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Pecuária paulista e cana: uma crise anunciada

Faz exatamente um ano escrevi um artigo, onde dizia que o Brasil precisa de projetos e não simplesmente de corrida desenfreada na agricultura, como tem acontecido na substituição da pecuária paulista pela cana no decorrer do ano 2007. O censo do IBGE, nos seus resultados preliminares, mostra que o Estado de São Paulo perdeu dois milhões de cabeças e que somos consumidores de leite de outros estados.

Há exatamente um ano escrevi um artigo, onde dizia que o Brasil precisa de projetos e não simplesmente de corrida desenfreada na agricultura, como tem acontecido na substituição da pecuária paulista pela cana no decorrer do ano 2007. O censo do IBGE, nos seus resultados preliminares, mostra que o Estado de São Paulo perdeu dois milhões de cabeças e que somos consumidores de leite de outros estados.

Hoje, nos damos conta de como teria sido necessário um planejamento a longo prazo para reformular a pecuária paulista e ter evitado as perdas que sofreram centenas de pecuaristas, o impacto ambiental ainda por vir e as conseqüências sociais de inseminadores, retireiros e campeiros que, depois de uma certa idade, não são assimilados pelo setor sucro-alcooleiro e assim deixam de ser profissionais valorizados na pecuária para perambular pelas praças das cidades do oeste paulista.

A integração do binômio cana pecuária no Estado de São Paulo ainda pode transformar-se num processo interativo com inúmeras combinações desejáveis, mas a substituição pura e simples não foi a melhor saída para os pecuaristas.

O setor sucro-alcooleiro aumentou 13% a área plantada para a safra 2007/2008, a produção de cana-de-açúcar deverá aumentar acima de 11% e a produtividade média ao redor de 3% neste ano agrícola. Porém os fornecedores não participarão deste crescimento. Além de ter amargado preços baixos pela cana recebida, os preços no mercado futuro não sinalizam aumentos significativos.

No Estado de São Paulo, estes produtores representam mais de 60% do total produzido e quem vendeu seu rebanho e acabou com toda a infra-estrutura de manejo está seriamente ameaçado em continuar sua atividade, porque além da diminuição de cerca de 40% dos preços recebidos, em comparação com a safra passada, o preço tende a cair e os custos de produção da lavoura deverão aumentar.

Todo este cenário foi provocado pela queda de 24% nos preços do álcool anidro, ao redor 33% do álcool hidratado, de 17% do valor em dólares do açúcar exportado. Para os produtores que indexaram os recebimentos em ATR (kg de Açúcar Total Recuperável) e tomaram financiamentos a juros mistos, a situação se agrava, pois estão praticamente com os mesmos valores da safra de 2003/2004 e correndo juros de mercado.

Estes fornecedores que não pensaram em diversificar e deixaram a pecuária, evidentemente terão baixa produtividade da cana em kg de ATR, pois a baixa remuneração da cana implica em falta de recursos suficientes para realizar o manejo adequado da soca e a renovação do canavial. Para a safra futura os preços da cana devem continuar no mesmo patamar que nesta safra, ou seja, será um ano complicado para os produtores de cana-de-açúcar, que continuarão com os preços abaixo do custo de produção e sem gado para vender em ciclo de alta.

Mais de 30 novas unidades industriais em todo o país começarão a esmagar cana na safra 2008/2009, resultando em um crescimento esperado da produção e da área plantada acima de 10%, mas o mercado futuro indica que a oferta ainda estará maior que a demanda, tendo como conseqüência a queda continuada dos preços da cana, do álcool e do açúcar.

Mesmo com a crise que enfrentamos com a União Européia, as exportações de carne bovina, estimadas em 9,2 milhões de toneladas em equivalente carcaça para este ano, deverão representar acima de 25% da produção total do Brasil. As expectativas para o ano 2008 são de um novo ciclo de crescimento, devido à melhoria dos preços dos bezerros e do aumento da arroba do boi gordo, que deve consolidar-se, pois o longo ciclo de preços baixos provocou um elevado índice de abates de matrizes.

O Brasil deverá manter a liderança das exportações mundiais, uma vez que os principais concorrentes do Brasil, como Argentina, Austrália, Estados Unidos, Nova Zelândia e Uruguai enfrentam problemas de diferentes tipos para aumentar a oferta de carne bovina. As demandas mundiais de carne deverão se fortalecer em 2%. A União Européia precisará substituir rapidamente seus fornecedores para atender as novas demandas e evitar uma alta de preços.

Aparentemente existe um equilíbrio mundial entre oferta e demanda e há expectativas de concretização de abertura do mercado chinês. Os produtores, que estão com suas propriedades no SISBOV e auditadas com o selo de conformidade, poderão vender carne para a UE com preços largamente compensadores, mantendo assim favoráveis as expectativas para a carne bovina brasileira.

O Secretário João Sampaio está desenvolvendo ações em várias frentes para recuperar a pecuária paulista. O Plano Risco Zero para o estado, embora tecnicamente difícil de realizar, filosoficamente define a intenção do governo paulista em modernizar a defesa animal estadual.

Nesta ótica precisamos delinear novos cenários da integração cana-pecuária e reformular os sistemas de produção para leite e carne. A pecuária paulista passará por transformações profundas, onde só haverá lugar para sistemas de produção ordenados, inteligentes, em sintonia com a utilização de recursos genéticos e em consonância com o aproveitamento de resíduos da indústria canavieira. Com investimento em difusão de tecnologia, relacionamento moderno entre os agentes a cadeia, seriedade governamental, agregação de valor e marketing lutaremos pela habilitação do Estado de São Paulo para o mercado globalizado de carne bovina.

0 Comments

  1. Fernando de Oliveira Souza disse:

    É a confirmação do velho ditado “não se pode colocar todos os ovos na mesma cesta”. Se há uma forte migração dos produtores na mesma direção, isto deforma o mercado que passa a ser não mais tão interessante.

  2. TIAGO LUISI disse:

    Muito bom.

  3. carlos felipe rios godoy disse:

    Qual a possibilidadde dessa crise afetar o Mato Grosso do Sul, visto que a situação não sera muito diferente da São Paulo daqui a 2 ou 3 anos?

  4. fernando Henrique Centenaro Martinho disse:

    Primeiramente o parabeniso pela abrangência do assunto, o que é relatado neste artigo é extremamente compatível com a realidade brasileira. Estamos em momentos delicados por causa do amadorismo dos produtores em sua maioria, onde ficam no ping-pong de cultura.

    Quanto à cadeia da carne, gostaria de enfatizar a vergonha que somos em termos de organização e execução dos projetos, como a rastreabilidade que vêm se arrastando por longas datas. Não é da minha época mas pelo que sei, quando éramos governados pela era Café com Leite (São Paulo e Minas) o setor primário era melhor.

  5. Francisco Pereira Neto disse:

    Nelson Pineda,

    Você como produtor de carne e leite sabe melhor do que ninguém do que está falando. O nosso rebanho diminuiu drasticamente. Você está absolutamente certo. Essas duas milhões de cabeças foram trocadas por culturas mais “rentáveis”, cana de açúcar, laranja e eucalipto. É monótono olhar o território paulista e ver um mar de cana, de laranja e plantação de eucalipto.

    Os pecuaristas não tiveram opções, aliás, nunca tiveram. Ou faziam isso ou passavam fome. Eu acho que o grande equívoco da nossa agropecuária é a concentração de poder nas mãos de poucos empresários rurais que têm capitais, influencia política para direcionar os seus interesses.

    Só foi surgir um espasmo energético de fontes renováveis no mercado mundial para concentrar todos os esforços em direção para a cana de açúcar. Aqui mesmo neste espaço li artigo de um economista da USP falando maravilhas das promissoras matrizes energéticas. Elogios mil, diria até ufanistas.

    O Brasil é o país que melhor condições reúne para abastecer o mundo com etanol e biodisel. Você tem razão Nelson, baixada a poeira estão aí os resultados e a sua previsão para a próxima safra. E agora? Como fica o produtor que arrendou suas terras para as usinas.

    Eu chamo isso de falta de planejamento, visão de futuro e o mais importante; falta de política agrícola. O mercado da carne bovina hoje não tem mais espaço para amadores. Ou tecnifica ou está fora do mercado.

    O que fazer com os pequenos e médios pecuaristas, que são a grande maioria no nosso estado? Na verdade nunca se fez nada, pelo contrário só foram impostos obrigações, deveres de todas as espécies principalmente de ordem sanitária, que acho que está correta porque o mercado assim o exige. Mas e as ferramentas para eles alavancarem os seus negócios.

    Você acabou de dizer que tiveram que vender as matrizes para abate, porque foi a única opção que tiveram! Cadê o incentivo do governo para essa gente?

    Eu tenho dito que o Estado de São Paulo vai se transformar, ou melhor, está se transformando somente em produtor de genética. Será que só isso é importante para o nosso estado? Você falou do nosso secretário, o Dr. João Sampaio que pretende modernizar a Defesa Agropecuária Paulista. Tomara que ele tenha sucesso porque é um empresário do setor, tem bons propósitos, é trabalhador e acima de tudo uma pessoa simples e convicta daquilo que precisa ser feito. Para mim vai ser muito bom porque ele nada mais é do que o meu chefe. Boa sorte secretário. Conte comigo.

  6. Virgilio José Pacheco de Senna disse:

    Parabenizo,

    Atualizado e verdadeiramente é o retrato do agronegocio carne/cana de açucar. O planejamento estrategico para pequeno, medio e longo prazo é necessario e principalmente correto no mundo globalizado e carente de alimentos e de nova matriz energetica.

  7. wilson tarciso giembinsky disse:

    Tudo isto é a busca da sobrevivência, de minimizar o prejuizo porque lucro mesmo não estamos tendo.

    Mas se o produtor rural imitar o gado e num efeito manada for para um só tipo de produto, não interessa qual, todos para a cana, todos para o eucalipto, todos para o leite, todos para o corte, para o café, vai saturar o mercado e todos terão prejuizo .

    Normalmente vou contra a corrente, saio da manada, não vou para onde todos estão indo, não entro em negócio que está bom, procuro justamente o ruim, o que niguém quer, espero um pouco que ele fica bom e quando todos estão entrando nele saio, agindo assim tenho conseguido sobreviver sem grandes lucros, mas também sem nenhuma dívida.

    E vamos torcer para que o governo não atrapalhe, pois nem a parte dele ele faz, as estradas são ruins, falta energia, as escolas são ruins, os técnicos agrícolas e agropecuários que tenho contratado estão saindo das escolas piores a cada ano!

  8. ricardo c. okida disse:

    O assunto abordado é de grande importância, já que o Nelson Pineda é uma pessoa de grande visão comercial. Gostaria de perguntar a ele, o que ele acha que ocorrerá com a expansào do eucalipito no matogrosso do sul a médio e longo prazo, os reultados serão semelhantes ao da cana no estado de São Paulo?

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