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Os mitos da carne argentina, por Miguel Schiariti, presidente da Câmara da Indústria e Comércio de Carnes da República Argentina

Para os especialistas a pecuária tem sido historicamente nossa principal atividade produtiva, nossa primeira indústria nacional. Sendo assim, a história de nossa pecuária e de nossa carne não pode ser separada de nossa história como nação, nem tampouco da história como consumidores de carne bovina.

Por Miguel Schiariti, presidente da Câmara da Indústria e Comércio de Carnes da República Argentina (CICCRA)

Para os especialistas, a pecuária tem sido historicamente nossa principal atividade produtiva, nossa primeira indústria nacional. Sendo assim, a história de nossa pecuária e de nossa carne não pode ser separada de nossa história como nação, nem tampouco da história como consumidores de carne bovina.

No entanto, não somos os mesmos consumidores do século passado, nem a pecuária e a indústria são o que eram. As melhorias na genética animal, a incorporação da tecnologia, a necessidade de adotar padrões de qualidade e regulamentações sanitárias para incorporar novos mercados, as novas formas de comercialização, o crescimento das cadeias de valor das carnes substitutas e a variação do gosto dos consumidores produziram mudanças profundas e permanentes na cadeia de valor da carne bovina argentina.

Mudamos, profundamente. O que não mudou em absoluto foram as políticas. Para a carne, as respostas variaram pouco desde que Juan Martín de Pueyrredón fechou os “saladeros” (charqueadas, instalações de produção de charque) em 1817 que para nossa surpresa, foi para manter o preço, instalando uma dicotomia mercado interno-exportação, que segue se repetindo nesses dias como uma verdade absoluta e inquestionável, o que não passa de um mito, pois nossa cadeia tem a potencial de abastecer ambos os mercados. Se permitirem, claro.

Mas não permitem, pelo mito do aumento dos preços no varejo. E digo mito, porque em 2010, os preços ao público se multiplicaram por três, caiu em 20% o consumo por habitante e, em 2011, o Kirchnerismo ganhou as eleições com 54% dos votos.

Apesar dessa evidência, o governo está impregnado de uma visão em que o objetivo único e máximo da regulamentação deve ser o abastecimento de açougues e supermercados da região metropolitana, que são o último elo da cadeia, deixando de considerar 60% da população do país. O governo nos lembra aquela piada em que a mãe pergunta ao filho: sabe de onde vem o leite? E o filho responde: é claro, vem do supermercado.

Parece que a carne chega à gôndola de forma espontânea, ou talvez trazida por algum gaúcho de um rebanho que vaga livre pelas grandes estâncias sem cercas da pampa úmida. Essa imagem, no entanto, não tem nada a ver com a realidade atual, pois a carne que chega às gôndolas é produto de um processo complexo que envolve tempo, melhoramento genético, práticas de manejo do rebanho, sanidade, pastagens e cuja oferta está influenciada por coisas tão básicas como clima e o precário estado de nossas rodovias. Um processo produtivo no qual participam produtores, transportadores, frigoríficos atacadistas, funcionários altamente qualificados, profissionais, fornecedores de insumos de toda a cadeia que incorpora tecnologia e agrega valor.

Frente a essa complexidade, seguimos com os anúncios de intervenções no mercado de Liniers e restringindo as exportações, ainda que atualmente pelo mercado passe menos de 11% das compras e vendas de bovinos e as exportações atuais sejam somente de 6% da produção total, ou seja 250 gramas por habitante e que a quantidade de fábricas caiu de maneira significativa nos últimos 10 anos.

Já sabemos o que nos custaram e continuam custando as políticas da Secretaria de Comércio Interior: perdas de 12 milhões de cabeças, fechamento de 130 estabelecimentos frigoríficos, aumento do preço ao público de 200%, queda de 20% do consumo e 75% de queda das exportações, com perdas de oportunidades e de negócio incalculáveis, tudo isso aproveitado por nossos concorrentes, igualzinho ocorreu no século XIX.

Nessas condições, seria lógico seguir com as mesmas receitas que nos trouxeram a esse lugar? Já é hora de avisar: o famoso “bife argentino” é agora na Europa de origem uruguaia, brasileira ou norte-americana. O mundo já quase não desfruta de nossas carnes. E isso não se deve à nenhuma conspiração internacional. Deve-se ao fato de continuar regulamentando o setor como no século XIX para uma produção, uma indústria e uns consumidores do século XXI.

Talvez seja hora da regulamentação da cadeia de valor da carne argentina ficar em mãos de profissionais e especialistas que conhecem o setor e que possam dar soluções de acordo com a realidade e nos permitam livrar-nos dos mitos que não fizeram mais que impedir o desenvolvimento de todo o potencial de um setor que, se permitirem, pode empregar mão de obra intensiva e qualificada, incorporar valor agregado em origem e gerar receitas genuínas para o país.

Por Miguel Schiariti, presidente da Câmara da Indústria e Comércio de Carnes da República Argentina (CICCRA)

Fonte: La Nación, traduzida e adaptada pela Equipe BeefPoint.

2 Comments

  1. leonardo santanna disse:

    A intervenção estatal é uma praga lesa humanidade. Em alguns países, como a Argentina e Brasil, é uma doença endêmica, lamentavelmente. Tudo é fruto desse capitalismo tutelado de inspiração autoritária, como foi acontecer em questões de estado.

  2. Felipe Kleiman disse:

    Triste fim terá a cadeia da carne argentina, ao que tudo indica.

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