As notícias dos últimos dias sobre a cadeia da carne bovina concentraram-se no surgimento de focos de aftosa na Argentina e o envolvimento do Paraguai como país originário. As consequências desses focos foram a imediata interrupção das exportações argentinas para mercados recentemente abertos que exigem certificados de livre de aftosa sem vacinação, que praticam preços mais altos do que a média do mercado internacional. Além dos prejuízos econômicos, volta à cena a questão de credibilidade dos países da América Latina quanto à responsabilidade e competência na erradicação e controle de doenças já erradicadas e ou controladas em outros países e continentes.
Além das medidas de curto prazo anunciadas como interrupcão de importações de animais vivos sem sorologia, de carne com osso, e de medidas de fiscalização rígidas e penalidades severas, deve-se imediatamente criar mecanismos eficientes e reforçar os existentes no sentido de planejar e gerenciar o controle de doenças e em especial da febre aftosa na América do Sul como um todo. Não é possível isolar países, regiões dentro de países e mesmo regiões englobando vários países no continente sul amenricano por duas razões principais: primeira devido às extensas fronteiras difíceis de serem fiscalizadas, e segunda pelas diferenças de preços da carne entre países levando à tentação do lucro fácil através do comércio ilegal. Quem do agronegócio da carne bovina na América do Sul não tinha conhecimento dos problemas de febre aftosa no Paraguai. Embora com comentários insinuantes, porque era (é?) aceita a condição do Paraguai como livre de aftosa sem vacinação mesmo depois dos problemas que ocorreram há mais ou menos 3 anos na fronteira com o Mato Grosso do Sul? Agora surge novo problema com foco de aftosa em região da Argentina também de fronteira com o Paraguai, e de exames sorológicos positivos no próprio Paraguai. As autoridades e os produtores paraguaios seriam os únicos culpados dessas ocorrências? Claro que não na nossa opinião. Culpados e responsáveis são todos aqueles que compactuaram com a condição do Paraguai como zona livre de aftosa sem vacinação sabendo dos problemas que estavam ocorrendo. Uma possível confirmação da hipótese de que os exames sorológicos deram positivos devido à vacinação feita no Paraguai, considerando que este país é considerado livre de aftosa sem vacinação, pioraria mais a situação de credibilidade, pois levantaria a suspeita de que essa vacinação sem exigência legal teria sido feita para combater possíveis focos de aftosa. Todo mundo sabe que doenças não respeitam fronteiras, principalmente quando aspectos culturais, sociais e econômicos estão presentes.
Em comentários anteriores, principalmente no de 04/08, abordamos as possíveis providências que deveriam ser tomadas para planejar e gerenciar um programa efetivo de controle e eventual erradicação da febre aftosa no Brasil, que achamos serem igualmente aplicáveis em nível de continente sul americano. O ponto importante é evitar que muitos arquem com a maioria dos sacrifícios em benefíco de uma minoria que colhe todos os benefícios. Mecanismos de compensação têm que ser estabelecidos para que tanto os sacrifícios como os benefícios sejam compartilhados por todos: países, regiöes, estados, produtores e consumidores.
A falta de um plano estratégico, abrangente e bem gerenciado para controle e erradicação da febre aftosa tem causado e vai causar a curto e médio prazos prejuízos enormes a todos os componentes do agronegócio da carne bovina sul americana. As interrupções das exportações argentinas, mesmo que em quantidades não muito grandes, podem provocar baixas de preços para os produtores dos países vizinhos sem beneficiar os consumidores. Sem um controle rigoroso dos fluxos de importação/exportação e de mecanismos de compensação, aumentarão os riscos de surgimento de novos focos, principalmente nas regiões fronteiriças. O descrédito dos mercados que estavam sendo abertos pela Argentina e que tinham pontencial para absorção de carne brasileira e de outros países da América do Sul, vai diminuir a velocidade e a extensão de exploração desses mercados em futuro próximo.
Em contraste com os enormes prejuizos às economias agrícolas da América Latina, estão os lucros não esperados para países organizados e eficientes no controle de doenças como a Austrália, e provavelmente a Nova Zelândia.
Acreditamos nas previsões de que o Brasil como país, e da América do Sul como o continente, tornarem-se os maiores exportadores de carne bovina do mundo, desde que alcancemos os níveis de competência e seriedade requeridos para tal. Austrália e Nova Zelândia poderiam servir como exemplo.