Mercado físico da vaca gorda – 23-05-2012
24 de maio de 2012
Mercado físico do boi gordo – 23-05-2012
24 de maio de 2012

Veta Dilma: a manipulação da sociedade

Por Rodrigo C. A. Lima (Icone, RedeAgro).

A campanha Veta Dilma, que pede veto total ao novo Código Florestal, mostra o quanto um tema complexo tratado de forma genérica e, por vezes, leviana, gera conclusões simplistas e parciais sobre um assunto tão relevante para toda a sociedade. A linha dos defensores do veto total é: “Você prefere proteger as florestas ou anistiar ruralistas desmatadores?”

Políticos, artistas, professores, empresários e a sociedade como um todo são levados a acreditar que mudar o Código Florestal será uma catástrofe ambiental, um enorme retrocesso para o Brasil. Não se espera que todas essas pessoas tenham um conhecimento profundo sobre o tema, mas quando recebem informações genéricas, simplistas e, em muitos casos distorcidas, é fácil tomar partido, sem colocar os desafios em perspectiva.

Como o tema é sensível, ainda mais na véspera da Rio+20, o apelo para assumir o lado contra os produtores rurais é atrativo. Ainda mais quando políticos, artistas e empresários defendem que é melhor seguir a onda do que é vendido como sustentável, do que se arriscar e entrar num debate denso e sério. É mais fácil. Afinal, pesquisa DataFolha aponta que 85% dos brasileiros priorizam a proteção ambiental e 79% são a favor do veto.

É impossível ir na contramão, ainda mais quando as redes sociais tornaram a campanha Veta Dilma um sucesso, e quando as ONGs não construtivas promovem campanhas nas ruas das principais cidades brasileiras. As pessoas são provocadas a assumir um lado, e é fácil abraçar a “causa da sustentabilidade” em detrimento de um setor que é tachado de contrário ao desenvolvimento sustentável.

O que ninguém gosta de falar, no entanto, é que a famigerada pesquisa foi feita com apenas 1.286 pessoas e, pasmem, apenas 6% dos entrevistados disseram que estavam por dentro das discussões do Código Florestal! Isso significa que 77 pessoas tinham base para responder a pesquisa. É possível dizer que 0,00041% da população brasileira representa a visão da nossa sociedade?

É razoável usar uma pesquisa com uma amostragem pequena e dizer que ela reflete a sociedade brasileira? Entendo que não, mas na prática ela serve para o propósito genérico de sustentar uma tese sem entrar nos detalhes, sem gerar um debate sério.

Concordo que haverá veto parcial para trazer a regra mínima de recuperação das Áreas de Preservação Permanente hídricas. O Icone defende a importância dessa recuperação, mas destaca que é fundamental gerar um debate sobre como criar incentivos para que a recuperação seja viabilizada. Afinal, o código atual prevê isso, mas nunca conseguiu viabilizar a recuperação, pois põe todo o ônus somente sobre o produtor.

O clamor pelo veto total da presidente Dilma significa que não é preciso reformar o Código Florestal, uma lei que tem quase 80 anos, e nunca conseguiu resolver a questão da ocupação de terras no Brasil. Na linha dos argumentos genéricos, é melhor manter a lei velha, desconectada da realidade do País, e manter quase 90% dos produtores na ilegalidade. Assim a pressão eterna por políticas ineficientes de comando e controle terão espaço.

Ora, manter a lei atual contraria o senso de democracia e o processo legislativo, pois as últimas alterações do código foram feitas sob a pressão do desmatamento elevado que assolava o Brasil entre a década de 1980 e o início dos anos 2000. A realidade hoje é outra. As taxas de desmatamento caem ano-a-ano, e se, todos os atores – produtores, Estado, órgãos ambientais, madeireiros, indígenas, assentados, ONGs, sociedade – cumprirem seus papéis diante do novo código aprovado, o desmatamento cairá ainda mais.

As estimativas apontam que aproximadamente 90% do desmatamento é ilegal. Com o Cadastro Ambiental Rural o governo terá condições de controlar desmatamento, separando o ilegal do legal. Poderá cobrar os produtores que não se regularizarem, aplicando multas, e aí entra a não anistia! Poderá até mesmo cuidar de questões fundiárias, outro mal que foi jogado para baixo do tapete, e que precisa ser resolvido imediatamente.

‘Veta Dilma’ significa que seria necessário recuperar mais de 100 milhões de hectares de vegetação nativa. De um lado, isso obrigaria perder áreas produtivas. De outro, manteria outras florestas desprotegidas, que poderiam ser legalmente desmatadas. Isso é sustentabilidade? O veto total significa manter uma lei ineficiente e impossível de ser cumprida. Na visão de quem o defende, esse caminho parece adequado, pois é bonito ter leis rígidas, mesmo que não possam ser cumpridas.

Passou da hora de se fazer política de forma séria. O Brasil do futuro nunca alcançará todas suas potencialidades se temas como o Código Florestal forem tratados de forma superficial. Minha aposta é a de que o veto não será total, e o bom senso irá prevalecer. Nossa presidente tem uma visão profunda sobre os desafios do nosso País, e saberá tomar uma decisão acertada.

* Rodrigo C. A. Lima é gerente-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone) e pesquisador da Rede de Conhecimento do Agro Brasileiro (RedeAgro).

14 Comments

  1. Vinicius Brown disse:

    Gostei do texto Rodrigo de uma lida nas páginas amarelas da veja desta semana 23/05/2012 entrevista com Israel Klabin tem mais de 80 anos de idades e tem uma visão bem interessante sobre este processo
    Vinicius Brown

  2. Murilo A F Andrade disse:

    Ótimo artigo! Parabéns! Chega de hipocrisia!

  3. Mário Avila disse:

    Concordo com os argumentos do Rodrigo, no entanto, ele deveria lembrar que a discussão que não foi feita (e ele mesmo concorda que deveria) ocorreu na aprovação do projeto na Câmara (onde também existem muitos que votaram à favor do novo texto sem conhecimento de causa) e agora só resta este caminho para abrir um novo diálogo e, quem sabe, dessa vez, sério, sem a participação de políticos desinformados (como fizeram grande parte da bancada ruralista) que fecharam acordos e depois não cumpriram, que inseriram itens amplamente contestados e debatidos no texto final.
    De fato, o veto total é manipulação, mas o texto final do Código é resultado de um processo político que não beneficia nenhum dos setores. As práticas (meios) adotadas (lembro de Maquiavel) não justificam os fins em ambos os lados da discussão (se é que deve haver lados na discussão sobre produção e meio ambiente).
    Mário Ávila, zootecnista, mestre em Adm. rural e Doutor em Desenvolvimento Sustentável. Professor da Universidade de Brasília.

  4. André Oliveira (Revista Cabra & Ovelha) disse:

    Minha expectativa, e a presidenta já afirmou isso a todos, é que se mantenha o conteúdo aprovado no Senado, com avanços importantes. Fora disso é reino da fantasia e a Dilma inclusive foi bem clara nisso ao explicar a questão energética aos ambientalistas, que segue o mesmo roteiro de paralisar o Brasil a qualquer custo debaixo de um discurso bonitinho. Agora, delira também quem acha que vai escapar de fazer a recuperação de algumas áreas florestais. Haverá aprovação com vetos.

  5. Ana Maria Zampieri Camana disse:

    A agricultura é a que mais cuida do meio ambiente.Se esses ambientalistas fanáticos fossem um pouco racionais se preocupariam com as industrias que jogam resíduos nos rios ,mar e ou lixão a céu aberto. ou nas montadoras que a cada dia lançam novos carros é que esses poluem cada vez mais nosso ambiente e não o homem do campo que na verdade é o que mais cuida do meio ambiente.

  6. Bruna Rosa disse:

    Excelente!

  7. sandra maria capelazo lopes disse:

    Sim a pequisa pela taboa rasa tb e feita nas eleições, acredito que isso sim e uma grande problema no nosso Pais.Conhecer pesquizar, entender,, pela otica do Google.. e muito fraca e inoperante, so se vê o que quer, prescisamos de um legislação que funcione.E o o fato e que a anistia não pode existir,mas concordo que quem tem que pagar a conta e o latifundio e o governo, que tanto os protegeu.Problemas individualizados,e soluções compartilhadas.

  8. anderson santana de souza disse:

    A grande verdade, é que a maioria da população brasileira não conhece o verdadeiro funcionamento do agronegócio, ou ao menos, a proposta do novo código florestal. Temos que concordar que existem produtores rurais que desmataram onde não podiam, abusaram da ganancia, mas em que setor do brasil não tem pessoas assim? Na politica?
    Devemos também reconhecer que a produção brasileira esta bem abaixo da media de outros países, ou seja, podemos produzir muito mais alimentos na área que já temos em uso, mas isso não é culpa dos produtores e sim do GOVERNO BRASILEIRO, que não oferece condições para mudar esse quadro; como um produtor de leite no MT por exemplo vai conseguir investir em qualidade e produção com o preço do leite R$ 0.60?

    O GOVERNO BRASILEIRO não oferece subsídios, para os produtores.
    Outra pergunta que deixo no ar é, onde vai para todo o dinheiro internacional e ate mesmo nacional que vem para beneficiar produtores a deixar mata nativa? Credito de carbono quem tem acesso a ele? Onde esta o acesso fácil a essas informações?

    Peço encarecidamente a todos os brasileiros que se informem melhor como funciona o agronegócio em nosso país, como o governo pode e deveria estar apoiando os produtores rurais. O que temos que entender, é que o aumento da população mundial é inevitável, que a produção de alimento embora ainda possa ser melhorado, não será suficiente para atender toda a demanda, que é impossível países da Europa reflorestarem o que deveriam e cumprir com suas responsabilidades assim como exigem que façamos, que o Brasil não é o único responsável pela ” Preservação Ambiental ” e que se consertamos erros de uma pequena parte de produtores que desmataram em margens de rios entre outras pequenas falhas sem punir toda a classe produtora não estaremos prejudicando o meio ambiente de forma ha ser julgado pelo restante do mundo e que se parar pra pensar os mesmos que hoje fazer campanhas as vezes ate caluniosas contra produtores rurais, vão implorar por alimentos já que nem todos se alimentam com lagartos, besouros e baratas.

    anderson santana de souza
    salto do ceu – mt brasil

  9. Pedro Costa disse:

    Excelente colocação, apesar que eu tenho uma opinião mais radical.
    Os ruralistas deveriam ter colocado essa questão em debate nacional, não como foi colocado até aqui, mas sim com a utilização da mídia, levando através desses meios o que de fato representa o setor ruralista neste pais. Contrapondo através da comunicação de massa que as palavras fáceis de artistas e dos oportunistas de plantão são fundamentadas em sentimentos e não em fatos reais.
    Para finalizar, esperar o que de um país onde uma pessoa, como o Sr. Mauricio de Souza, que sempre serviu de forma racional as boas causas, coloca seus personagens, que são formadores de opinião das crianças e jovens a favor desse ato desmedido.

  10. Luiz Alberto Andrade disse:

    Muito bem posicionado o texto do Rodrigo. Ésta é a pura realidade dos fatos. Concordo que nossa Presidente saberá distinguir entre o que é leviano e simplista, e o que é desenvolvimento com sustentação e uma lei que poderá ser viável ao País para crescimento e empregabilidade.

  11. Carlos Luciano Soares disse:

    Meus parabens Rodrigo falou pouco mas falou certo, este texto deveria ser repassado p/ todo Brasil, com a sua permissão vou fazer isso.
    Abraços/Luciano/Contril Agropecuaria/Norte de Minas

  12. Alvaro Cardoso Fernandes de Pádua disse:

    Gostei do artigo, retrata muito bem a realidade de como o povo brasileiro trata de problemas como o caso do Código Florestal de forma superficial e quem perde com isso, somos todos nós.

    Penso que se nossos legisladores são os verdadeiros representantes da vontade brasileira e sendo assim como pode explicar tamanha contrariedade por parte da sociedade que os escolheu, é um contrasenso, contrario a democracia.

    Só espero que nossa Presidente tenha bom senso e não se deixe ser levada por esta massa que ao que me parece é burra mesmo.

    atenciosamente

    Alvaro

  13. Paulo Henrique Leme disse:

    Caro Rodrigo,

    Brilhante sua análise. Estou cada vez mais preocupado com nossa incapacidade de comunicar o verdadeiro agronegócio para a sociedade…

    Um abraço,

    Paulo Henrique Leme

  14. Carfantan Jean Yves disse:

    Parabens. Valeu. Que essa lucidez inspire o mundo da midia. JY Carfantan