As encefalopatias espongiformes transmissíveis (TSEs) são um grupo de doenças neurodegenerativas que afetam tanto humanos como animais (Tabelas 1 e 2). Elas também são conhecidas como doenças de prions (1) e estão associadas com formas anormais de uma proteína conhecida como proteína prion. A primeira TSE documentada foi o scrapie, doença de ocorrência natural em ovinos e caprinos que foi reconhecida na Europa há mais de 200 anos (2) e é endêmica em muitos países do mundo. Outras ocorrências de TSEs em animais incluem surtos de encefalopatia em martas nos EUA (3), doenças crônicas degenerativas em populações de veados de orelhas longas e alces também nos EUA (4) e a encefalopatia espongiforme bovina (EEB), que foi primeiramente reconhecida no Reino Unido em 1986 (5). A EEB rapidamente se desenvolveu em uma importante epidemia no Reino Unido (6,7) e tem sido casualmente ligada à ocorrência de novas TSEs em uma variedade de gatos e animais exóticos, bem como a uma nova variante da doença humana de prion chamada de doença de Creutzfeldt-Jakob na população do Reino Unido (8-10); esta variante tem mostrado um aumento significante na incidência desde seu reconhecimento (11).
Encefalopatias espongiformes transmissíveis
Características das doenças de prions
As doenças de prions são incuráveis e fatais e são as únicas cuja etiologia pode ser esporádica, adquirida ou hereditária, como indicado pela variedade humana das TSEs listadas na Tabela 2. As TSEs geralmente têm um longo período de incubação e são transmissíveis dentro de animais da mesma espécie bem como entre espécies diferentes pela inoculação com ou exposição dietética a prions do tecido cerebral acometido – um mecanismo que causa uma doença de prion adquirida e já foi demonstrado experimentalmente.
As características neuropatológicas das doenças de prions são formação de vacúolos espongiformes (forma de esponja) e perda de células neuronais no sistema nervoso central, acompanhada de proliferação de astrócitos e, em alguns casos, deposição de placas amilóides (depósitos densos de proteínas e material celular encontrados em volta dos neurônios). As doenças de prions também estão associadas com o acúmulo no cérebro da proteína codificada pelo próprio hospedeiro, o prion PrP, em uma forma anormal que é designada de PrPSc (pela isoforma do scrapie). Apesar de a natureza do prion transmissível não ter sido demonstrada completamente, o principal componente do prion é o PrPSc (12).
A proteína prion nestas doenças e a hipótese de somente proteína
A forma normal da proteína prion, PrPC (pela isoforma celular) é de uma glicoproteína de superfície celular com função desconhecida com uma estrutura predominantemente α-helicoidal (13-15) que é altamente conservada tanto na seqüência como na estrutura entre as espécies. O PrPSc associado à doença é derivado da forma celular PrPC por mudança na conformação pós-traducional (16,17), mas sem alteração da seqüência primária da proteína (18). O PrPSc é extraído do tecido cerebral de animais acometidos com a doença de prion como um material agregado que pode ser diferenciado do PrPC por sua resistência parcial a proteases e por sua insolubilidade detergente (19).
Inicialmente, sugeriu-se que as doenças de prions foram causadas por vírus lentos por causa de sua transmissibilidade com longos períodos de incubação, mas nenhuma doença associada a vírus (1) ou nenhuma resposta imune foi demonstrada. As evidências atuais favorecem a hipótese de somente proteína (20), que afirma que o PrPSc é o elemento essencial do prion transmissível e que este serve como um modelo para promover a conversão do PrPC endógeno em PrPSc, propagando, desta forma, a conformação PrPSc e o agente transmissível. Essa hipótese de que a proteína prion é essencial para a doença foi apoiada por observações de que as mutações no gene da proteína prion resultam em formas herdadas de doença de prion (21), de que a eficiência de replicação é maior com proteínas de mesma seqüência primária ou espécies (22,23) e de que o PrPC é requerido para a susceptibilidade a doenças de prions (24).
A mudança conformacional de PrPC para PrPSc é a característica chave das doenças de prions, mas o mecanismo da conversão permanece desconhecido. Até agora, esforços in vitro para produzir material transmissível, que provaria a hipótese de somente proteína, não obtiveram sucesso (25-27), sugerindo que o contexto celular do processo (ou processos) é significante.
Esses novos mecanismos patogênicos de replicação de proteínas primeiramente descobertos em doenças de prions mostraram agora ter uma ampla relevância desde sua demonstração em outras doenças (28) e em leveduras e fungos (29). Recentemente foi demonstrado que os prions transmissíveis de fungos filamentosos podem ser gerados in vitro (30), demonstrando a validade da hipótese de somente proteína.
Doenças de prions humanas e ligação entre vCJD e EEB
A Tabela 2 mostra a variação e as diferentes origens das doenças humanas de prions. A forma esporádica, ou clássica, da CJD foi primeiramente descrita nos anos 20 por Creutzfeldt e Jakob. Trata-se de uma demência neurodegenerativa com início tardio com um agressivo curso clínico; cerca de 70% das pessoas afetadas morrem dentro de seis meses. A origem da chamada sCJD é desconhecida, mas a doença pode ser despertada tanto por uma mutação somática no gene do prion como por uma mudança conformacional espontânea da PrPC endógena para PrPSc. As formas autossômicas dominantes herdáveis das doenças de prions são associadas com mutações patogênicas do gene da proteína prion (31) e podem ser diagnosticadas por genotipagem. Mais de 20 mutações patogênicas que podem predispor a proteína à formação da isoforma patogênica, causando a doença, foram documentadas (31).
A primeira evidência da transmissibilidade das doenças humanas de prions veio do kuru, uma doença descoberta em uma população remota de Papua Nova Guiné nos anos cinqüenta que estava relacionada com rituais de canibalismo (32). Outras transmissões de doenças humanas de prions foram demonstradas após exposições acidentais a prions através de procedimentos médicos, resultando em cerca de 200 casos de CJD iatrogênicos (doenças cuja origem é proveniente de diagnóstico, tratamento ou relação do provedor de tratamento médico) em todo o mundo (33). Mais recentemente, uma nova variante da CJD (agora chamada simplesmente de vCJD) foi observada no Reino Unido (34), com evidências de que tenha surgido da transmissão de prions de EEB.
Além das mutações patogênicas do gene da proteína prion ligadas às formas hereditárias da doença, também existem os polimorfismos que afetam os períodos de incubação e a susceptibilidade da doença independente da etiologia (22,35,36). O polimorfismo no resíduo 129, que pode ser tanto metionina como valina, é o principal determinante da susceptibilidade genética de doenças de prions; doenças adquiridas ou esporádicas podem ocorrer principalmente em homozigotos no códon 129, indivíduos heterozigotos têm um início tardio e um curso mais longo da doença em algumas doenças hereditárias (37), e todos os casos da variante da CJD até agora foram em homozigotos metionina (38).
A vCJD é diferenciada da sCJD por vários critérios (39,40), incluindo os seguintes: 1) a vCJD apresenta uma idade muito mais jovem para início da doença (a idade média é de 29 anos), um começo mais insidioso da doença e um período de curso clínico mais longo (9-35 meses); 2) a vCJD tem as características comuns das TSEs, mas com placas amilóides abundantes no tecido cerebral (34) e com uma distribuição mais ampla de PrPSc (e, desta forma, de material transmissível) nos tecidos, incluindo sistema nervoso central (41); e 3) a sCJD tem uma distribuição mundial uniforme e a incidência não está ligada à incidência de scrapie (42), enquanto a vCJD ocorreu somente em países que registraram casos de bovinos infectados com EEB.
Evidências epidemiológicas da ligação entre EEB e vCJD
A epidemia de EEB do Reino Unido foi atribuída à prática de alimentar os bovinos com produtos de origem animal na forma de farinha de carne e ossos (meat and bone meal – MBM) (43). Inicialmente, assumiu-se que a EEB foi causada pela contaminação com o scrapie ovino, mas, devido ao fato de a caracterização do prion ser diferente na EEB e no scrapie (44), é mais provável que a EEB tenha surgido pela reciclagem na MBM de um caso raro esporádico de EEB (45). A emergência de novas TSEs desde o início da epidemia de EEB que mostrou ser causada por um tipo semelhante ao da EEB confirma que a EEB, seja qual for a origem, é diferente da forma clássica de scrapie em ovinos.
A Figura 1 mostra a sobreposição das curvas epidêmicas de doenças de prions para EEB (46) e vCJD (39) no Reino Unido desde 1988, quando a EEB se tornou uma doença notificável. Desde o surgimento da vCJD tem havido uma crescente conscientização e uma maior vigilância com relação a doenças de prions, que acredita-se serem responsáveis por um leve aumento na incidência de sCJD durante este período; entretanto, de todas as doenças humanas de prions, somente a vCJD teve um aumento significante na incidência (aumentou cerca de 23% por ano) desde seu reconhecimento em 1996 (11). Até julho de 2002 foram constatadas 115 mortes por vCJD, com mais nove casos de pessoas com a doença que ainda estavam vivas (44) no Reino Unido. Mais quatro casos foram registrados na França e um na Irlanda; ambos os países também registraram um número significante de casos de EEB (47).
Figura 1: Incidência de EEB em bovinos e mortalidade para a vCJD em humanos no Reino Unido (1988-2001)
Evidências bioquímicas da ligação entre EEB e vCJD
As evidências bioquímicas indicam que a EEB e a vCJD são causadas pelo mesmo tipo de prion. Diferentes doenças de prions podem ser diferenciadas pelas propriedades biológicas, incluindo períodos de incubação e padrões de neuropatologia na transmissão para ratos (conhecidos como perfil da lesão). O PrPSc do tecido cerebral de diferentes doenças de prions também mostram diferentes pesos moleculares e padrões de glicosilação em Western blotting após digestão parcial com protease (8,49) – perfis característicos que são mantidos na passagem para o rato (8). Dos quatro tipos de PrPSc associados com doenças humanas de prions, o tipo 4 está associado somente com a vCJD; em todos os casos de vCJD sujeitos a esta análise, o padrão tipo 4 foi observado e nenhuma amostra de outras doenças de prions mostraram esse perfil tipo 4 (8). Amostras de cérebro de bovinos infectados com EEB mostraram um perfil similar ao visto na vCJD (8). A transmissão de vCJD e EEB para ratos e a análise de PrPSc derivados de ratos mostraram o mesmo perfil de PrPSc, bem como perfis similares de lesões diferentes daquelas causadas por outras doenças de prions, indicando que a EEB e a vCJD são indistinguíveis no mesmo hospedeiro (8-10). Casos recentes de encefalopatia espongiforme felina e doenças relacionadas em animais de zoológico também mostraram o perfil de PrPSc da EEB, confirmando que a EEB é um agente comum causador de novas TSEs a partir dos anos noventa (8,44). O tipo de PrPSc é usado como diagnóstico diferencial inequívoco entre vCJD e outras doenças de prions.
Epidemiologia da vCJD
Transmissão dietética de prions
A principal rota de transmissão de EEB para humanos, causando a vCJD, é provavelmente o consumo de carne bovina de animais infectados com EEB. Os produtos de carnes contendo tecidos do sistema nervoso (carnes processadas, como salsichas, carne moída, bolos de carnes, entre outros) têm maior probabilidade de conter uma alta quantidade do agente causador da EEB do que outras carnes e, desta forma, representam um risco maior de transmissão. As questões sobre a possibilidade de o consumo de tipos específicos e cortes de carnes estar relacionada à incidência de vCJD foram respondidas por estudos epidemiológicos regionais que relacionaram clusters de casos de vCJD com tendências regionais no consumo dietético (50). A epidemiologia regional da vCJD na Grã-Bretanha revelou um aumento de duas vezes na incidência de vCJD no norte do país comparado com o sul. A incidência regional de vCJD esteve relacionada com a ingestão dietética regional de produtos de carne com grande probabilidade de conter material rico em agente transmissor da EEB como estimado em duas pesquisas nacionais: 1) Relatório sobre Consumo de Alimentos e Gastos de Famílias e 2) Pesquisa Dietética e Nutricional de Adultos Britânicos. Uma correlação positiva entre a incidência de vCJD e o consumo desses produtos de carne foi encontrada usando dados da primeira pesquisa, mas não da segunda (50).
Análises epidemiológicas de grupos específicos de pessoas com a doença no Reino Unido sugerem que a variação na incidência de vCJD pode ser explicada não somente pela ingestão na dieta de certos produtos de carne bovina, mas também, de certos métodos usados na preparação da carne bovina para consumo humano. Em Leicestershire (população de 870 mil), a incidência de vCJD foi registrada como 5,7/milhão comparado com a incidência nacional no Reino Unido, de 1,5/milhão (50,51). O cluster de cinco casos que produziu esse excesso é altamente significante. As ligações entre esses casos de Leicestershire foram encontradas por investigações de saúde pública como sendo oriundos de carnes compradas em açougues locais que processavam carcaças inteiras, contaminando desta forma a carne da carcaça com tecido do sistema nervoso central (50-53).
Caracterização da epidemia de vCJD e período de incubação
Várias previsões sobre o tamanho da epidemia de vCJD no Reino Unido foram feitas (54-56), sugerindo epidemias variando entre poucas centenas até mais de um milhão de casos. Nestes modelos, o tamanho da epidemia é dependente tanto do nível de exposição aos prions como do período de incubação da doença, sendo que nenhum dos dois é quantificável para vCJD, apesar de ficar claro que as epidemias maiores foram delineadas baseadas nos períodos de incubação mais longos e variáveis bem como com grande exposição aos prions (57). Essas previsões também são limitadas pela suposição de que existe somente um tipo de genótipo susceptível – ou seja, o códon 129 homozigoto metionina.
A epidemiologia do kuru tem importantes implicações para o delineamento e previsão da epidemia de vCJD, devido a rota comum de infecção oral entre o kuru e a vCJD. O declínio gradual dos casos de kuru ao longo dos 45 anos após o canibalismo ter chegado ao fim (ainda existem poucos casos hoje) indicam que os períodos de incubação da doença podem se estender para mais de 40 anos (45,58). Para a vCJD nós podemos esperar que o período médio de incubação seja maior do que a média de 12 anos do kuru, dado que existem barreiras entre espécies (humanos e bovinos) (44) que aumentarão o comprimento e a variabilidade do período de incubação. Os dados do cluster de cinco casos de Leicestershire permitiram que uma estimativa do período de incubação fosse feita para alguns desses primeiros casos de vCJD. Alguns casos de Leicestershire estavam ligados a açougues específicos que pararam de operar em 1982 e 1989 (50,51), sugerindo que a infecção ocorreu muito no início da epidemia de EEB. Uma estimativa de um período de incubação de 15-18 anos foi feita a partir destes dados (57).
Com exceção do códon 129 do gene do prion, não houve nenhuma outra similaridade genética no lócus do gene do prion entre os casos de vCJD, nem entre os casos do cluster geográfico de Leicestershire (59). Outro loci no gene do prion determinando susceptibilidade foi identificado em ratos, e uma analogia com humanos pode ajudar na determinação da susceptibilidade genética (60-62).
Implicações para a saúde pública
Medidas preventivas em regiões epidêmicas
A nova doença humana de prion vCJD foi reconhecida no Reino Unido em 1996 (34), após a epidemia de EEB no final dos anos oitenta e início dos anos noventa (6,7). Além das evidências epidemiológicas, dados experimentais indicando que a vCJD é causada pela exposição a materiais infectados com EEB foram apresentados logo após o reconhecimento da doença (8-10).
As medidas tomadas pelo governo do Reino Unido para proteger a saúde pública após o surgimento da EEB incluíram barreira ao uso de materiais de risco especificado no consumo humano em 1989 (48). Os materiais de risco especificado consistem principalmente em tecido nervoso e miúdos com um alto risco de conter prions da EEB e esta designação está sob contínua revisão baseado no desenvolvimento de evidências científicas (48). A subseqüente barreira ao consumo de bovinos de mais de 30 meses de idade foi colocada em prática em 1996, após o surgimento da vCJD, sob o argumento de que o período de incubação da EEB é de cerca de cinco anos. Uma barreira à carne bovina com osso para consumo humano também foi colocada em prática no período de 1997-1999 e foi retirada após o declínio da epidemia de EEB. No início dos anos noventa, também houve controle da preparação de carcaças para reduzir o risco de contaminação de carnes com materiais de risco especificado.
A extrema resistência dos prions a métodos padrões de descontaminação é um fator significante na transmissão acidental de prions; isso levou tanto à epidemia de EEB como a casos de CJD iatrogênicos. A disseminação iatrogênica da variante da CJD é uma área de considerável preocupação para a saúde humana, particularmente considerando a ampla distribuição dos prions nos tecidos de pacientes com vCJD (41), os números potencialmente grandes de indivíduos afetados e a transmissibilidade da doença de prion nas formas sub-clínica e pré-clínica (63). Estudos recentes também demonstraram a transmissão experimental das doenças de prions usando fios metálicos contaminados com prion (64), destacando o risco de transmissão via procedimentos cirúrgicos e ainda existem incertezas com relação aos riscos de transmissão da vCJD via produtos sangüíneos (65). Uma outra rota de transmissão via uso de bio-espécimes no desenvolvimento de drogas foi revelada por um recente recolhimento de um lote de preparação contendo albumina de um doador do Reino Unido que foi diagnosticado com vCJD (66); apesar deste recolhimento, pelo menos 757 pacientes já tinham recebido a droga.
Atualmente no Reino Unido, instrumentos cirúrgicos que sabidamente foram usados em casos suspeitos de CJD ficam em quarentena até a confirmação do diagnóstico (31) e somente são reutilizados se um diagnóstico alternativo for confirmado. Além disso, produtos de plasma somente são utilizados de fontes de fora do Reino Unido (31).
Também existe uma preocupação no Reino Unido com uma possível transmissão de EEB para ovinos, com os problemas subseqüentes da diferenciação entre EEB ovina e scrapie e os problemas dos riscos para a saúde humana de ovinos infectados. A barreira ao uso de produtos animais na ração de todos os animais de produção deve proteger as populações de ovinos de contrair EEB e não foi observado o surgimento de scrapie desde a epidemia de EEB (67).
Rastreamento da vCJD
Áreas de pesquisa para proteção da saúde pública estão voltadas para as melhorias dos testes de rastreamento (tanto para indivíduos como para sangue e tecidos doados), para os procedimentos de descontaminação de instrumentos cirúrgicos e a terapêutica. O desenvolvimento do diagnóstico pré-clínico e de testes de rastreamento é imperativo para fornecer um potencial para controlar a disseminação da doença e para o tratamento em indivíduos afetados antes do início dos sinais clínicos.
Atualmente, muito pouco pode ser feito após o diagnóstico de doença de prion porque a progressão para um estágio sintomático é marcada pela neurodegeneração irreversível e, tradicionalmente, o diagnóstico das doenças de prions não hereditárias só pode ser confirmado com a autópsia. Existem vários critérios usados atualmente para determinar a provável presença de vCJD (40) em pacientes vivos e estão sendo feitos consideráveis progressos com o desenvolvimento de um diagnóstico através da biópsia das amídalas, que explora a ampla distribuição do prion nos tecidos da vCJD comparado com outras doenças de prions (38). Até agora, a biópsia tem sido 100% sensível e específica para vCJD; ela permite uma confirmação antes da morte do diagnóstico de vCJD. Ela também tem potencial para diagnóstico pré-clínico se a amídala apresentar resultado positivo para indivíduos pré-sintomáticos.
A identificação de uma terapia para doenças de prions é complicada pelos muitos tipos desconhecidos de doenças de prions, mas é possível identificar três principais áreas de pesquisa: 1) remoção do PrPC; 2) bloqueio da conversão entre PrPC e PrPSc; e 3) degradação e remoção do PrPSc. A degradação e remoção do PrPSc pode ser possível, mas ineficaz, porque não se sabe se o PrPSc por si próprio é a causa da neurodegeneração. A remoção do PrPC não é aplicável à população humana, apesar de ter sido mostrado em animais experimentais que a função normal do PrPC é dispensável (68,69). Estas descobertas validam qualquer agente terapêutico visando bloquear a conversão entre as duas isoformas da proteína prion, tornando esse o acesso terapêutico mais promissor – que pode oferecer profilaxia contra doenças de prion. A ausência de resposta imune do hospedeiro a doenças de prions possibilita que medidas de imunoterapia sejam usadas e a eficácia do tratamento com anticorpos foi recentemente demonstrada tanto em cultura de células como em modelos animais de doenças de prions (70-72).
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Fonte: Baseado em artigo de Clare R Trevitt (MRC Prion Unit, Divisão de Neurociência, Faculdade de Medicina, Imperial College, Norfolk Place, Londres) e Pramil N Singh (Departamento de Epidemiologia e Bioestatística, Escola de Saúde Pública, Universidade Loma Linda, Loma Linda, Califórnia), publicado no American Journal of Clinical Nutrition, Vol. 78, No. 3, 651S-656S, Setembro 2003.
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1 O tecido nervoso é constituído por dois componentes principais: os neurônios e as células da glia ou neuróglia, que, além de sustentarem os neurônios, participam da atividade neural, da nutrição dos neurônios e de processos de defesa do tecido nervoso. Os astrócitos são as maiores células da neuróglia.