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GO: custos pecuários, resultados em 2005 e perspectivas de ação

Por Márcio Sena Pinto1

É sabido que o ano que se encerrou não foi dos melhores para os produtores do Brasil Central, principalmente para os que militam na pecuária (leite e corte), nos grãos dos cereais (arroz, milho, sorgo, trigo) e nas oleaginosas (soja, algodão).

Se o ano foi bom, em termos de renda, para algum produtor e conseqüentemente para dos que dele dependem mais diretamente, só se foi para algum setor que não produz alimentos (animais ou vegetais) destinados à alimentação da população brasileira, mas quiçá para algum alienígena ou estrangeiro que muito contribui para a nossa balança comercial.

É interessante notar também que essa tal de balança comercial, que já faz parte do nosso economez, não aparece na apuração dos resultados das nossas atividades agropecuárias.

Nem como custo nem como receita, é apenas um balanço de fim e início de ano. O macro, ou melhor dizendo, a macroeconomia vai bem, mas o mico, ou melhor dizendo, a microeconomia nem tanto…

Bem, como não sou economista nem candidato a nada, passemos a enfocar assunto menos árido e mais estimulante: a pecuária de corte, que muitas alegrias e dólares tem trazido para nosso País, via exportação, é claro! Essa última atividade por sinal, parente em primeiro grau daquela dita “balança”, vai muito bem obrigado!

Não obstante, importantes institutos de pesquisas e consultorias especializadas dão conta de que o preço real pago ao produtor de boi de corte é o mais baixo dos últimos 40 anos.

Mas isso não importa porque o mundo e os hábitos do consumidor mudou e o produtor da carne nossa de cada dia também precisa mudar… Ainda assim, não há como ignorar que no caso do Estado de Goiás, o preço médio recebido pela maioria dos pecuaristas em 2005 ficou ao redor de R$ 48,00/ @ (livre do funrural) e que o custo operacional total (custo fixo + custo variável total) das arrobas produzidas atingiu o patamar de R$ 51,83/@.

Para aquele que não é muito afeito a contas e não sabe quantas arrobas produziu e muito menos quanto elas lhe custaram, isto significa, no idioma pátrio, prejuízo.

Caso os cálculos se voltem apenas para o custo das arrobas vendidas ou comercializadas, que não leva em conta o ganho de peso dos animais em recria, nem os nascimentos, as coisas pioram e os números apurados apontam, em alguns casos, para um custo de arroba da ordem de R$ 49,41 a astronômicos R$ 74,29, respectivamente para o custo variável total e custo operacional total (inclui depreciações).

De qualquer sorte, pode-se afirmar, sem medo de erro grosseiro, que o custo da arroba em 2005, no Estado de Goiás, para sistemas de produção a pasto, com suplementação à base de minerais e uso de misturas múltiplas em épocas estratégicas, estas com consumo situado entre 1 e 5 gramas por quilo de peso vivo do animal, foi de, no mínimo, R$ 50,00 por arroba.

Como atualmente a receita auferida com a venda de 1 @, no Estado de Goiás, gira em torno de R$ 48,00 / @, sem perspectivas de melhora no curto/ médio prazo, capazes de remunerar o trabalho e o capital investido pela via do aumento do preço do produto, resta aos interessados em pecuária de corte a alternativa de gerir a crise que se avizinha munindo-se de instrumentos de planejamento e gestão suficientes e necessários para estancar a sangria.

O pecuarista precisa estabelecer parcerias e “antes de mais nada”, principalmente para o pequeno e médio produtor, organizar-se melhor através de associações, sindicatos, cooperativas, centrais de venda, dentre outras formas de união.

Entretanto, para que esse esforço seja plenamente compensado, é urgente que o produtor faça o dever de casa e passe a medir e estabelecer metas biológicas e econômicas, além de discutir e adotar técnicas de gestão que compreendem planejamento econômico e financeiro, controle e determinação de custos, tudo isso para que ele saiba decidir e reivindicar seus interesses.

Nesse aspecto, aproveita-se o espaço e a hora para se fazer um alerta.

Tem sido notado recentemente um crescente movimento por parte de algumas indústrias, do varejo e de determinadas associações de raça no sentido de propor parcerias ao produtor rural para se obter determinado tipo de produto, contudo, esse último interessado deve participar ativamente da formatação destas parcerias, deixando claro qual seu papel e aquilo que necessita para poder cumprir os compromissos assumidos.

Certamente, o produtor, isoladamente, terá dificuldades para decidir ou irá optar pelo método da tentativa e erro (vai experimentar para ver!).

Essas iniciativas são bem vindas, desde que primem por um padrão superior de qualidade da carne e, ao mesmo tempo, permitam uma remuneração ao produtor pela qualidade do produto produzido condizente com seu capital e trabalho envolvidos.

Num setor dominado por desigualdades de forças até atingir o consumidor e, considerando ainda a incipiente organização e representatividade do pecuarista, é necessário também que se implante e divulgue padrões de qualidade e classificação do produto compatíveis com a realidade sócio-econômica do produtor, sem sobrecarregá-lo com obrigações e cláusulas para atender interesses unilaterais.

Além disso, esses padrões de qualidade e de classificação do produto precisam ser amplamente divulgados e discutidos com quem vai produzi-los sob a égide do mercado e, em alguns casos, a exemplo da classificação de carcaças de bovinos abatidos, devidamente regulamentados pelo setor público (o que ainda não ocorreu).

A única certeza hoje é de que a crise, historicamente, provoca mudanças significativas e importantes no sentido de trazer progressos à atuação dos atores em cena.

__________________
1Márcio Sena Pinto, engenheiro agrônomo pela Esalq/USP, produtor rural e presidente da Comissão Estadual de Pecuária de Corte da FAEG

0 Comments

  1. Marcio Trajano Borges Telles disse:

    Márcio, adorei sua exposição sobre o assunto e amplitude do artigo.

    Sou dentista e agropecuarista, não quero ficar olhando para meu umbigo e achar que está (para mim) tudo bem porque o setor primário sempre foi palco e plataforma política, somente para ganhar eleições e hoje ou amanhã este governo irá pagar caro por mais esta displicência com o setor.

    Fico pensando como uma pessoa como o Roberto Rodrigues não sai deste governo visto que é um produtor e deve estar sentindo na pele o que sentimos. Enquanto vivermos num país emergente sem sensibilidade governamental, onde os objetivos são apenas eleitoreiros ficaremos sempre a mercê de acontecimentos. Devemos lutar por uma política definida.

    Temos um contingente enorme de produtores rurais e classe através de suas entidades maiores deveriam convidar políticos e saber qual a real intenção e fazê-los assinar um termo de compromisso e pelo qual iríamos pedir votos para eles, porque é assim que funciona. No Brasil tudo é troca, então vamos lá!