Análise da semana de 9 a 15 de maio
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) publicou este mês o documento “A pandemia da Covid-19 e as perspectivas para o setor agrícola brasileiro no comércio internacional”. Esse documento é a resposta de 23 adidos agrícolas, localizados em postos-chave dos continentes, ao desafio oferecido pela ministra Tereza Cristina para que respondessem considerando a “perspectiva de onde estão baseados: (a) como será a demanda do mundo por alimentos, (b) o que irá mudar com a pandemia e (c) como podemos nos antecipar para a retomada da economia pós-Covid-19?”.
As tendências principais mencionadas foram:
1) o empobrecimento da população global, prejudicando segmentos premium e beneficiando produtos mais baratos, embora com maior preocupação com a qualidade e sanidade;
2) o medo do desabastecimento, que leva à maior preocupação com a “soberania alimentar”, redução das exportações, aumento de estoques e valorização de parceiros tradicionais.
Essas duas tendências são tensões em direções opostas, pois o livre comércio favorece a diversidade e o menor custo na alimentação, por alocação eficiente de recursos globais. A resolução desta tensão se dará por meio de um comércio internacional ainda mais “administrado”, em que governos ajustarão tarifas e barreiras, caso a caso, entre o temor do desabastecimento e a conveniência da produção nacional.
A pandemia poderá ser utilizada como pretexto junto à opinião pública para justificar padrões técnicos e sanitários mais rigorosos, exigências de certificação e rastreabilidade, embora tenha desviado momentaneamente a atenção de outras doenças animais e vegetais que prevalecem em regiões produtoras importantes (como a peste suína africana e a influenza aviária). Quanto à preocupação com o aquecimento global, ficou para depois da pandemia, quando retornará somada à preocupação com a saúde e segurança alimentar. O conceito de One Health estará cada vez mais presente nas agendas institucionais.
Do governo brasileiro, em especial o Mapa e o Itamaraty, espera-se a preservação do espaço conquistado pela produção agrícola brasileira no mercado internacional, especialmente para a proteína animal, ao apresentar o Brasil como parceiro confiável, que prioriza relações de longo prazo e contribui para a segurança alimentar global. Ao mesmo tempo, o sistema de exportação agrícola nacional deve seguir investindo na diversificação de produtos e destinos, para aumentar a resiliência do sistema, tendo cuidado para manter o Brasil como área livre de doenças, suprindo outros países com produção ou recomposição de rebanhos. Outra ação possível é a promoção da imagem do agronegócio brasileiro junto ao público de outros países.
Quanto ao setor privado, espera-se que se adapte rapidamente às flutuações do mercado e às novas tendências de consumo e distribuição que persistirão no mercado externo e interno: embalagens menores; maior tempo de prateleira; processados ao lado dos frescos, orgânicos, funcionais e nutracêuticos; comércio eletrônico e entrega em casa; alimentos de fácil preparo; e compras em mercados menores e feiras livres próximas aos locais de residência.
Para o produtor brasileiro de bovinos de corte, os pesquisadores do CiCarne juntam-se aos adidos agrícolas e recomendam atenção constante às notícias recentes do mercado da carne bovina e de seus insumos agrícolas usados em suplementação animal (farelo de soja, milho e caroço de algodão).
Toda crise é fonte de risco e oportunidades para o produtor e empreendedor atento, rápido e criativo. Como um exemplo, que não consta no documento do Mapa, França, Holanda, Bélgica e Alemanha têm três ou quatro milhões de toneladas de batatas sem processar, excedentes por conta da pandemia e em estudo está o redirecionamento para a fabricação de alimentos para o rebanho local, já que o volume não deve ser depositado, diretamente, no meio ambiente.
Ao mesmo tempo, são necessários cautela, extremo controle dos custos de produção, planejamento, aplicação de boas práticas de produção, saber relacionar-se a montante e a jusante na cadeia produtiva, gerenciamento de risco de preço por meio de hedge no mercado futuro, entre outras atitudes gerenciais de igual importância. Enfim, é preciso identificar as oportunidades e aproveitá-las, mas com a cautela necessária.
Fonte: Boletim CiCarne, Embrapa.