Em seu plano de estrear na indústria de pescados, a brasileira JBS, líder global em carne bovina, tem pela frente um australiano com experiência no boxe amador, que cresceu em uma área rural na companhia dos filhos de capatazes e aborígenes e que ascendeu no mundo empresarial como um self-made man da indústria da mineração. Não deixa de ser um tanto irônico que esse adversário, corpulento, seja ainda hoje conhecido como “vareta” (em tradução livre), um apelido que recebeu na infância.
No início do mês, a JBS anunciou um acordo para a compra da australiana Huon Aquaculture, produtora de salmão, por valor equivalente a US$ 315 milhões (ou R$ 1,6 bilhão). Mas Andrew “Twiggy” Forrest decidiu ir para a briga. Primeiro, ele ampliou de 7,3% para 18,5% sua participação na Huon. A operação, feita por meio da Tattarang, seu veículo de investimentos, poderia barrar os planos da brasileira – para concluir a transação, a JBS ainda precisaria do aval de 75% dos acionistas da Huon.
Na sexta-feira, a JBS informou que pretende fazer uma oferta “off-market” para comprar a Huon – o que, na prática, permite que o negócio vá adiante sem depender da aprovação de 75% dos votos. No mesmo dia, Forrest publicou anúncios de página inteira nos principais jornais australianos para “desafiar” a JBS a melhorar suas práticas de bem-estar animal. A iniciativa soaria como um salutar estímulo entre concorrentes, se não incluísse frases como “os lucros não podem ser mais importantes que [a preocupação com] a dor e o sofrimento de um animal”.
Houve quem visse nas peças publicitárias um choro de mau perdedor, mas os movimentos recentes de Forrest não sugerem capitulação. Nas últimas semanas, ele também deu declarações em que sugeriu que as autoridades australianas olhem com atenção redobrada o histórico da JBS.
“A FIRB (sigla em inglês pela qual o Comitê de Avaliação de Investimentos Estrangeiros é conhecido) precisa levar em consideração todas as informações que surgiram desde que aprovou um negócio da JBS pela última vez”, disse Forrest à agência Bloomberg.
A compra da Huon depende também de aval dos reguladores australianos, um processo que ainda está em andamento. Em nota assinada por Brent Eastwood, presidente da JBS Austrália, a companhia reiterou na sexta-feira seu compromisso com o bem-estar animal, tema do anúncio de Forrest nos jornais australianos.
Com uma fortuna que a revista “Forbes” estima em US$ 20,4 bilhões, Forrest, de 59 anos, é a segunda pessoa mais rica da Austrália. Ele é o principal acionista da FMG, quarta maior produtora de minério de ferro do mundo, e é também conhecido por uma intensa atividade filantrópica, de defesa dos aborígenes e de combate ao trabalho escravo.
Fonte: Valor Econômico.