Esqueça El Niño, La Niña, a seca intensiva que estamos passando e todos os problemas financeiros que o País inteiro atravessa. Lamentar o fato de não termos um planejamento agrícola coerente, e das chuvas nunca chegarem no momento em que mais precisamos, não irá resolver problema nenhum. Para os pecuaristas, pelo menos, o momento não é de lamentações, mas sim de reflexão e atitude. Assim como na história da formiga e da cigarra, esse é o momento de pensar em aproveitar bem as chuvas do próximo verão para preparar a silagem que alimentará o gado no inverno do ano que vem.
1. Falta de alimento
Digo isso porque por mais otimistas que sejamos, não haverá outro meio de vencer a falta de alimento para os animais se não for tomada uma atitude certa agora, no momento em que se pode planejar o cultivo para produção do alimento para a próxima estação das águas. Essa é a hora de definir e planejar uma boa silagem. Deveríamos ter pensado nesta seca que estamos enfrentando um ano atrás, mas repetidamente o que vemos é uma preocupação com o período seco apenas quando ele já está presente e dificultando uma nutrição adequada dos animais através do alimento disponível nas pastagens. É um tal de buscar cana-de-açúcar, comprar resíduos, comprar silagem, comprar feno, comprar, comprar…
2. Silagem
A silagem é o produto final de um processo de conservação de uma cultura forrageira caracterizado pelo crescimento de microrganismos anaeróbios (fermentação por bactérias lácticas) através da degradação dos açúcares disponíveis na planta e sua transformação em ácidos orgânicos e conseqüente abaixamento do pH. É essa redução do pH associada à manutenção da anaerobiose (vedação bem feita) que possibilitará que o material se preserve durante um longo período de tempo. O processo de ensilagem é caracterizado pelo corte / picagem da planta, o seu transporte até o silo, a sua compactação e por último a vedação, ficando estocada para poder ser fornecida aos animais no momento em que o pasto já não suprir as necessidades nutricionais do rebanho. Como o gado é o maior investimento de um pecuarista e a perda de peso dos animais ou a redução na quantidade de leite produzido significam prejuízo certo, é inaceitável assistir parado ao seu patrimônio se desfazer.
3. Silagem de Milho, Sorgo e Girassol
O milho ainda é a principal cultura utilizada para produção de silagem e a que pode ser considerada a de mais alto valor nutricional. O girassol, cultura recentemente utilizada como planta para ensilagem, tem sido recomendada para plantio como segunda cultura, ou seja, na época denominada de safrinha. Exceto por um elevado teor de extrato etéreo na sua composição, a qualidade das silagens obtidas por ser considerada satisfatória, apesar de ainda precisarmos de mais pesquisa com essa espécie. Dentre as muitas razões para se indicar o sorgo como a cultura boa para produção de silagem, poderiam ser citadas: a sua boa tolerância a veranicos (sistema radicular 50% maior, cerosidade e característica xerófita das folhas); teor de proteína mais elevado; e menor custo de produção, já que o sorgo rebrota e pode ser cortado e ensilado no mínimo duas vezes em um único plantio. Hoje temos disponíveis vários híbridos que possuem elevado potencial de produção. Esse sistema radicular mais extenso é o que permite a essa planta buscar nutrientes onde as demais são incapazes, capacitando-a a crescer em solos de fertilidade mais reduzida. Além disso, o sorgo (de duplo propósito) tem um valor nutritivo muito próximo ao do milho e sua silagem pode ser recomendada para as mesmas categorias animais.
Nenhuma dessas três culturas precisa de qualquer tipo de aditivo para que a fermentação ocorra de modo satisfatório, diferentemente das gramíneas utilizadas para formação de pastagens, e que também têm sido ensiladas como forma de não se perder excedentes de produção de verão ou provenientes de áreas plantadas exclusivamente para produção de silagens. Nesse caso, há necessidade de adição de produtos que melhorem as condições de fermentação e permitam um produto final de boa qualidade.
4.Custo de produção
O custo de produção para a silagem de milho ou sorgo depende muito dos cuidados tomados com o plantio e da eficiência agrícola na técnica adotada para o cultivo. Apenas para se ter uma idéia da variabilidade alcançada pela maior ou menor eficiëncia do plantio, o custo de uma tonelada de matéria verde ensilada pode variar entre R$16,00 e R$ 40,00, ou mais. O Quadro abaixo mostra claramente a influência da eficiência agrícola sobre os custos de produção do milho utilizado para produção de silagem.
Em recente informação deste mesmo Boletim do Leite publicado em fevereiro deste ano, o Prof. Luiz Gustavo Nussio afirma que as alterações cambiais mexeram profundamente nos preços de alguns insumos, que associado a novos critérios para avaliação das operações e redução do nível de produtividade considerada trouxeram mudanças significativas nos custos finais da silagem de milho, chegando-se a valores de R$ 39,70 / tonelada de matéria original e R$ 124,06 / tonelada de matéria seca. Considerou-se uma produtividade média de 12 t de MS / hectare, 32% de matéria seca e perdas de 15% no processo. É importante lembrar que estes custos envolvem os insumos, os investimentos, preparo de solo, plantio, tratos culturais, colheita, ensilagem, descarga (desensilagem) e distribuição aos animais.
Em busca da eficiência
A maior eficiëncia pode ser atingida, em um primeiro momento, pela escolha da cultivar, dependendo das características geográficas e climáticas de cada região. A planta ideal deve ter uma boa quantidade de grãos em sua espiga ou panícula, aliando assim um considerável volume de massa verde com um alto valor nutritivo. Baseado nas análises de fertilidade dos solos realizadas nos últimos meses, fazer as devidas correções com o uso de calcário para que a cultura possa exteriorizar todo o seu potencial genético. A época de plantio poderá variar nas diferentes regiões e em função das características das cultivares escolhidas.
Cultivares híbridas
A evolução das cultivares híbridas de milho e sorgo também tem se apresentado como um ponto decisivo para adoção deste tipo de ensilagem. Para o milho, estes avanços já são obtidos a muitos anos, porém, para o sorgo, pesquisadores conseguiram desenvolver recentemente, após anos de pesquisa, híbridos com altura entre 2 e 2,6 metros, com um quantidade de grãos muito maior em sua panícula. Esses sorgos são denominados comercialmente de duplo propósito (ou silageiros) e podem ser considerados similares aos melhores milhos para silagem.
Um dos maiores indicadores de que o sorgo tem ganho a confiança dos pecuaristas de todo o Brasil na alimentação animal é o aumento da produção nacional dos seus híbridos silageiros. Em 91, cerca de 55 mil hectares foram ocupados com plantações de sorgo para silagem, enquanto que em 98 esse número já saltou para próximo de 155 mil hectares. Quase 200% de crescimento.
COMENTÁRIO: É evidente que se o pecuarista busca eficiência e lucratividade, deve planejar adequadamente todas as suas atividades agrícolas, e isso significa de um modo simplista, fazer tudo com antecedência. A opção por milho, sorgo ou girassol como cultura para silagem deve ser feita em função da sua adequação com a fertilidade do solo, época de plantio, finalidade de uso (categoria animal e exigência nutricional), condições climáticas e uso ou não de irrigação. Avaliando-se essas características, na maioria das vezes chega-se à conclusão de que a melhor alternativa para os diversos sistemas de produção é o aproveitamento de todas essas espécies, explorando as melhores características de cada uma, em função do potencial dos solos e das épocas disponíveis para plantio. Nesse momento em que o pecuarista busca soluções inteligentes para driblar a escassez de recursos e a melhoria de produtividade do seu rebanho, uma silagem com alta qualidade e baixo custo é uma boa forma de aumentar lucros e manter o rebanho engordando ou produzindo leite. Afinal de contas, um boi que chega mais rápido ao ponto de abate ou uma vaca que produz mais leite, aumenta a probabilidade de lucro certo do criador.
Referência: Mezzena, A. G.; Demarchi, J.J.A.A. A hora certa para pensar em silagem. A Nata do Leite – Informativo de mercado da Pecuária Leiteira, No. 22, dezembro de 1999, p. 02. (Scot Consultoria).