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Comparando preços: arroba x carne no mercado interno e externo

Existem sérios problemas de transferência de renda das indústrias para os produtores. Os resultados fracionados do Produto Interno Bruto (PIB) em 2004 indicam isso.

Enquanto o PIB do agronegócio cresceu 2,6% de 2003 para 2004, alcançando US$533,96 bilhões, o da pecuária aumentou apenas 0,47%. O PIB da agricultura recuou 1,73% e o da agropecuária 0,87%. O campo absorveu praticamente sozinho os impactos das quebras de safra, da valorização do real e da queda dos preços internacionais das commodities.

Os melhores resultados, ao longo dos últimos anos, vêm sendo obtidos pelas agro-empresas exportadoras. Aliás, o bom desempenho no mercado internacional, cujas vendas já ultrapassaram, nos últimos 12 meses, a marca de US$100 bilhões, é que vem garantindo os resultados positivos que a equipe econômica do governo federal está colhendo.

Internamente, o cenário é outro. No caso da pecuária de corte, acompanhe na figura 1 a evolução dos preços do Equivalente Físico – índice para monitoramento dos preços de carne com osso no atacado (48% traseiro +39% dianteiro + 13% ponta de agulha) – e das cotações da arroba do boi gordo em São Paulo.

Figura 1. Cotações da arroba do boi gordo e do Equivalente Físico em SP – R$/@


De 1999 – ano em que a economia foi bem, com incremento de consumo – para cá, a defasagem entre o Equivalente Físico e a cotação da arroba só aumentou. Na média do período analisado, ficou em 13%, porém, partiu de 7% em 1999 (valor médio do ano) para 17% em 2004, aumento de quase 143%.

Analisando as variações mês a mês, o pico da defasagem foi registrado em junho do ano passado, algo em torno de 23%, conforme destacado no gráfico. Ao longo dos últimos anos, a cotação da matéria-prima dos frigoríficos (boi) tem subido mais que o preço de venda da carne. Tomando como base somente as variações de preços, conclui-se que os frigoríficos de mercado interno têm trabalhado ajustados.

Agora acompanhe na figura 2 a evolução das cotações do boi gordo e da carne bovina exportada pelo Brasil (média entre in natura e industrializada), tudo em US$/tonelada equivalente carcaça.

Figura 2. Cotações do boi gordo e da carne bovina exportada (in natura + industrializada)


Ao longo do período analisado, a diferença média entre os preços da carne exportada e do boi ficou em 1%. Ou seja, na média, os frigoríficos apuraram pela carne exportada 1% mais do que pagaram pelo boi.

Na figura 3 foi feita a comparação de preços entre o boi gordo e a carne in natura, que hoje, em equivalente carcaça, responde por quase 70% da carne bovina que o Brasil coloca no mercado internacional.


Observe que, nesse caso, a margem dos frigoríficos aumentou. Na média do período, eles apuraram 34% mais pela carne em relação ao que pagaram pelo boi. Há outro aspecto a se destacar: as comparações foram feitas com os preços do boi gordo paulista, tradicionalmente os mais altos do país, mas São Paulo não é o único Estado exportador. Ou seja, a diferença entre carne e boi está ligeiramente subestimada.

É preciso considerar também que o frigorífico não comercializa somente carne. Comercializa também os derivados. Ainda assim, considerando os dois derivados mais importantes, couro e sebo, a margem dos frigoríficos de mercado interno permanece negativa. Em 2004, a defasagem média do Equivalente Scot – índice que leva em conta, de maneira proporcional, os preços de venda da carne no atacado, couro verde e sebo – para a cotação do boi gordo ficou em 8%.

As comparações aqui descritas levaram em conta apenas os preços de mercado vigentes, tanto na compra de animais terminados, quanto na venda da carne com osso e demais derivados do boi. Os custos de produção não foram considerados, mas é evidente que os frigoríficos exportadores têm mais fôlego para trabalhar em relação àqueles que atendem somente o mercado interno.

Explica-se porque vários frigoríficos “pequenos” têm enfrentado problemas para arcar com compromissos, sendo que alguns acabam encerrando as atividades, enquanto os grandes, normalmente exportadores, se expandem. Foi o que aconteceu recentemente em Rondônia, Pará e Bahia.

Os produtores, atentos à organização e concentração dos frigoríficos, têm esboçado ações conjuntas a fim de minimizar os impactos dessa situação sobre os preços pagos por animais terminados. Mas é preciso apertar o passo.

A margem dos frigoríficos exportadores também está diminuindo. Na média, em 1999, a diferença do preço da carne exportada para o boi era de 17%, considerando in natura + industrializada, e 89%, considerando apenas a in natura. Em 2004 caíram, respectivamente, para -1% e 19%.

A pressão dos compradores sobre os produtores deve aumentar. A não ser que, no curto/médio prazo, o dólar volte a subir, o Brasil conquiste algum mercado “nobre” (como Estados Unidos ou Japão) e os subsídios e/ou as tarifas de exportação recuem.

0 Comments

  1. Miguel Barbar disse:

    Eu estava observando a tabela 1 e apenas queria lembrar uma coisa:

    – Neste período os subprodutos tiveram altas e baixas e, se você coloca-los aí, verá que os Frigoríficos trabalharam no vermelho por grandes períodos. Como o índice de inadimplência dos mesmos não foi proporcional eles precisam explicar melhor a mágica que fazem para continuar trabalhando ou então se começa a duvidar dos dados que são levantados.

    O princípio número 1 de uma cadeia produtiva integrada é sem dúvida a transparência que seus membros participantes se colocam na hora de negociar, sem isso vai continuar cada um defendendo o seu da forma que puder.

  2. Claudio Luis de Oste disse:

    Seu gráfico mostra valores, mas mesmo assim dá para tirar a conclusão de que as exportações estão subsidiando o mercado, fazendo com que @BOI, fique acima do preço físico da carne.

    Isto acontece porque o que não é exportado abarrota o mercado interno, levando também o preço da vaca para baixo, levando para <15% a diferença, não por excesso de oferta, mas sim pelo mercado interno estar saturado de sobras de cortes de boi que são da exportação.

    Temos que regular as exportações, pois estamos como os madereiros de antigamente, que devastavam as matas só pelas madeiras de lei o resto era facho para derrubada.

    Assim está nosso boi, espero que sobre músculo e cupim, pois a picanha já esta proibida como o mogno.

  3. Louis Pascal de Geer disse:

    Olá Fabiano,

    O seu excelente artigo chegou em boa hora e mostra mais uma vez que Brasil não está conseguindo ficar no patamar de US$ 2.200/ton eq. carcaça total exportada e, alem disto, tambem tem atualmente problemas com o cambio.

    Quero crer que a principal razão para isto é a falta de produtos com valor agregado.

    Vamos ter que re-inventar os frigoríficos, produtos.

    Louis Pascal de Geer

  4. Marcio Sena Pinto disse:

    Fabiano,

    Creio que você se equivocou em seu artigo, trocando os sujeitos ativos e os “prejudicados”, ou seja, está havendo transferencia de renda dos produtores para a industria, ou então, dos produtores e industria para o varejo, ou não?

    Márcio Sena

  5. Carlos Fonseca disse:

    Ótimo seu artigo analisando os preços da carne bovina paga ao produtor e vendidas no mercado interno e externo.

    Todavia há uma variável que não podemos computar oficialmente, mas que deveria ser investigada e analisada.

    É real o valor da tonelada de carne bovina exportada? São reais as diferenças de preços dessa exportação, para mais e para menos? Ou é simplesmente um jogo contábil que serve à política dos grandes frigoríficos exportadores? Afinal, para que empresas eles exportam? Quem são os acionistas dessas empresas? Por quanto essas empresas revendem no mercado europeu a tonelada de carne? Enquanto não tivermos esses dados estaremos analisando empiricamente nosso mercado bovino interno, baseado em premissas falsas.

    Não seria de extremo interesse do país essas análises?

    Abraço,