Abalada pelos casos de doença da vaca louca, a Europa assiste alarmada ao avanço da febre aftosa sobre os rebanhos e ao embargo generalizado das importações de carne da região por outros países. Ontem, a agência da ONU que trata de agricultura e alimentos, a FAO , emitiu uma nota dizendo que nenhum país pode se considerar livre do risco de ser atingido pela doença e recomendando medidas mais duras de controle. A Comissão Européia protestou contra o que chamou de “reação exagerada” de países que estão suspendendo as importações. É o que informa reportagem de Maria Luiza Abbott, publicada hoje no Valor Online.
A FAO reconheceu que houve progresso “substancial” nas últimas décadas em regiões do sul da América Latina, do Norte e América Central, além de países do Pacífico que poderiam se considerar livres da doença, como era o caso da Europa e Sul da África. Lembrou, porém, que “nenhum país pode se considerar livre do risco da doença, devido ao aumento do comércio internacional, do turismo e da movimentação de animais” e recomendou medidas adicionais.
Uma das prioridades para a FAO é que sejam mais rigorosos os controles sobre a importação de qualquer tipo de alimentos, inclusive “aqueles levados por viajantes e restos de aviões e navios”. Além disso, na lista da Organização, pede reforço geral de medidas de fiscalização, com campanhas de alerta para veterinários, empresas de transporte e setor agrícola; aumento do controle nas fronteiras, especialmente de caminhões e turistas voltando de regiões infectadas; preparação de planos de contingência, incluindo medidas para destruição de carcaças e para fornecimento de vacinas “.
A própria FAO também preparou panfletos para informar viajantes e companhias de transporte, em várias línguas. A nota alerta para o alto risco de que o vírus possa ser transmitido no processo de alimentação de porcos com restos de comida. “Suspeita-se que essa seja a origem provável da entrada do vírus na África do Sul e no Reino Unido”, diz.
Com a doença se alastrando, chega a quase 90 o número de países consumidores de carne do mundo que suspenderam as compras da Europa para tentar evitar o contágio. Seguindo o exemplo dos Estados Unidos, o Canadá anunciou ontem o embargo da importação de toda a carne da União Européia e pôs em quarentena tudo o que já foi importado desde 21 de fevereiro. Austrália e Nova Zelândia suspenderam as compras de animais vivos, carne e derivados de leite. O Japão, as importações da França que, na véspera, encontrara o primeiro caso da doença.
Outros países, incluindo Marrocos, Tunísia, Eslováquia e Hungria, suspenderam não apenas as importações de carne, leite e animais, como também as compras de outros produtos agrícolas, inclusive cereais. As medidas provocaram a reação da Comissão Européia, que considera exagerada a suspensão das compras da Europa. A Comissão diz que deveria ser dado tratamento diferenciado para os países que ainda estão livres da aftosa.
David Byrne, comissário da União Européia, indicou que o caso poderá ser levado para a organização Mundial da Saúde. A UE, por sua vez, suspendeu as compras de carne da Argentina. Dentro da própria UE, cada país está correndo para se proteger do outro, suspendendo as compras.
O ministro das Reservas Naturais da Irlanda, Hugh Byrne, atacou o governo britânicos pela maneira com que está lidando com a crise. Irritado, chamou o Reino Unido de ” o leproso da Europa ” , pois além da aftosa, a doença da vaca louca também se originou no país. No interior da França, qualquer um com sotaque inglês deixa de ser bem vindo. O governo britânico, porém, adotou medidas extremas para controlar a doença, incluindo a incineração de milhares de ovelhas grávidas. Mesmo assim, o número de casos cresce dia a dia e o governo está sendo pressionado a adiar as eleições gerais.
(Por Maria Luiza Abbott, para Valor Online, 15/03/01)