Por Thereza Cristina C. de Bittencourt1 e Raysildo B. Lôbo2
Parte da tese do “Estimativa de Ponderadores Econômicos para características de importância econômica em Gado de Corte, usando equações de lucro”.
Introdução
Qualquer atividade produtiva tem como objetivo a obtenção de lucro e como tal produtores de gado de corte, para permanecerem no negócio, devem gerir sua atividade de forma rentável e competitiva. As mudanças ocorridas no cenário econômico nacional e mundial tornaram necessária e urgente a transformação da imagem do produtor rural, transformando o bucólico caipira em um empresário preocupado com o sucesso do seu negócio. Basicamente existem duas ferramentas a serem trabalhadas quando se tenta tornar a produção animal mais eficiente, o meio ambiente e os animais. O caminho do êxito de uma pecuária produtiva reside na utilização racional dos recursos genéticos e ambientais de maneira a maximizar o retorno líquido (lucro).
De acordo com Hill et al (1998) melhoramento animal consiste basicamente na identificação dos objetivos de seleção, identificação dos indivíduos que produzirão a próxima geração, seleção efetiva na progênie e utilização do sistema de acasalamento adequado. Portanto, a definição dos objetivos de seleção deveria ser o primeiro passo na elaboração de um programa de melhoramento genético (URIOSTE et al, 2000).
No Brasil atualmente existem inúmeros Programas de Melhoramento de gado de corte que realizam avaliações genéticas periódicas de um grande contingente de animais que foram implantados sem uma definição a priori dos objetivos de seleção. É inegável a qualidade das avaliações genéticas realizadas por estes grupos e deve-se a eles a revolução que se observou na pecuária seletiva no Brasil na década de noventa. Contudo, a despeito da crescente preocupação com a eficiência econômica dos sistemas de produção, são muito poucos os estudos que visam o estabelecimento de objetivos de seleção que maximizem sua rentabilidade. Com objetivos claros é possível avaliar sem erro os valores econômicos associados a cada componente da resposta e assim escolher quais características devem ser incluídas em um programa de melhoramento.
Objetivos de seleção
Tendo o melhoramento genético animal o objetivo de aumentar a eficiência econômica de um dado sistema de produção, verifica-se que essa pode ser influenciada por um grande número de características. O aumento da eficiência do sistema de produção pela seleção é determinado, em parte, pela ênfase relativa das características incluídas nos objetivos de seleção (SMITH, 1983). Portanto, objetivo de seleção ou genótipo agregado pode ser definido como a combinação de características importantes economicamente dentro de um sistema de produção. A definição dos objetivos de seleção é um problema de natureza econômica e não genética (PONZONI, 1992). A escolha das características a serem incluídas deve levar em consideração a sua influência na receita e no custo do sistema de produção (HEIMERINK, 2000) e deve descrever o que se quer melhorar.
Denominam-se critérios de seleção aquelas características usadas para predizer o valor genético dos animais. Enquanto que as características incluídas nos objetivos são um fim, os critérios de seleção são os meios usados para atingi-lo (PONZONI & NEWMAN, 1989). As características incluídas nos objetivos de seleção podem não ser usadas como critério de seleção, a depender da facilidade, custo ou técnica de medição. E, de acordo com PONZONI (1992), é muito raro haver coincidência entre as características nos objetivos de seleção e as usadas como critério de seleção.
De acordo com PARNELL (2000), o estabelecimento dos objetivos de seleção é a etapa mais importante a ser considerada quando da definição do programa de melhoramento. Deve envolver uma análise do desempenho atual do rebanho, comparando-o com as necessidades futuras do mercado. Segundo o autor deve-se levar em consideração os seguintes aspectos:
a) A importância econômica das características. Devem estar incluídas aquelas que apresentam importância econômica para possíveis clientes e para o desempenho futuro do próprio rebanho.
b) As necessidades do mercado. Os objetivos de seleção devem refletir as necessidades do mercado em no mínimo 3 a 5 anos, ou seja, quando visíveis os resultados da seleção hoje. Como não é possível ter absoluta certeza do futuro, é necessário assegurar que as gerações futuras apresentem uma certa versatilidade e habilidade de produzir em uma certa amplitude de sistemas de produção e comercialização.
c) Os objetivos produtivos a serem alcançados pelo rebanho. É importante determinar objetivos reais de maneira a otimizar o uso da terra e das forragens. É aconselhável que se estabeleça como objetivo um desempenho no mínimo tão bom como a média dos melhores 25% rebanhos da região.
d) O desempenho atual do rebanho, para que se tenha uma noção real do ponto de partida.
A escolha dos objetivos de seleção deve ser feita pela comparação entre os níveis de desempenho atual com os objetivos futuros do rebanho e as necessidades do mercado. Uma vez que os objetivos de seleção estejam determinados, o próximo passo é estabelecer os critérios de seleção. Atualmente estão disponíveis predições de valor genético de inúmeras características que auxiliam na classificação dos possíveis candidatos à seleção. É importante que cada critério de seleção esteja relacionado a um objetivo que tenha importância econômica real.
Ponderador econômico
Na definição dos objetivos de seleção devem ser levadas em consideração todas as características que influenciam na receita e despesa, que devem ser combinadas de acordo com seus respectivos valores econômicos relativos (PONZONI & NEWMAN, 1989). Espera-se que a resposta a seleção seja maior, em unidades monetárias, se os indivíduos forem ordenados de acordo com os objetivos de seleção (WELLER, 1994). As características consideradas nos objetivos de seleção são, portanto, a base para a formulação da função lucro, a partir da qual são derivados os ponderadores econômicos (VERCESI FILHO et al, 1998).
Genericamente, uma função de lucro é um procedimento ou regra que utiliza o valor genético de diversas categorias como entrada e produz lucro como saída. Pode incluir variáveis que são controladas por decisões de manejo (ex. idade em que os machos serão abatidos), mas esta inclusão é necessária apenas quando estas variáveis interagem com características que afetam os lucros, que são denominadas “características de relevância econômica”.
A escolha das características relevantes economicamente depende das condições que se tem para produzir. Uma característica pode ser relevante dentro de uma determinada circunstância e não ser em outra. Por exemplo, a predição do valor genético para resistência a ectoparasitas pode ser interessante quando o custo do tratamento dos animais susceptíveis for importante, mas não se justifica quando este custo for desprezível, quando comparado a outros custos.
O ponderador econômico de uma característica representa o retorno econômico adicional por unidade de melhoramento na característica (CAMERON, 1997), sendo calculado derivando-se parcialmente a equação de lucro, a qual é função das receitas e dos custos do sistema de produção. Neste cálculo mudanças nos fatores de produção e nos produtos provocadas por mudanças no mérito genético dos indivíduos devem ser quantificadas. A equação de lucro deve incluir as receitas e os custos referentes a um período fixo de tempo. Valores econômicos incorretos ou a omissão de características importantes quando da definição dos objetivos de seleção podem levar a perda de eficiência no melhoramento da produção animal.
Considerações finais
Não há duvidas que existem muitas dificuldades na real definição do valor econômico de cada uma das características importantes dentro do sistema de produção. Qualquer estimativa é feita baseando-se em previsões de futuro, e como este é sempre uma incógnita, corre-se sempre o risco de haver mudanças de cenário não previstas. Contudo, não restam dúvidas que os Programas de Melhoramento devem desenvolver estudos no sentido de estabelecer objetivos de seleção que maximizem o lucro e os critérios de seleção escolhidos devem maximizar a resposta econômica. Os produtores devem cobrar dos diversos programas estudos neste sentido.
Quando se pensa na definição de objetivos de seleção para a pecuária de corte no Brasil é importante considerar a grande diversidade de sistemas de produção e ambientes existentes e, portanto, não existirão soluções generalizadas.
Referências bibliográficas
Bittencourt, T.C.C. Estimativa de ponderadores econômicos para características de importância econômica em gado de corte, usando equações de lucro. Ribeirão Preto, SP – Brasil, Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, 2001. 71p.
CAMERON, N.D. Selection indices and prediction of genetics merit in animal breeding. Cab International, 1997
HEIMERINK, J. Optimization of Nelore breeding programs in Brazil. Wageningen, 2000. 95p. Dissertação (Mestrado) Wageningen Agricultural University.
HILL, W.G.; VISSCHER, P.M.: BROTHERSTONE, S. Black and white spots in the application of genetics to dairy cattle breeding. INTERBULL Bulletin, No. 19, 1998.
PARNELL, P. Balancing growth, carcase and fertility in your breeding program. Angus Technical Report, n.2, 2000. http://angusaustralia.com.au.
PONZONI, R.W & NEWMAN, S. Developing breeding objectives for Australian beef cattle production. Anim. Prod., n. 49, p, 35-47, 1989.
PONZONI, R.W. Genetic improvement of hair sheep in the tropics. FAO Anim. Prod. And Health Paper n. 101, Rome, 1992.
SMITH, C. Effects of changes in economic weight on the efficiency of index selection. J. anim. Sci., n. 56, p. 1057-1064, 1983.
URIOSTE, J.J.; PONZONI, R.W.; AGUIRREZABALA, M.; ROVEDRE G.; SAAVEDRA, D. Proc. 6th WCGALP: 281-284, 1998
VERCESI FILHO, A.E., MADALENA, F. E., FERREIRA, J.J., PENNA, V.M. Objetivos econômicos da seleção de gado de leite. In: SIMPÓSIO NACIONAL, 2, 1998, Uberaba. Anais. Uberaba: SBMA, 1998. P.135
WELLER, J. I. Economics aspects of animal breeding. Chapman & Hall, 1994.
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1Thereza Cristina C. de Bittencourt – Depto. Produção Animal, Escola de Medicina Veterinária, UFBA.
2Raysildo B. Lôbo – Depto. de Genética, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP.