Fechamento 12:01 – 04/10/01
4 de outubro de 2001
Frigorífico gaúcho está prestes a exportar carne bovina para a Bélgica
8 de outubro de 2001

O mercado de carne no oriente médio e o terrorismo

Fernando Mesquita Sampaio1 – Scot Consultoria

O mundo parou na terça-feira dia 11 de setembro de 2001.

Parou de medo. Parou para assistir o terror ao vivo e em cores selando tragicamente a vida de milhares de pessoas, que inocentes ou não, não mereciam esse destino.

ANTI – USA

O atentado ao WTC em Nova Iorque tem sido comparado pela imprensa americana ao ataque surpresa japonês à base havaiana de Pearl Harbor em dezembro de 1941. Com algumas diferenças fundamentais: o ataque do dia 11/09 aconteceu no continente, atingindo o coração financeiro da América e o quartel general das forças armadas mais poderosas do mundo. Em segundo, o mundo não está envolvido em um conflito generalizado e em terceiro, não se sabe em quem dar o troco, já que não se trata de combater um outro país a quem podemos declarar guerra, e sim um inimigo invisível, uma ideologia anti-USA.

Justamente este sensível terceiro ponto é que está sendo motivo de análises diplomáticas em todo o mundo.

Como retaliar o terrorismo se ele não tem sede oficial?

O presidente americano George Bush respondeu esta pergunta ao afirmar que não faria distinção entre organizações terroristas e países que os abrigam. O que devemos aguardar agora é o alvo preciso do contra-ataque para conhecer o real impacto do atentado do dia 11 nas relações entre os países e na economia mundial.

Enquanto isso, os indícios que temos apontam para Osama Bin Laden, e o cerco se fecha em torno do Afeganistão, que se apronta a defendê-lo.

BEM X MAL

Logo na terça-feira mesmo da infâmia começou o jogo de quem está do lado de quem na briga do Bem contra o Mal, segundo a perspectiva americana.

A Europa, através da OTAN, já pôs à disposição de Bush seu poderio militar e sua infra-estrutura logística.

Canadá, Latino Americanos, Austrália e Nova Zelândia, Japão, até Rússia e China condenaram o atentado, apóiam a luta anti-terrorismo, e apóiam ações militares com mais ou menos ressalvas.

O mistério fica por conta dos países do Oriente Médio, onde a pressão territorial e religiosa deixam indefinidas, apesar das condolências oficiais de quase todos, quais seriam suas verdadeiras reações na hipótese de uma intervenção armada na região.

LISTA NEGRA

A lista negra dos países que abrigam organizações terroristas na região são:

* Afeganistão

Al Qaeda – organização terrorista liderada por Bin Laden

* Argélia

GIA – Grupo Islâmico Armado

* Egito

Al Jihad

Al Gama´a al Islamyya – Assembléia Islâmica

* Iraque

Abu Nidal – extremistas palestinos
Muyahidin Jalq – extremistas anti-Irã

* Israel

Kach – extremistas judeus

Kahane Chai – braço armado do Kach

* Líbano

Hezbollah

* Paquistão

Harakat ul Mujahedin

Hizb ul Mujahedin

Jamaat ul Fuqra

Lashknar e Toiba

* Territórios Palestinos

Hamas

Jihad

Frente de Libertaçao da Palestina – facção Abu Abbas

Frente Popular para Libertação da Palestina

* Turquia

Partido Revolucionário de Libertação Popular

Também fazem parte dessa lista países como Líbia e Sudão, que tem a reputação de serem coniventes com organizações terroristas.

BRASIL

O ministro das Relações Exteriores Celso Lafer foi ao ar na semana do atentado para dizer que o Brasil poderia reavaliar a política de aproximação comercial e diplomática com países do Oriente Médio.

Seu homólogo americano, Don Evans, em entrevista à rede CNN declarou que os Estados Unidos também sancionariam economicamente países que não colaborassem com a luta anti-terrorismo.

Mas qual a importância destes mercados para o Brasil, e especialmente para a exportação de carne bovina brasileira, e qual seria o impacto de um bloqueio econômico contra esses países?

IMPACTO NAS EXPORTAÇÕES DE CARNE BOVINA BRASILEIRA PARA O ORIENTE MÉDIO

O Ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, não acredita em conseqüências graves para nossas exportações, conforme declarou na apresentação do novo Plano Agrícola e Pecuário 2001. Afirma também a necessidade de um marketing mais agressivo no mercado internacional e maiores investimentos em países emergentes (incluindo Oriente Médio). Pratini cita o exemplo da empresa formada pela associação entre Perdigão e Sadia para investirem nestes mercados emergentes.

José Augusto de Castro, diretor da Associação Brasileira de Comércio Exterior ressalta que o volume total exportado do Brasil para o Oriente Médio representa ainda somente 3% do total de nossas exportações, mas que a região apresentava-se muito promissora.

Somente nos primeiros 7 meses deste ano as exportações cresceram 63% em volume, puxados principalmente por produtos agrícolas como carnes (frango e bovino), soja em grão e farelo, milho e café.

Veja no quadro as exportações brasileiras de carne bovina in natura e industrializada para países do Oriente Médio segundo os dados da Secretaria de Comércio Exterior.

As vendas somente no primeiro semestre de 2001 já representam perto do dobro do total exportado no ano passado para estes países. A participação dos países do Oriente Médio saltou de 8,7% em volume e 7% em valor para 27% e 19,86% respectivamente, impulsionada principalmente pelo Iran, Arábia Saudita e Egito. Este mercado representa hoje em volume mais do que o dobro de Estados Unidos e Canadá juntos, e cerca de 60% do volume exportado à Comunidade Européia.

SEMINÁRIOS

Dois seminários estão agendados no Oriente Médio sobre o sistema de produção de carne bovina no Brasil, de um total de nove a serem realizados no mundo todo.

Os seminários fazem parte do programa de promoção da carne bovina brasileira no exterior, comandado pela ABIEC, Apex, Ministério da Indústria e Desenvolvimento e pela CNA.

PERSPECTIVAS

Acredito que o nosso risco de perder este mercado tão promissor não depende tanto da possibilidade de uma intervenção armada imediata em países como Afeganistão, Paquistão e talvez Iraque, onde não temos presença comercial significativa; mas depende muito mais do efeito desta intervenção na estrutura política interna de países islâmicos vizinhos que contam com simpatizantes da causa de Bin Laden em seu próprio território. Países como Iran, Jordânia, Arábia Saudita, Líbano, Egito e outros que efetivamente são clientes de peso para nossas exportações.

A maioria destes países chamados árabes moderados (Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Kwait, Oman, Iêmen, Bahrein) e até o Iran condenaram firmemente os atentados e se dispõem a ajudar os americanos de alguma maneira ou a continuarem neutros, como no caso do Iran. Isso chega aos ouvidos de nossos exportadores como uma boa notícia.

No entanto, Ewen Macaskill em coluna publicada no The Guardian , inglês, alerta para um possível efeito dominó que desestabilizaria os governos ao redor do Golfo no caso de um ataque americano aos extremistas do Taleban, opondo governos politicamente a favor dos americanos a uma população religiosamente contra. Esse efeito criaria a necessidade de uma intervenção em toda a região.

Os Estados Unidos prometeram sanções econômicas aos países que impeçam a ação anti-terrorista e benefícios aos que ajudarem, e certamente pressionarão por todos os meios a comunidade internacional a fazer o mesmo.

A atitude do Itamarati em relação à crise pode ter então um efeito significativo na próxima rodada de negociações da OMC, onde o Brasil quer apresentar cerca de 60 queixas contra o protecionismo norte americano, e onde defenderá a abertura dos mercados de produtos agrícolas dos países desenvolvidos aos brasileiros, negociando inclusive um aumento para nossa cota Hilton de exportação de carne.

BOLSAS

Apesar da queda histórica da bolsa de Nova York, na segunda feira pós-atentado, o mercado financeiro se esforça ao máximo para evitar o pânico; bancos em todo o mundo estão promovendo a liquidez de fundos e ajudas têm sido prometidas às empresas mais afetadas pelo atentado, principalmente às empresas de aviação civil. Até palestinos e judeus têm dado demonstrações de querer avançar no processo de paz, o que pode ajudar a evitar o efeito dominó. Num prazo maior, na longa luta prometida por George Bush contra o terrorismo, podemos esperar intervenções, também, em países como Argélia, Sri Lanka, Filipinas e até nossos vizinhos Colômbia e Peru, que convivem diariamente com crimes e atentados cometidos por organizações ilegais.

Também em países como Inglaterra e Irlanda do Norte, Espanha, Grécia, Turquia e Japão a perseguição à essas organizações deve ser intensificada.

DEUS

Normalmente o objetivo desta coluna seria somente um análise do mercado de carne no Oriente Médio, já que este é um informativo técnico e econômico. Mas diante do horror provocado em todos nós pelo atentado da semana passada não posso deixar de manifestar-me contra o fanatismo, seja ele de fundo religioso, racial, patriótico ou de qualquer outro. O fanatismo é a negação da maior conquista na história da evolução da raça humana, a capacidade de agir racionalmente.

José Saramago, escritor português prêmio Nobel de Literatura, escreve um artigo intitulado “O fator Deus”, onde diz que se há um Deus, só há um Deus, e que em nossa relação com Ele o que menos importa é o nome que nos ensinaram a dar-Lhe. O ´fator Deus´ não é Deus, mas uma abstração da mente humana em nome da qual nos permitimos todo tipo de atrocidades. Desconfiem do ´fator Deus´. Não faltam inimigos ao espírito humano, mas este é um dos mais pertinazes e corrosivos. Como se demonstrou e como desgraçadamente tem se demonstrado tanto ao longo de nossa história.

________________________________________

1 Engenheiro Agrônomo, especialista em produção animal e colaborador da Scot Consultoria

E-mail: scotconsultoria@scotconsultoria.com.br

Telefone: (17) 3343-5111

Os comentários estão encerrados.