Para importar carne bovina, a China exige do fornecedor, entre outros requisitos, o abate de animais de menos de 30 meses de idade, com até quatro dentes incisivos e que não apresentem sinais de doenças como febre aftosa, tuberculose, brucelose e mal da “vaca louca”. A série de diretrizes dos chineses fez com que a carne que o país compra no exterior ganhasse nome próprio.
O “boi China”, como ficou conhecido, passou a ser, ele próprio, um elemento de inovação da pecuária brasileira. Isso ocorreu porque os pecuaristas precisaram se adaptar para atender ao mercado que, atualmente, é o destino de mais de 60% das exportações de carne bovina do Brasil.
Para ser competitivo na oferta do “boi China”, um animal de ciclo curto, o pecuarista precisa investir em sistemas integrados de produção – o que de fato ocorreu, com a multiplicação de confinamentos e os desembolsos crescentes em genética. O modelo de produção voltado ao mercado chinês acelera o crescimento dos animais, o que permite que eles sejam abatidos mais jovens e pesados. A criação do “boi China” é também um diferencial sustentável, já que, com a antecipação do abate, o rebanho libera menos metano na atmosfera.
Produzir o “boi China” não se resume apenas à idade do animal. As fazendas que quiserem vender aos chineses precisam adotar práticas que incluem o manejo sustentável de pastagens e um planejamento nutricional cuidadoso. Além disso, como um desdobramento positivo que não tem relação com as exportações, o “boi China” acabou melhorando também a qualidade do bife servido à mesa dos brasileiros.
Para os exportadores, abastecer o mercado chinês não é vantajoso apenas porque o país é o maior importador global de carne bovina: os chineses pagam mais pelo produto que atenda a seus padrões de qualidade. E eles estão dispostos a desembolsar ainda mais pelo produto, desde que ele siga padrões rigorosos de rastreabilidade.
De acordo com um estudo recente que a Academia Chinesa de Ciências Sociais e a Fundação Getulio Vargas (FGV) realizaram com o apoio da organização não-governamental americana The Nature Conservancy, os consumidores chineses pagariam até 22,5% a mais do que desembolsam atualmente pela carne do Brasil se o exportador oferecesse alguma garantia de que o gado que deu origem ao produto tenha sido criado em áreas livres de desmatamento.
Peng Ren, gerente de projetos da ONG chinesa Global Enviromental Institute, conta que Brasil e China vão aprofundar as discussões para estabelecer sistemas de rastreabilidade. A perspectiva, segundo ele, é de que de que os primeiros embarques de carne 100% rastreada ocorram já em 2025. “Estamos no começo dessa negociação”, ele afirmou ao Valor em outubro.
As exportações brasileiras de carne bovina para o mercado chinês eram irrisórias até meados da década passada, quando começaram a deslanchar.
No ano de 2014, o Brasil vendeu apenas 115 toneladas do produto à China, o que rendeu módicos US$ 486 mil, segundo estatísticas do Ministério da Agricultura compiladas pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). No ano seguinte, as exportações saltaram para 94,2 mil toneladas, volume que movimentou US$ 461,3 milhões.
O Brasil alcançou seu primeiro bilhão de dólares em vendas de carne aos chineses em 2018, ano em que a receita com os embarques chegou a quase US$ 1,5 bilhão. O volume anual das exportações à China passou de 1 milhão de toneladas em 2022 e tem se mantido nesse patamar desde então: o ano de 2024 será o terceiro consecutivo em que os embarques encerrarão acima dessa faixa.
Fonte: Globo Rural.