Recente artigo publicado em um informativo de uma cooperativa mineira é inicialmente transcrito abaixo:
“Sorgo e mandioca podem causar intoxicações nos animais
As plantas cianogênicas podem representar perigo para os animais. As duas principais espécies que contém ácido cianídrico são o sorgo e a mandioca que, se ingeridos pelos animais, podem levar à morte nas seguintes condições:
1. O sorgo é tóxico na fase de rebrota e plantas jovens com menos de 20 cm ou 7 semanas de plantadas;
2. A ingestão de folha de mandioca em brotação também oferece risco aos ruminantes.
Sinais e sintomas
– Respiração ofegante (cansado)
– Tremores musculares
– Excitação
– Salivação
– Convulsão
– Dilatação das pupilas
A intoxicação tem evolução aguda com sintomas aparecendo em até 15 minutos e morte logo após. Daí a importância do diagnóstico ser rápido para entrar com o tratamento que é específico, com soluções endovenosas.”
FONTE: Caderno Técnico CRMV
Colaboração: Domingos J. de Resende
Veterinário da COCATREL
Antes de tecer comentários, vou reproduzir novamente parte de artigo publicado neste mesmo espaço:
Ácido cianídrico
“O sorgo possui um heteroglucosídeo cianogënico, a durrina (C14H17O7N), que encontra no rúmen condições ideais para ser transformado por ação enzimática da emulsina em ácido cianídrico, glucose e p-hidroxibenzaldeído. Dependendo do nível de ácido cianídrico, pode haver morte do animal por asfixia.
O risco de intoxicação é maior quando o sorgo é utilizado para pastejo direto ou corte, principalmente nas rebrotas, pois a durrina concentra-se mais nas folhas superiores das plantas. Entretanto, com o avanço da maturidade ocorre uma redução dos níveis desta substância na planta, que só deve ser utilizada quando atingir aproximadamente um metro de altura ou estiver próxima do florescimento, porque seguramente este nível tóxico é bem baixo (10% do encontrado na fase vegetativa), não apresentado nenhum perigo aos animais.
Adubações nitrogenadas podem aumentar os valores de ácido cianídrico (HCN) na planta, dependendo do nível de nitrogênio do solo. Há também correlação positiva entre conteúdo de ácido cianídrico em sorgo e temperatura média diária, e negativa com a precipitação pluviométrica. Em países de clima tropical o problema é menos intenso do que em climas temperados, inclusive com animais pastejando plantas novas sem apresentarem intoxicação, provavelmente pelo metabolismo mais intenso das plantas de sorgo nesses climas.
Forragens na forma de feno (desidratadas) apresentam uma redução nos teores de ácido cianídrico, mas podem apresentar intoxicação pelo maior consumo de matéria seca em menos espaço de tempo, principalmente em fenos de plantas novas cortadas após geadas. O processo de fermentação que ocorre com a silagem evita intoxicação pela decomposição dos princípios tóxicos em gases inofensivos, aliado ao fato de que no momento da ensilagem as plantas encontram-se com níveis reduzidos do ácido.
Os sorgos podem ser classificados quanto ao seu grau de toxicidade em “muito baixo” (0 a 25 mg/100g matéria seca), “baixo” (25 a 50 mg), “médio” (50 a 75 mg), “alto” (75 a 100 mg) e “muito alto” (100 mg). ”
Tanino
O tanino, complexo de polímeros fenólicos, é encontrado nos sorgos em níveis muito variáveis, mas pode inclusive servir como parâmetro para classificação dos mesmos em tipos com baixos ou altos teores. Variedades de sorgo cujas sementes apresentam pericarpo escuro se caracterizam por apresentarem elevado teor de tanino (1,3 a 2,0% ou mais), enquanto que as de cor clara, baixos teores (0,2 a 0,4%). Sorgos com altos teores de tanino são conhecidos também com anti-pássaros.
Os principais taninos encontrados nos grãos de sorgo são as leucoantocianinas. Proantocianinas têm sido identificadas em folhas de muitas espécies e pigmentos de flores. Os taninos das folhas de sorgo não têm sido bem identificados. A sua concentração nas diversas partes da planta varia com o estádio de desenvolvimento. Monômeros de tanino são continuamente sintetizados nos frutos e folhas e são polimerizados em órgãos mais velhos. Esta condensação dos monômeros é causa da redução da adstringência. Aos taninos e seus monômeros, substâncias adstringentes presentes nos vegetais, são atribuídas a indisponibilidade da fração protéica por insolubilização, depressão de consumo voluntário e inibição do crescimento bacteriano.
Tem sido atribuído à silagem de sorgo, valor nutritivo e desempenho animal inferiores aos da silagem de milho. Fatores antiqualitativos como o teor de tanino nos grãos a nas demais partes da planta de sorgo tem sido apontado como um dos responsáveis por esta característica em função da correlação negativa entre o seu teor e a digestibilidade da matéria seca. O processo de ensilagem reduz o teor de tanino dos grãos e aumenta a sua digestibilidade, mas pouco influi sobre o seu teor em outras partes da planta. Entretanto, o tanino dos grãos representa a maior parte do tanino presente na planta; isto evidencia que o tanino dos grãos deve ser diferente do tanino daquele presente nas outras partes da planta. As ráquis apresentaram altos teores de tanino, entre 7,8 e 9,7% na MS.
Alguns pontos devem ser salientados:
1. O sorgo é realmente uma planta com substâncias cianogênicas;
2. As referências sobre intoxicações são antigas (décadas de 50 e 60) e se referem a países de clima temperado (EUA e Europa);
3. Em países de clima tropical o crescimento acelerado das plantas reduz significativamente o problema;
4. Não há referências bibliográficas citando intoxicações no nosso país;
5. Há excessivo alarde sobre esse fato pela mídia, o que dificulta sobremaneira uma maior utilização do sorgo para grãos, silagem ou pastejo;
6. As empresas reduziram drasticamente os valores destas substâncias com o melhoramento genético;
7. Há muita confusão entre esse princípio tóxico e o tanino, que apenas pode reduzir um pouco a digestibilidade em monogástricos, porém NÃO É TÓXICO. Para ruminantes praticamente não há efeito;
8. A possibilidade de consumo de plantas com menos de 20 cm é rara e indica uso incorreto do sistema de manejo de pastagens e ou produção de silagens.
Comentário BeefPoint:Devido à falta de conhecimento mais aprofundado sobre o assunto, existe uma preocupação excessiva dos técnicos, veterinários e pecuaristas com relação a possíveis intoxicações pelo ácido cianídrico, pois em condições tropicais não há relatos de intoxicações. Isso se deve ao uso quase exclusivo do sorgo de linhagens de baixos teores de durrina para silagem e grãos, sendo poucas as propriedades que o utilizam para fenação ou pastejo. A intoxicação depende da quantidade das substâncias presentes na planta e da quantidade ingerida pelo animal desta planta. Quando a concentração é maior, a ingestão é bastante comprometida, e quando a ingestão é maior, as concentrações são muito reduzidas. Ou seja, HÁ RISCO REMOTO, PRATICAMENTE INEXISTENTE DE INTOXICAÇÃO COM A INGESTÃO DE SORGO. Portanto, essa planta deve ser utilizada de uma forma mais ampla devido às suas inúmeras características desejáveis que o colocam como uma solução muito mais correta para situações de clima e solo não ideais para o milho.
Fonte: DEMARCHI, J.J.A.A.; BOIN, C.; BRAUN, G. A cultura do sorgo (Sorghum bicolor L. Moench) para a produção de silagens de alta qualidade. Zootecnia, v. 33, n.3, p.111-136, 1995.