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Após 13 aquisições, JBS trava nova guerra do frango com BRF

Desde que as duas rivais históricas Perdigão e Sadia se fundiram, em 2009, e criaram a gigante Brasil Foods (BRF), parecia impossível levar qualquer concorrente a sério. Criada com o apoio do governo federal para salvar uma Sadia à beira da falência, a BRF tinha até 70% de participação de mercado em alguns segmentos.

Imaginar que fosse surgir uma empresa disposta a brigar com a BRF seria tão improvável quanto ver nascer um concorrente à altura da Ambev no mercado de cervejas. Em 2013, quando a JBS comprou o controle da empresa de alimentos Seara, a impressão geral foi que a nova rival se manteria num muito distante segundo lugar por toda a eternidade.

Mesmo sendo a maior processadora de carne do mundo, a JBS não seria páreo para a BRF em seu mercado cativo, o de alimentos processados. Dois anos e 13 aquisições depois, a coisa mudou de figura. Seis anos após o fim da briga entre Sadia e Perdigão, a nova guerra do frango está declarada.

Segundo o banco de investimento JP Morgan, o faturamento da JBS Foods deverá atingir R$ 18 bilhões em 2015. A BRF, segundo o mesmo banco, deverá faturar R$ 31 bilhões. A distância entre líder e vice ainda é grande, mas já foi muito maior.

Em 2013, a receita da JBS Foods somava R$ 0 bilhões, e a da BRF, R$ 28 bilhões. O espantoso crescimento gera dentro da JBS confiança tal que seus executivos consideram viável chegar ao tamanho da líder em cerca de três anos (a empresa não confirma a meta).

À frente da empreitada está Gilberto Tomazoni, executivo que trabalhou 27 anos na Sadia, de estagiário a presidente. Ele deixou a empresa em 2009, na fusão com a Perdigão. Seus atuais chefes, os irmãos Wesley e Joesley Batista, deixaram claro desde sua contratação, em 2012, que a ambição era grande.

Depois de uma conversa entre Wesley e Tomazoni sobre a compra da Seara, em que o segundo achava que a empresa não valia tanto assim, o negócio foi fechado por R$ 5,8 bilhões. Wesley via a empresa como uma marca fundamental para iniciar um novo capítulo da JBS. A principal preocupação da JBS, maior empresa brasileira depois da Petrobras, com receita de R$ 120 bilhões, havia sido o crescimento, sobretudo com aquisições no exterior.

A empresa de carnes era o negócio mais importante da holding J&F, dona também do laticínio Vigor, da Eldorado (de papel e celulose), do banco Original, da fabricante de produtos de higiene e limpeza Flora e da empreiteira Zeta. Mas a baixa rentabilidade do negócio de carne in natura e o alto endividamento dificultavam o desempenho da JBS na bolsa.

Seu valor de mercado na época, de R$ 22 bilhões, correspondia à metade do da BRF, apesar de faturar o triplo. Os investidores consideravam a JBS uma vendedora de commodities, e não de produtos rentáveis. Os Batista chegaram à conclusão de que a solução para valorizar a JBS era criar uma rival para a BRF.

Desde então, Tomazoni e os Batista compraram uma empresa a cada dois meses. Na lista estão a subsidiária brasileira da americana Tyson, comprada por R$ 350 milhões, e o frigorífico Big Frango, por R$ 430 milhões. As aquisições deram à JBS Foods uma capacidade de abate de 5,5 milhões de frangos por dia, apenas 20% menor do que a capacidade da BRF, de 7 milhões.

O crescimento da JBS Foods foi facilitado pelo momento da BRF. Com o apoio do fundo de pensão Previ, a gestora de recursos Tarpon e o empresário Abilio Diniz assumiram o poder na BRF em 2013, dispostos a mudar absolutamente tudo na empresa. Numa primeira etapa, os novos chefes da BRF se preocuparam em mudar a estrutura de gestão, cortar custos e aumentar sua rentabilidade.

A tarefa foi bem-sucedida. A margem de lucro da BRF cresceu de 11% para 17% em pouco mais de um ano, e o valor de mercado aumentou 34% de lá para cá. Mas as mudanças na BRF abriram diversos flancos para que a JBS executasse sua estratégia. Ainda em 2013, Batista pediu a Tomazoni que escolhesse os melhores funcionários da BRF.

Questionado se isso não sairia caro, Wesley respondeu que já tinha gastado quase 6 bilhões na aquisição e que aumentar salários não custaria tanto assim. A JBS chegava a oferecer 50% mais, além de luvas, aos executivos que queria trazer. A empresa aproveitou também muitos dos que foram demitidos pela BRF. Só de altos executivos, vieram mais de 60, que depois trouxeram suas equipes. Hoje há mais de 100 ex-funcionários da BRF trabalhando na sede da JBS Foods.

Começava, ali, a tentativa de criar um clone da Sadia. O primeiro passo foi reformular totalmente fábricas e marcas. A Seara administrava 23 marcas, muitas delas regionais e sem grande expressão. Onze foram aposentadas imediatamente.

Ele adotou o modelo de gestão industrial da Sadia — cada fábrica passou a se especializar em poucas linhas. O número de funcionários na Seara diminuiu em 5 000 pessoas, ou 12% do total. Dos 300 produtos que vendia, 100 foram cortados por baixo volume e rentabilidade.

Para reposicionar os produtos e conseguir cobrar mais caro por eles, Tomazoni pediu uma reformulação completa ao gerente de pesquisa e desenvolvimento Inaldo Antoni, que trabalhou na Sadia por mais de 20 anos. Ele aumentou a quantidade de carne em embutidos e mudou a formulação de produtos como presunto, por exemplo, para que seu sabor ficasse mais parecido com o da Sadia, usada como referência em testes com consumidores.

Dentro da JBS, é comum dizer que determinado produto é “igual ou melhor do que o da Sadia”. Foram lançadas também linhas de pratos prontos semelhantes às da BRF (como yakissoba e cortes de frango temperados).

Tomazoni passou a adotar uma fórmula parecida com a da Sadia até na alimentação dos frangos criados pela Seara. Só no rebalanceamento da ração, feito por Osório dal Bello, que vinha de 35 anos de trabalho na Sadia, os custos caíram 7%.

Sob comando do ex-diretor de marketing da Sadia Eduardo Bernstein, a empresa começou em 2014 uma agressiva campanha de publicidade. No ano passado, foram investidos R$ 200 milhões nas campanhas estreladas pela apresentadora Fátima Bernardes. Em 2015, o número vai aumentar para R$ 350 milhões.

Tradicionalmente, os produtos Seara eram 20% mais baratos do que os da Sadia. Aos poucos, a diferença diminuiu para entre 5% e 10%. A relação com o varejo, aliás, era um dos maiores problemas da Seara. Não era raro faltarem produtos nas gôndolas (sob controle da Marfrig, o índice de falta de produtos era de 35% em algumas das maiores cadeias de supermercados do país), e os atrasos de entrega eram comuns.

Muitas vezes, a Seara só conseguia entregar o produto perto da data de validade e era obrigada a vendê-lo muito barato. “Estamos reduzindo a falta de produtos para menos de 10%”, diz Tomazoni. A reorganização facilitou renegociar contratos com o varejo e voltar a ocupar espaço nas redes.

Para cumprir o objetivo dos Batista, é necessário que a JBS Foods abra o capital na bolsa. Só assim, afirmam eles, seria “destravado” o valor hoje escondido no gigantismo da JBS. Com as mudanças operacionais, os números melhoraram significativamente. Dos prejuízos que gerava para o Marfrig, a Seara passou a uma margem operacional de 8% no primeiro trimestre de gestão da JBS e chegou a 17% um ano depois.

Mas os números não foram suficientes para convencer os investidores nas duas vezes em que a empresa tentou abrir o capital. O salto rápido nos resultados encontrou ceticismo. Receosos com o histórico curto de resultados, grandes investidores decidiram sair da oferta. O IPO foi adiado.

Em reação, a BRF começou a atacar em várias frentes. Na publicitária, criou uma campanha para o relançamento da marca Perdigão com o casal Angélica e Luciano Huck. O objetivo, aqui, é claro: fazer da Perdigão a marca que concorre com a Seara no ponto de venda.

A BRF começou a brigar no Conar, conselho que regula a publicidade, contra propagandas da Seara (a JBS decidiu reclamar das propagandas da rival também). Embora tenha crescido, a Seara ainda não incomoda nos nichos mais rentáveis, como o de pratos prontos.

A BRF atende o dobro de varejistas no Brasil. Nada impede, finalmente, que a BRF, agora com a margem operacional desejada pelos acionistas, volte a crescer e deixe a JBS Foods comendo poeira. No ano passado, a líder dobrou seus recursos em caixa, para R$ 6 bilhões, e seu endividamento é pouco maior do que uma vez sua geração de caixa anual.

A empresa tem folga financeira para fazer grandes aquisições no exterior, se quiser, usando o espaço no balanço para tomar um crédito de até R$ 10 bilhões, sem prejudicar seus indicadores financeiros. Além disso, pode facilmente usar suas valorizadas ações para fazer compras — seus papéis são cotados a 18 vezes o lucro, o dobro do múltiplo que os investidores pagam pelos papéis da JBS. São as armas da BRF para disputar a segunda guerra do frango — que está apenas começando.

Fonte: Exame, resumida e adaptada pela Equipe BeefPoint.

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