Ed Hoffmann Madureira
No início da década de 40, a progesterona tornou-se disponível e foi empregada para controlar o ciclo estral de ruminantes. Utilizavam-se injeções diárias de aproximadamente 100 mg por um período de 14 dias. Após o término da seqüência de injeções ocorria uma sincronização dos estros e da ovulação numa grande proporção de animais tratados (JÖCHLE, 1993).
Nos anos 50, vários progestágenos, ativos pela via oral, foram sintetizados e puderam substituir a progesterona, na criação de um “corpo lúteo” artificial. Um dos mais amplamente utilizados foi o acetato de melengestrol (MGA – ZIMBELMAN; SMITH, 1966).
Tratamentos nos quais o MGA era empregado por 10 a 18 dias possibilitavam alta porcentagem de animais em estro, porém a taxa de concepção do primeiro serviço era em média 14% menor. Esta redução na fertilidade foi temporária e restrita a um período de 10 dias após o tratamento (ZIMBELMAN et al., 1970).
WILTBANK; KASSON (1968) observaram que os tratamentos com progestágenos por menos do que 14 dias não reduziam a taxa de concepção, mas para serem eficazes, um agente luteolítico necessariamente deveria ser incorporado ao sistema de sincronização.
O uso de estrógeno como luteolítico, em conjunto com progestágenos, foi inicialmente explorado por WILTBANK et al. (1965) e esta combinação resultou, 5 anos mais tarde, no sistema Syncro-MateB (SMB – WILTBANK et al., 1971).
WILTBANK; GONZALEZ-PADILHA (1975) relataram a indução e sincronização de estros, em novilhas que não estavam ciclando, após a utilização do sistema SMB, que consistiu do inserção de um implante auricular contendo 6 mg de norgestomet, que permaneceu por 9 dias, associado a uma injeção intramuscular de 5 mg de valerato de estradiol e 3 mg de norgestomet, administrado no momento da colocação do implante. O implante de norgestomet serviria como um corpo lúteo artificial, e a injeção (norgestomet e valerato de estradiol) inibiria a formação ou iniciaria a regressão do corpo lúteo.
O sistema SMB claramente resulta em altas porcentagens de resposta em estros (77-100%), sendo que taxas superiores a 90% são encontradas na maioria dos trabalhos publicados. As taxas de concepção deste estro, no entanto, variaram de 33 a 68% (ODDE, 1990).
Quando a prostaglandina F2a (PGF) foi identificada como o fator uterino luteolítico no ciclo estral de fêmeas ovinas e bovinas (McCRAKEN et al., 1972; KNICKERBOCKER et al., 1988), análogos sintéticos foram desenvolvidos e puderam ser utilizados para induzir luteólise prematura durante o diestro. Protocolos que empregavam 2 aplicações de PGF com 11 dias de intervalo foram desenvolvidos por LAUDERDALE (1975). Entretanto, este tratamento não possui um grau de sincronização preciso o suficiente para que o inseminação artificial (IA) possa ser realizada em momento pré-fixado.
De fato, quando injetada durante o diestro, a PGF induz a regressão morfológica e funcional do corpo lúteo permitindo o crescimento e a ovulação do folículo dominante, num período que pode variar de 2 a 6 dias. Segundo KASTELIC et al. (1990) esta variação não é devida às diferenças na velocidade da regressão luteínica e sim às diferenças no estado de maturação do futuro folículo ovulatório no momento do tratamento com PGF.
A associação de um progestágeno com PGF como agente luteolítico, ao invés da administração de estrógeno, tornou-se bastante popular à partir da década de 70. Entretanto, tratamentos de 7 dias com MGA e uma dose de PGF aplicada no 7o dia apresentaram redução na taxa de concepção dependendo do monmento do ciclo estral no qual o tratamento se iniciava.
A taxa de concepção foi maior quando o início do tratamento ocorreu até o 13o dia do ciclo estral (66,0%), em relação ao grupo tratado entre o 14o e o 20o dias do ciclo (36,0% – BEAL et al., 1988).
Portanto, a causa da redução de fertilidade poderia ser explicada pelo aumento do intervalo interovulatório que provocava atraso na ovulação e formação de folículos persistentes. Os folículos persistentes secretam grandes quantidades de estradiol, por um período anormalmente longo, e foram correlacionados com a baixa fertilidade que ocorre, quando os tratamentos são inciados no final do ciclo estral (BEAL et al., 1990; CUSTER et al., 1994).
Outros trabalhos demonstraram que os tratamentos com progestágenos iniciados na ausência de corpo lúteo (RAJAMAHENDRAN; TAYLOR, 1991; KOJIMA et al., 1992; SANCHES et al., 1993) permitem um padrão secretório de LH característico da fase folicular, ou seja, alta freqüência e baixa amplitude e não um padrão característico de diestro, baixa freqüência e alta amplitude (RAHE et al., 1980; WALTERS et al., 1984) resultando na manutenção prolongada do folículo dominante, interrompendo o padrão usual do crescimento folicular em ondas.
Este padrão secretório de LH desencadeia os mecanismos de maturação nuclear, mas não é suficiente para provocar a ovulação, que só ocorre quando se interrompe a administração do progestágeno. Portanto, parece que os folículos persistentes ovulam ovócitos “envelhecidos” e menos férteis (KOJIMA et al., 1992).
À medida em que os conhecimentos sobre a dinâmica folicular e efeitos de progesterona e progestágenos sobre o desenvolvimento folicular foram crescendo, durante a década de 90, alteraram-se os princípios empregados na concepção de protocolos de sincronização do estro. Talvez um dos principais conceitos introduzidos, neste momento, tenha sido o de que incrementos na taxa de concepção poderiam ser obtidos com a atresia do folículo dominante, no início do tratamento com progesterona/progestágeno, impedindo-se assim, a formação de folículos persistentes, permitindo o desenvolvimento de uma nova onda folicular, da qual resultaria o folículo dominante ovulatório apto à fertilização.
BO et al. (1994) verificaram que o tratamento com 17b-estradiol associado aos progestágenos é capaz de provocar a regressão folicular, resultando na emergência de uma nova onda folicular, em média 4,3 dias após o tratamento.
A sincronização da emergência de um novo folículo, durante o período de administração de progesterona/progestágeno, proporciona pelo menos duas vantagens: 1) evita-se a formação de folículos persistentes o que diminui a possibilidade de redução da taxa de concepção e 2) homogeniza-se o “status” folicular ao final do tratamento, de modo que os estros são melhor agrupados, tornando a IA em tempo fixo uma realidade.
Com base nestes resultados, pode-se compreender melhor a ação da injeção de norgestomet + valerato de estradiol que faz parte dos sistemas SMB e Crestar. Ela não só inibe a formação ou inicia a regressão do C.L. como também provoca atresia dos folículos dominantes presentes no ovário, quando do início do tratamento, sincronizando a emergência da nova onda folicular. Devido ao fato do valerato de estradiol possuir vida média muito longa, os implantes deverão permanecer por 9 ou 10 dias.
Produtos como CIDR ou PRID constam de dispositivos vaginais, revestidos com silicone misturado à progesterona.
Com o objetivo de provocar atresia nos folículos dominantes e sincronizar a emergência da nova onda folicular, recomenda-se a aplicação de 1,0 a 2,0 mg de benzoato de estradiol no momento de colocação dos dispositivos. Como o benzoato de estradiol possui uma vida média curta, os dispositivos poderão permanecer por um período mais curto (7 ou 8 dias). Entretanto, o benzoato de estradiol não parece ser tão eficaz quanto o valerato de estradiol para provocar regressão luteínica, de modo que uma aplicação de PGF se faz necessária no momento em que os dispositivos são retirados.
Os sistemas SMB, Crestar, CIDR e PRID oferecem alta porcentagem de animais em estro, num período bastante curto, o que possibilita a realização de uma I.A. em tempo fixo, geralmente entre 48 e 60 horas após a retirada dos implantes ou dispositivos vaginais.
Se isto ocorre, é porque o “status” folicular, no final do tratamento é bastante homogêneo entre os animais o que possibilitaria a sincronização da ovulação, mediante a aplicação de drogas que desencadeiem o pico pré-ovulatório de LH.
VASCONCELOS et al (1997) recomendaram a aplicação de GnRH 30 horas após a retirada dos implantes de SMB e I.A. 24 horas após a aplicação de GnRH.
A aplicação de 0,5 a 1,0 mg de benzoato de estradiol 24 horas após a retirada dos implantes sincroniza o estro e a ovulação aumentando inclusive a porcentagem de fêmeas bovinas que ovulam após o tratamento (MACMILLAN, 1999).
Segundo CAVALIERI et al (1997) a aplicação de 400 UI de eCG, no momento de retirada dos implantes, provocou um incremento no grau de sincronização, com redução significativa da variação no tempo para a ovulação e para o pico de LH.
É possível, portanto, não só sincronizar o estro, mas também a ovulação pelo uso de GnRH, Benzoato de estradiol ou eCG e realizar a I.A. em tempo fixo.
Qual a real vantagem de se realizarem as I.A. em tempo fixo sem necessidade de detecção de cios?
É a de que 100% das fêmeas podem ser inseminadas após os tratamentos de sincronização da ovulação, enquanto que apenas cerca de 60% delas são inseminadas, num período de 3 semanas, num sistema tradicional. Isto significa dizer que a taxa de serviçoa pode ser de 100% desde que a taxa de concepçãob seja aceitável o que já é uma realidade.
Entretanto, esta conclusão nos remete a uma outra questão: visto que nem todas as fêmeas cujas ovulações foram sincronizadas tornar-se-ão prenhes o problema das falhas de detecção de cios e conseqüentemente a diminuição de taxa de serviço não ressurgiria à medida em que as fêmeas não prenhes tiverem que ser re-inseminadas?
Certamente que sim. Apenas cerca de 50% das fêmeas que retornam ao estro são re-inseminadas. Portanto, a sincronização do retorno ao estro pode ser tão importante quanto a sincronização de estros que precede a primeira I.A.
Neste sentido, MACMILLAN (1999) propôs um esquema de re-sincronização de estros que consiste em reimplantar os CIDR previamente utilizados, nas fêmeas bovinas, duas semanas após a I.A. Recomendou também a injeção de 1,0 mg de benzoato de estradiol no dia da inserção e a remoção do dispositivo 7 dias após, sem, logicamente, aplicar-se PGF.
As vacas devem ainda receber uma baixa dose de benzoato de estradiol (0,5 ml) 24 horas após a retirada do CIDR e serem inseminadas à medida em que forem sendo detectadas em estro.
Valendo-se do uso deste protocolo MACMILLAN (1999) obteve 48,3% de taxa de prenhezc na primeira I.A., atingiu 76,6% após a segunda I.A., possibilitada pela re-sincronização, chegando à 84,8% quando realizou uma terceira rodada de I.A. proporcionada por uma re-sincronização adicional. Ressalte-se que este índice de prenhez foi obtido num período de 45 dias dos quais apenas 7 dias foram gastos com detecção de cios e I.A.
A grande maioria dos protocolos de sincronização de estro/ovulação vem sendo aplicada com sucesso no Brasil, tanto em animais zebuínos, quanto taurinos e mestiços de corte e leite. Há, entretanto, necessidade de uma maior divulgação e emprego desta tecnologia, no rebanho nacional, o que certamente trará incrementos significativos de produtividade.
a taxa de serviço = no de animais inseminados em relação ao no de animais disponíveis para I.A.
b taxa de concepção = no de animais prenhes em relação ao no de animais inseminados
c taxa de prenhez = no de animais prenhes em relação ao no de animais tratados ou disponíveis para I.A. Em outras palavras
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