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Acesso a mercados internacionais: sanidade é o primeiro passo

Recentemente temos observado uma enorme discussão sobre acesso a mercados, barreiras protecionistas, subsídios. Atualmente no Brasil a maior discussão está em torno do acordo da ALCA e seus possíveis benefícios/malefícios para o país.

Na cadeia da carne isso não é diferente. O comércio internacional de carne bovina está cada vez maior e em 2004 estima-se que serão comercializadas 6,9 milhões de toneladas de equivalente carcaça, um crescimento de 4% em relação a 2003. O mercado internacional da carne está crescendo e é de grande importância para as economias do Brasil, Argentina, Uruguay, Paraguay, Colômbia, Bolívia entre outros.

Além disso está cada dia mais claro que a América do Sul, tem enorme potencial para se tornar o grande fornecedor de carne bovina para o mundo graças a clima, solo, tecnologia, genética. Enfim, temos todas as ferramentas para nos tornar grandes fornecedores de carne para os mais diversos mercados, atendendo um grande número de países e um grande número de nichos de mercado, em cada um desses países.

Nessa região do planeta é possível produzir boi a pasto, gado confinado, vitelo, boi orgânico, entre outros com grande competitividade. No entanto o primeiro desafio, antes de se lutar contra barreiras alfandegárias e buscar entender e atender as demandas dos mais diferentes consumidores do planeta é preciso atender com grande rapidez um pré-requisito básico: sanidade total, transparente e com grande credibilidade em todo o continente sul-americano.

Muitos podem pensar que casos de aftosa em um determinado país não afetam de maneira nenhuma seus vizinhos. Alguns até acreditam que é vantajoso no curto prazo, pois quando um país deixa de exportar abre espaço para outro.

No entanto a América do Sul precisa ter uma imagem muito forte e única de que é uma região onde é possível se comprar carne bovina com qualidade, sanidade e segurança. Para que isto seja possível é preciso que toda a região esteja livre de doenças como a aftosa e reconhecida pelos organismos internacionais como a OIE em Paris.

Hoje a América do Sul tem que evoluir muito em controle e erradicação da aftosa. Hoje o Brasil tem uma enorme área (com pequena parcela do rebanho) que ainda não tem a aftosa controlada. Países como Argentina e Paraguay sofrem com o mesmo problema. O Brasil ainda precisa erradicar a aftosa na região nordeste do país. Grandes avanços na vacinação tem sido feitos, mas ainda é preciso avançar mais. Um bom exemplo é o estado de São Paulo, na região sudeste brasileira, que não apresenta focos desde 1996. No entanto a cada ano buscam realizar um trabalho mais completo e mais abrangente. Mais importante do que “estar” livre de aftosa é se “manter” livre por um longo período.

Outra questão muito importante e que será cada dia mais questionada pelos países compradores e por nossos concorrentes (como por exemplo a Austrália) é de que a “ausência de evidência” da doença não significa que temos “evidência de ausência”.


O Uruguay conseguiu em maio de 2003 o reconhecimento como área livre de aftosa com vacinação pela OIE e mais ainda, graças a um trabalho muito rigoroso de controle, conseguiu provar que oferece segurança, já exportando carne in natura para os EUA e Canadá, que são excelentes mercados. Os EUA passam por um momento de preços muito favoráveis e na América do Sul só o Uruguay tem a possibilidade de desfrutar dessa conjuntura no atual momento, graças ao seu controle sanitário.

Alguns países se queixam, por exemplo que o Chile é muito rigoroso com suas importações de carne. No entanto é o único país da América do Sul (junto com a Guiana) livre de aftosa sem vacinação. A continuidade desse status é muito importante para a lucratividade das cadeias chilenas da carne bovina e suína. É totalmente justificável que fechem suas fronteiras quando acreditarem que existe algum risco para sua economia.

Os EUA também são muito rigorosos quanto ao controle de aftosa e se tornaram livres da doença em 1929. Já faz mais de 60 anos que os EUA não tem nenhum caso de aftosa e conseguiram isso graças a um trabalho sério e principalmente através de um programa de cooperação com o México.

A Austrália, tradicional grande exportador de carne, tem um dos controles mais rígidos contra doenças contagiosas e não apresenta casos de aftosa desde 1872. Há mais de 130 anos não surgem surtos da doença no país.

O Reino Unido preferiu abater milhões de animais em 2001 e continuar com o status de livre de aftosa sem vacinação, após um curto período de 3 meses, ao invés de retroceder ao status “livre com vacinação”.

Mas muitos podem perguntar se existem benefícios palpáveis para um país livre de aftosa. O primeiro exemplo é o acesso a mercados. Quando um país (ou região de um país) não é considerado livre de aftosa, não pode vender outras regiões. Isso causa uma oferta excessiva de animais, causando queda do preço. No Brasil hoje regiões que não são livres de aftosa têm o preço arroba muito mais baixo que em regiões próximas. Quando houve casos de aftosa no Rio Grande do Sul e no Mato Grosso do Sul, por exemplo, as cotações do boi gordo caíram quase que instantaneamente.

Mais do que isso, o acesso a mercados importantes fica muito prejudicado. Uma simples comparação entre EUA e Brasil mostra o quanto isso é importante. Em 2002 a exportação de carne bovina dos EUA totalizou 1,2 milhões de toneladas de equivalente carcaça e um total de 3,5 bilhões de dólares. No mesmo ano o Brasil exportou 929 mil toneladas, um volume muito similar, faturando um total de 1,075 bilhões de dólares, muito abaixo do valor americano. A grande diferença desse valor é que os EUA têm acesso ao mercado japonês, já o Brasil não pode oferecer seus produtos, pois não se livrou totalmente da aftosa.


Estamos vivendo um momento de grandes oportunidades. A Austrália que por muito tempo foi o maior exportador mundial de carne está no início do processo de recuperação de sua maior seca, que diminuiu seus rebanhos e reduziu sua produção de carne bovina. Só em 2007 as exportações australianas voltarão ao normal. Os EUA enfrentam sério problema devido ao infeliz caso de vaca louca detectado no fim de dezembro passado. Com a Austrália e EUA tendo problemas para fornecer carne para o mercado e a demanda mundial se mostrando crescente, a América do Sul tem uma grande oportunidade a sua frente para se fortalecer como grande fornecedora de carne bovina no mundo e para isso precisa se consolidar como uma região que possui um controle sanitário forte, eficiente, transparente e com muita credibilidade. Com certeza os ganhos para todos serão muito grandes.

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  1. MÁRCIO REZENDE EVARISTO CARLOS disse:

    Com relação ao título do artigo, podemos fazer um comentário sobre o esquecimento de todos a respeito do papel do Fiscal Federal Agropecuário do Ministério da Agricultura dentro do sistema produtivo da agropecuária brasileira. Este profissional tem a menor remuneração dentre as carreiras de fiscalização do governo federal, chegando a ter vencimentos que correspondem a 40% dos vencimentos da receita federal, por exemplo.

    Conforme já reconheceu em parecer, a Advocacia Geral da União, o Fiscal Federal Agropecuário possui atividade de extrema complexidade técnica e importância para o país, não ficando a sua atuação resumida a conferência de documentos, como é o caso das outras carreiras de fiscalização existentes no âmbito federal.

    Aí vem a questão: se temos exemplos tão claros sobre o que causa a deficiência de uma atividade de fiscalização da relevância da executada pelo Fiscal Federal Agropecuário, como o que foi observado quanto à Febre Aftosa na Inglaterra em 2001 e agora a Encefalopatia espongiforme Bovina nos EUA (onde o sistema de fiscalização desestruturado ou comprometido com a iniciativa privada acarretou enormes prejuízos), porque o governo brasileiro se nega a reconhecer e valorizar o trabalho exercido pelos Fiscais Federais Agropecuários do Brasil, que, mesmo em condições de trabalho inferiores “aquelas dos países desenvolvidos tem conseguido manter o status sanitário do Brasil, permitindo saldos positivos na balança comercial brasileira?

    Sou Fiscal Federal Agropecuário e me encontro surpreso com o descaso com que vem sendo tratado o nosso pleito junto ao governo federal para reestruturação da carreira, com ajuste da remuneração para os níveis salariais que são pagos para as outras carreiras de fiscalização do governo Federal.

    Devido a esta questão, os Fiscais Federais Agropecuários já pensam em movimentos de reivindicação da sua causa, podendo, inclusive haver paralização de atividades. Tal fato seria desastroso para o país neste momento e merece ser tratado com a dimensão que possui.

    É assustadora a irresponsabilidade do governo federal que, sem o fiscal federal agropecuário não tem como exportar um grão de soja, um grama de carne, já que a certificação sanitária internacionalmente exigida é atribuição exclusiva do Fiscal Federal Agropecuário.

    Já imaginou o tamanho do problema….

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