O intervalo entre partos é um importante parâmetro para analisarmos a produção na pecuária de corte. O rebanho brasileiro de corte possui aproximadamente 48 milhões de matrizes com uma produção anual de 35 milhões de bezerros, com intervalo entre partos de 20 meses (ANUALPEC, 1999).
Esses números permitem concluir que ainda existe uma grande necessidade de reduzir o intervalo entre partos. O intervalo ideal estaria próximo de 365 dias, implicando que as fêmeas tenham em torno de 85 dias para voltar a ciclar e conceber. O anestro pós parto é um anestro considerado “fisiológico”, onde estão ocorrendo vários processos como a limpeza e a involução uterina. Diversas causas podem estar envolvidas no aumento deste período, como estação de nascimentos, nutrição inadequada, manejo reprodutivo e problemas com os reprodutores ou na inseminação artificial. Neste período, ocorre a reestruturação dos tecidos do útero e o retorno à atividade cíclica dos ovários.
Dos vários fatores que interferem no período de anestro pós-parto, o aspecto relacionado à nutrição e interações mãe-cria são os mais importantes. O estado nutricional das fêmeas tem grande importância, sendo mais importante no pré do que no pós-parto no aumento do anestro pós-parto (RANDEL, 1990; DISKIN, 1997).
Os bovinos e demais ruminantes possuem a capacidade de armazenar energia em períodos de alta disponibilidade e utilizá-la em períodos de escassez. Além disso conseguem transformar forragens de baixa qualidade em produtos aproveitáveis na sua nutrição.
Durante a gestação ocorre um aumento gradativo nas exigências nutricionais e uma diminuição da capacidade de ingestão em conseqüência do desenvolvimento fetal. Logo após o parto, a lactação aumenta ainda mais as exigências nutricionais da mãe, que dificilmente conseguirá supri-las. Com isso, a fêmea pode entrar em balanço energético negativo suprimindo, assim, as atividades reprodutivas.
Devido à intensidade e freqüência das mamadas, certo grau de anestro é observado, podendo se agravar em situações de deficiência nutricional, particularmente em novilhas de primeira cria.
Ao serem absorvidos, os nutrientes são direcionados a determinadas prioridades estabelecidas. São elas:
* Metabolismo basal
* Atividades (andar, deitar etc.)
* Crescimento
* Reservas básicas de energia
* Gestação
* Lactação
* Reservas adicionais de energia
* Ciclos estrais e ovulação
* Reservas de excessos
Esta seqüência pode ser mudada dependendo das funções presentes e em que níveis se apresentam (SHORT et al.,1990). Por essa seqüência de prioridades observamos que o animal só direcionará nutrientes para a atividade reprodutiva quando todas as prioridades anteriores tiverem sido atendidas.
Baixos níveis nutricionais são conhecidos como deletérios no retorno da atividade ovariana pós-parto (DUNN e KALTENBACH, 1980). A subnutrição afeta a atividade cíclica ovariana de vacas pós-parto, aumentando o intervalo entre o parto e o primeiro estro. O mecanismo mais provável de inibição da atividade reprodutiva seria a supressão da liberação dos picos de LH pela hipófise anterior, que é controlada pela liberação de GnRH no hipotálamo (RANDEL, 1990). A nutrição inadequada irá afetar o tamanho do folículo dominante, que após a ovulação, originará o embrião (MURPHY et al., 1990).
Energia
Dietas deficientes em energia ingerida e baixa condição corporal aumentam os efeitos inibitórios da mamada sobre a atividade ovariana. Vacas recebendo dietas com baixos níveis de energia ou de proteína, ou dos dois, apresentam diminuição na capacidade de resposta do hipotálamo ao estradiol. Isso sugere que a capacidade do hipotálamo de responder ao estímulo do estradiol é alterada pelo estado nutricional do animal (RANDEL,1990).
Diferentes níveis de energia não afetaram o peso das vacas à desmama ou a taxa de concepção. No entanto, o período entre o parto e o primeiro cio foi drasticamente reduzido (DUNN e KATENBACH, 1980). Os mesmos autores desenvolveram uma equação de regressão relacionando o status energético representado pela condição corporal com desempenho reprodutivo. Quando não houve perda de peso no pré-parto, 91% das multíparas e 64% das primíparas apresentaram cio em até 60 dias pós-parto, com intervalo médio parto-primeiro cio de 47 dias para as multíparas e de 54 para as primíparas. A condição nutricional é mais importante no pré-parto do que no pós-parto na determinação do intervalo entre partos. Isso ocorre devido ao fato das fêmeas terem maior capacidade de ganho de peso no pré-parto, quando possuem melhor conversão alimentar.
O intervalo entre partos diminui com o aumento do nível de nutrientes ingeridos tanto no pré quanto no pós-parto (RUTTER e RANDEL,1984). O efeito supressivo do estímulo da amamentação sobre a atividade ovariana durante o período pós-parto é menos pronunciado em animais com moderada condição corporal ao parto ou em animais que não têm uma drástica perda de peso pós-parto (BOLANOS et al.,1996).
Condição corporal é um bom indicador do status energético e da probabilidade de reconcepção, porém deve-se ter cuidado ao utilizar esses parâmetros, pois os mecanismos pelos quais esse indicador influi no desempenho reprodutivo ainda não estão bem elucidados.
Quantidades inadequadas de energia durante o período final de gestação levarão a baixas taxas de concepção, mesmo com a correção da ingestão no pós-parto. A continuidade de deficiência energética no período pós-parto diminuirá ainda mais as taxas de concepção. Fêmeas com restrição de energia durante o período pós-parto levam a taxas de prenhez ao redor de 50 a 76%, enquanto fêmeas corretamente alimentadas terão 87 a 95% de prenhez. O balanço energético tem grande influência sobre as taxas de prenhez em vacas com bezerro ao pé, e a condição corporal ao parto juntamente com os nutrientes presentes na dieta pós-parto poderão influenciar diretamente a reconcepção dessas fêmeas (RANDEL, 1990). A suplementação pré-parto poderá proporcionar melhor condição corporal para as fêmeas no início da próxima estação de monta, diminuindo assim o intervalo entre partos.
STAGG et al., (1995) estudaram o desenvolvimento folicular em vacas de corte suplementadas com dois níveis de energia e não observaram diferença no intervalo parto-primeira onda folicular, mas diferenças significativas no número de ondas foliculares até a primeira ovulação, que foram de 6.8 ( 1.2 ondas para o alto nível de energia e de 10.6 ( 1.2 ondas para o baixo nível. Os autores observaram também uma diminuição no intervalo parto-primeira ovulação nas fêmeas tratadas com alto nível de energia.
Proteína
A proteína ingerida pré e pós-parto influencia as taxas de prenhez de fêmeas bovinas. Vacas com quantidades inadequadas de proteína tanto no pré como no pós-parto tiveram taxas de prenhez de 32% em relação a 74% das fêmeas que ingeriram quantidades adequadas de proteína (SASSER et al., 1989). Esses resultados nos mostram a influência da proteína sobre os aspectos reprodutivos das vacas de corte. Quando, na dieta, existe deficiência de proteína degradável no rúmen, a ingestão de matéria seca diminui, diminuindo tanto a ingestão de energia como a disponibilidade de proteína para o animal.
Provavelmente, o ponto de influência da nutrição na atividade ovariana esteja localizado no eixo hipotálamo-hipofisário (RANDEL, 1990). O aumento da glicose sanguínea leva ao aumento da liberação de GnRH e consequentemente de FSH e LH. Portanto, as mudanças na gliconeogênese têm grande importância no desempenho reprodutivo.
As funções específicas e os mecanismos pelos quais a nutrição influi na reprodução são muito difíceis de serem elucidados devido ao fato dos nutrientes requeridos para a atividade reprodutiva serem também necessários a funções fisiológicas do organismo.
Aditivos
Os ionóforos têm sido o principal aditivo utilizado em rações na tentativa de diminuir o intervalo entre partos de vacas de corte. A utilização de ionóforos na nutrição de vacas de corte tem mostrado bons resultados quando utilizados em situações em que há um intervalo entre partos elevado. Fêmeas, com moderado período de serviço (60 a 85 dias), alimentadas com ionóforos tem relativa melhora nesses valores (HARDIN e RANDEL, 1983). Vacas com elevado período de serviço mostraram melhor resposta à utilização de ionóforos na dieta (MASON e RANDEL, 1983), citados por RANDEL, (1990). Alguns trabalhos descrevem resultados em que ocorre diminuição nos parâmetros reprodutivos, porém sem valores estatisticamente significativos.
A melhora nos aspectos reprodutivos de vacas de corte com a utilização de ionóforos na alimentação deve estar relacionada ao aumento na disponibilidade de energia da dieta causada por esses produtos.
CONCLUSÃO
Vários fatores irão atuar no intervalo entre partos, no entanto, não podemos nos esquecer da condição nutricional dessas fêmeas, pois estes são fatores limitantes à reprodução. Já é conhecido que todos os fatores relacionados ao anestro pós-parto não atuam isoladamente, porém a nutrição e a amamentação são os mais importantes e devem ser levados em consideração no manejo de fêmeas de corte.
Os mecanismos endógenos pelos quais a amamentação inibe a atividade reprodutiva de vacas de corte pós-parto ainda não estão totalmente claros. Está demonstrado que existe uma interação de vários fatores para que ocorra a inibição do cio.
Referências Bibliográficas:
ANUALPEC-Anuário da pecuária brasileira, p.104-108, ed. Argos Comunicação, São Paulo, 1999.
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HARDIN, D.R.; RANDEL, R.D. Effects of monensin on postpartum interval to first estrus and serum LH response to 0, 1, 2, or 4 mg estradiol 17 beta at 21 days postpartum. Theriogenology, v.19, p.343-354, 1983.
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SASSER, R.G.; WILLIAMS, R.J.; BULL, R.C.; RUDER, C.A.; FALK, D.G. Postpartum reprodutive performance in crude protein restricted beef cows: return to estrus and conception. J. anim. Sci., v.66, p.3033-3039, 1989.
SHORT, R.E.; BELLOWS, R.A.; STAIGMILLER, R.B.; BERARDINELLI, J.G.; CUSTER, E.E. Phisiological mechanisms controlling anestrus and infertility in postpartum beef cattle. J. anim. Sci., v.68, p. 799-816, 1990.
STAGG, K.; DISKIN, M.G.; SREENAN, J.M.; ROCHE, J.F. Follicular development in long anoestrous suckled beef cows fed two levels of energy postpartum. Anim.reprod.Sci., v.38, p.49-61, 1995.