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Representantes rurais do Sul definem hoje se vacinam ou não os rebanhos

Representantes de 129 sindicatos rurais se reúnem hoje na Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), em Porto Alegre, para discutir se o perigo representado pelos focos de aftosa na Argentina exige a aplicação de vacinação preventiva, como defendem o secretário da Agricultura do Estado, José Hermeto Hoffmann, e dezenas de associações de criadores.

O ministro da Agricultura, Marcus Vinícius Pratini de Moraes, disse ontem, na capital gaúcha, que respeitará a decisão dos governos e de produtores do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, mas alertou que a retomada da vacinação representará sérios prejuízos para a carne brasileira no Exterior.

Há também uma divergência sobre a vacinação ocorrer em um único Estado do Circuito Sul. Segundo o ministro, a decisão não deve ser isolada. O presidente da Farsul, Carlos Sperotto, afirma que a posição majoritária das associações é pela vacinação, e que não há preocupação quanto à decisão de Santa Catarina. Segundo Sperotto, dirigentes da Federação da Agricultura catarinense justificam que, naquele Estado, há cobertura vacinal de 95% do rebanho até 10 de maio.

O Rio Grande do Sul exporta 12 mil toneladas de carne suína para a Rússia, o que representa US$ 12 milhões. “Negociei com os russos. E estamos chegando no mercado japonês. Tudo isso será perdido se vacinarmos o rebanho” – afirmou Pratini, advertindo que o atual momento do Brasil é excelente no mercado internacional de carnes.

O presidente do Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos, Daltro Giacomazzi, afirma que a vacinação somente no Rio Grande do Sul significará “um suicídio” para criadores e industriais do setor. Para ele, a vacinação resultará em perda de mercado, e terá ainda como conseqüência o fechamento de diversas agroindústrias.

As fronteiras de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul podem ser fechadas para animais e derivados, caso os gaúchos continuem pressionando os catarinenses a retomar a vacinação. A ameaça foi feita ontem pelo secretário da Agricultura de Santa Catarina, Odacir Zonta.

Hoje, entidades e lideranças do setor pecuário catarinense também fazem reunião para discutir os procedimentos adotados no combate aos problemas de sanidade animal e avaliar a pressão pela volta da vacina. Zonta recebeu a promessa do ministro de que hoje deve ser liberado o Exército para fiscalizar a fronteira com a Argentina.

O secretário catarinense avaliou que a vacinação pode colocar em dúvida até a classificação do Brasil em relação ao mal da vaca louca. Além disso, considera um desperdício de dinheiro, já que o trabalho teria que ser refeito. O governo de Santa Catarina solicitará uma reunião com a Secretaria de Agricultura gaúcha, com a presença do Paraná.

No Rio Grande do Sul, alguns municípios aumentam a pressão pela volta da vacina. Os procuradores da prefeitura de Barra do Quaraí pretendem ingressar hoje na Justiça Federal de Uruguaiana com uma ação requerendo a autorização para vacinar o rebanho. Em Barra do Quaraí, existem 37 mil cabeças de bovinos com elevado padrão genético. O secretário municipal de Agricultura e vice-presidente do Sindicato Rural, João Cristóvão, informou que a idéia foi proposta por criadores, preocupados com o risco de contaminação do rebanho do município.

Discurso por telefone

A Farsul considera hoje um dia histórico para o Rio Grande do Sul. Quem ligar para o fone 0800 51-2040 até o final da tarde desta quarta-feira ouvirá no plantão de notícias da Farsul o discurso do presidente da entidade, Carlos Sperotto. As palavras, em tom solene, reforçam o peso da gravidade da decisão que deve ser tomada pelos pecuaristas: retomar ou não a vacinação do rebanho contra a febre aftosa.

Em defesa da vacina

Em artigo publicado hoje no Zero Hora, o veterinário José Ernesto Wunderlich Ferreira, diretor técnico e vice-presidente da Associação de Criadores de Holandês do Estado (Gadolando), defende a vacina preventiva contra a aftosa e diz que os criadores gaúchos não deveriam colocar em risco o trabalho de gerações inteiras em seleção genética.

“Hoje não temos casos de aftosa no Estado, mas quem nos garante que não vamos acordar amanhã com essa notícia? Não podemos pensar em mercado. Sempre enfrentamos barreiras sanitárias que nos impediram de sermos grandes exportadores. Agora não podemos arriscar nosso patrimônio em função de eventual aumento nas exportações de carne, que não compensarão os prejuízos em caso de contaminação do rebanho gaúcho”, afirma o veterinário.

O custo da vacinação

“A questão da vacinação deve ser ampla e democraticamente analisada, sem paixões.” Esta é a opinião que o veterinário e consultor da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), José Fernando Dora, expressa em seu artigo também publicado hoje no Zero Hora. Ele lembra que gerações de produtores gaúchos, durante cerca de 125 anos, sofreram incalculáveis perdas devido à aftosa, e que só depois de muito esforço da veterinária e dos próprios pecuaristas conseguiu-se a erradicação.

O veterinário considera importante avaliar a interpretação internacional que será feita sobre a vacinação: “Passada essa “tormenta”, os países desenvolvidos serão mais rigorosos com seus parceiros comerciais, buscando reduzir os riscos sanitários. O patrimônio genético de nossos rebanhos é imenso e deve ser preservado. Entretanto, antes de defender a vacinação, há que considerar-se outras possibilidades, como a formação de “bancos genéticos” e outras ações sanitárias. Não estou certo de que todos conheçam a dimensão que um trabalho massivo requer para realizar uma etapa de vacinação nos mais de 400 mil rebanhos bovinos existentes no Rio Grande do Sul. A maioria deles, convém lembrar, rebanhos de sete a oito cabeças, o que significa que há que levar a vacina a cada uma de suas propriedades.” O consultor da Opas afirma também que a estrutura atual não é suficiente para assegurar uma vacinação efetiva, nem mesmo só para a sua fiscalização adequada.

(Por Márcia Mandagará, para Zero Hora/RS,04/04/01)

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