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Nutrição de doadoras e receptoras de embrião: parte 2

4) Nutrição de receptoras de embriões

A taxa de gestação das receptoras é o elemento chave da relação custo-benefício de qualquer programa comercial de TE. Para a obtenção de bons índices a receptora deve ser uma fêmea de ótima fertilidade, característica esta que depende de variáveis relacionadas ao animal, à técnica e ao embrião que é transferido.

Considerando as características da receptora, esta deve possuir condição ideal para receber o embrião e lhe proporcionar ambiente adequado ao seu desenvolvimento. Nesta categoria de animais num programa de TE, a nutrição influencia variáveis como a secreção uterina, perfil hormonal, morte embrionária, e outras determinantes da taxa de gestação.

4.1) Nutrição e Manutenção da Gestação

A nutrição inadequada pode afetar e gestação de duas formas: pode causar morte fetal ou reduzir o desenvolvimento do concepto. Embora esta última característica não seja considerada perda reprodutiva, implica numa menor probabilidade de sobrevivência do recém-nascido (Barnes and Dileman, 2000).

A principal fase na qual a nutrição pode afetar o desenvolvimento do concepto é no inicio da gestação. Este efeito é particularmente delicado até o reconhecimento materno da gestação, que no bovino ocorre entre 17 e 25 dias após a concepção. Após esta fase ocorre na fêmea gestante, alteração na partição dos nutrientes, com maior prioridade para a gestação, desta forma variações nutricionais refletem menos no desenvolvimento do embrião.

A troca de informações entre células trofoblásticas e epiteliais do endométrio são o aspecto crítico para a manutenção do corpo lúteo. Metabólitos circulantes no sangue materno, como alguns ácido graxos poliinsaturados, podem alterar, juntamente com as substâncias produzidas pelo embrião, a secreção de PGF2a pelo endométrio (Thatcher et al., 2002).

Pensando na utilização deste mecanismo na prática, o melhor período de suplementação das receptoras, para melhorar a sobrevivência do zigoto, seria até 20 a 25 dias após a inovulação, período que já ocorreu o reconhecimento materno da gestação, e a partir daí a gestação é menos vulnerável a variações nutricionais.

Foto: O período onde a nutrição mais influencia na manutenção da gestação é no seu início

Os efeitos nutricionais deletérios em estágios mais avançados da gestação são menos freqüentes. Antes de discutir estes efeitos é importante lembrar a relação de crescimento de placenta e feto na gestação. A placenta cresce mais rapidamente nos dois terços iniciais da gestação, enquanto a maior taxa de crescimento fetal ocorre no terço final deste período.

Restrição alimentar no inicio da gestação pode limitar o desenvolvimento placentário e reduzir a capacidade posterior de desenvolvimento fetal. Ao final da gestação a nutrição inadequada reduz o crescimento fetal. Este efeito ocorre por diminuição na disponibilidade dos alimentos e não por efeitos na placenta.

Curll et al.(1975) relatam que a suplementação excessiva principalmente de animais que sofreram restrição alimentar em períodos anteriores da gestação, pode aumentar em demasia o tamanho do feto e causar distocia.

4.2) Proteína e taxa de gestação

Elrod and Butler (1993) num experimento com novilhas, utilizando dieta com excesso de proteína (tabela 3) demonstram efeito deletério deste componente nutricional sobre a reprodução. Para conseguir este efeito, aumentaram a proteína da dieta total de 15,5 para 21,8%. As dietas utilizadas apresentavam também redução energética, cerca de 70% do recomendado pelo NRC.

Tabela 3. Composição da dieta de novilhas com dois níveis de proteína degradável no rúmen (Elrod and Butler, 1993)


Estes autores relatam que os efeitos deletérios da proteína dietética ocorrem principalmente quando existe na dieta excesso de proteína degradável no rúmen, pois esta é rapidamente convertida a amônia, absorvida e reconvertida em uréia pelo fígado.

O aumento da uréia circulante poderia alterar o ambiente uterino e prejudicar o desenvolvimento do embrião. Neste experimento a taxa de gestação do grupo que recebeu a dieta com o nível normal de proteína foi melhor (tabela 4).

Tabela 4. Variáveis reprodutivas em novilhas recebendo dietas isocalóricas com 2 níveis de proteína degradável no rúmen (Elrod and Butler, 1993)


A análise da duração do ciclo estral após a inseminação mostrou que os animais não gestantes retornaram ao estro mais tarde, principalmente no grupo com excesso de proteína na dieta. Nesse grupo, 43,7% das novilhas retornaram ao estro num período entre 26 e 36 dias. Fato que não ocorreu no grupo com níveis normais de proteína na dieta.

Estes resultados demonstram que os efeitos deletérios sobre o embrião ocorrem após 16 a 18 dias pós-inseminação. Neste caso já teria ocorrido o reconhecimento materno da gestação, e quando o embrião morre após esta fase, ocorre retardo na luteólise e retorno ao estro num período além do normal.

4.3) Produção de Progesterona e Nutrição

Os efeitos da nutrição sobre a produção de progesterona são enfocados em vários trabalhos, porém os resultados às vezes são conflitantes (Jakowski et al., 1994; Fonseca et al, 2001). O efeito, quando ocorre segundo Villa-Godoy et al.. (1988) é principalmente relacionado ao balanço energético. Este por sua vez é função de uma série de características, principalmente o requerimento nutricional do animal e a quantidade da dieta ingerida.

Num experimento com vacas holandesas, estes autores relatam correlação entre balanço energético e concentração de progesterona. Os animais que apresentam maior perda de peso no pós-parto exibiram menores taxas de progesterona. Este efeito pode ocorrer diretamente sobre a produção de progesterona pelo corpo lúteo, como pela alteração na secreção de gonadotrofinas.

Cuidado adicional deve ser tomado ao se tentar aumentar de forma indiscriminada a taxa de progesterona das receptoras. Fernandes (1994) mostra que mais de 90% das receptoras possuíam no momento da inovulação concentrações séricas de progesterona compatíveis com a gestação. O mesmo estudo mostrou que as receptoras com níveis deste esteróide muito elevado apresentaram taxa de gestação inferior.

Não parece ser uma alternativa correta ou viável, tratamentos para aumentar a concentração plasmática de progesterona nas receptoras sem se saber se esta é uma variável limitante e se realmente existe necessidade deste procedimento, ou seja, um número razoável de animais que possuem baixos níveis deste hormônio no momento da inovulação.

5 – Conclusões

A nutrição exerce grande influência em qualquer atividade relacionada á reprodução de bovinos. Com a técnica de Transferência de Embriões não é diferente, afetando a performance de doadoras e receptoras de embrião. Os aspectos nutricionais são importantes em todos os períodos da vida destes animais, porém em ocasiões específicas são mais importantes, influenciando de forma mais determinante os mecanismos relacionados á superovulação, produção embrionária e taxa de gestação de receptoras.

Algumas vezes, o excesso de algum componente na dieta também pode ser prejudicial, portanto há de se adequar não somente a quantidade, mas também a qualidade da nutrição dos animais.

Por exercer influencia tão marcante em todas as etapas do processo de TE, acredita-se que a manutenção dos animais em condições nutricionais adequadas, com atenção especial para períodos cruciais, seja um dos procedimentos de melhor relação custo-benefício relacionado a esta tecnologia.

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