconhecida oficialmente pelo Documento Individual de Identidade Eletrônico (ID) emitido de forma virtual pelos Órgãos Executores e enviado às unidades de abate. Este procedimento, junto com a respectiva GTA onde deverá constar a seqüência numérica adotada pela propriedade e esta propriedade devidamente certificada por Entidade credenciada configurará o segundo nível de certificação.
3 – Certificação de Origem e Qualidade
A certificação de origem dos animais será reconhecida oficialmente pelo Documento de Identidade Eletrônico emitido pelos Órgãos Executores, com a respectiva GTA onde também constará a seqüência numérica adotada pela propriedade e o Documento de Certificação de Qualidade. A certificação de qualidade dos procedimentos adotados será o protocolo pelo qual as Certificadoras, fundamentadas no trabalho do Serviço da Inspeção e o compromisso da empresa com a qualidade, declaram que os animais desta propriedade atendem os requerimentos mínimos pré-estabelecidos. Eles visam a proteção da saúde pública, a garantia das qualidades sensoriais dos produtos, a preservação do meio ambiente o bem-estar animal e as condições lícitas de comercialização.
É claro que as certificações de último nível conferirão maior credibilidade e independência de atuação dos certificadores. Mas todas as propriedades dentro do sistema estarão aptas a atender qualquer exigência do mercado internacional. Porém, tanto fazendas certificadas com cerificação de origem e identificação individual quanto aquelas com certificação de origem e qualidade poderão alavancar o sistema de remuneração diferenciado que premiando os produtores de carne. Outras idéias deverão ser estudadas e criticadas pela sociedade, com a finalidade de que todos os setores envolvidos no processo de rastreabilidade da carne bovina brasileira sejam ouvidos a fim de criar um sistema transparente e factível de ser implantado no rebanho do maior exportador mundial de carne bovina.
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1Nelson Pineda é Diretor da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu.(ABCZ), Vice-Presidente Internacional do Serviço de Informação da Carne (SIC) e Representante da ABCZ no Conselho Técnico Consultivo do SISBOV
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Caro Nelson Pineda, Parabéns pelo artigo!
Espero que muitas pessoas inseridas na cadeia da carne tenham consciência de tudo isso. A teoria está exposta! O que falta é a aplicação de tudo isso.
Certamente é uma tarefa muito difícil, mas acredito que não impossível, principalmente se quisermos nos manter como grande exportador de carnes para um mundo, em que os consumidores estão cada vez mais exigentes por produtos, que visam alta qualidade e segurança, entre outros requisitos.
Atenciosamente,
Parabens,Nelson, pela simplicidade e praticidade de sua colocação sobre rastreabilidade, pois num país onde exitem +/- 3.000.000 de pessoas sem registro de nascimento, tem-se a utopia de registrar animais individualmente, e além do mais colocar uma fiscalizadora enchendo o saco dentro da fazenda.
No artigo o autor comenta ser quase impossível de se rastrear um corte até a propriedade onde se originou o animal abatido, engana-se o autor pois aqui mesmo no Brasil já existem frigorificos capacitados e realizando isso, mas claro a pedido do cliente e com um custo por tonelada de carne muito maior, mas já é uma realidade.
Um abraço
Prezados, reconheço a necessidade de um sistema mais ágil, para podermos obter mais rapidamente a adesão dos Pecuaristas para este processo, vale lembrar que a rastreabilidade Individual até a cadeia de consumo, só não é impossível aos frigorificos exportadores que recebem o DIAs do animais que fizessem a indentificação na hora da tipificação da carcaça e não somente por lote como determina a Portaria do MAPA, sendo assim poderíamos ao entrar o animal para a linha de abate identificar na etiqueta das carcaças o seu SISBOV, daí então seguindo para a linha do corte, apenas repetindo o seu número nas outras etiquetas.
Agora isso já é feito em alguns Frigoríficos, ou seja não é impossível, apenas necessita-se de uma boa análise de implantação de um método de automação.
Acredito no atual sistema individual, pois este método é muito mais preciso e seguro.
Cordialmente