A prática de conservação de forragens sob a forma de silagem é uma das mais difundidas e seu uso tem sido crescente. À medida que a exploração pecuária se torna mais tecnificada, a procura de melhores índices zootécnicos e rentabilidade econômica tem levado um grande número de produtores de leite e de corte em confinamento e adotarem sistematicamente essa prática.
Dentre os fatores que têm determinado este crescimento podemos citar o bom valor nutritivo do alimento conservado, cultura totalmente mecanizada, menor custo da maquinaria quando comparado com o de fenação, possibilidade de obtenção de grande volume de alimentos, uso mais intensivo da terra e relativo domínio da técnica pelos produtores. Contrariamente, muitos produtores alegam que os custos são muito elevados (30 a 60 US$/t matéria original ensilado), fato este normalmente correlacionado principalmente com baixa produtividade. Na verdade os custos de produção giram ao redor de 16 a 22 US$/t matéria original..
O sorgo ocupa aproximadamente 10 a 15% da área plantada para ensilagem no Brasil, mas tem crescido muito nos últimos anos, tanto para produção de grãos quanto de silagens, bem como o número de híbridos e variedades colocados nos ensaios de avaliação e no mercado nacional. Mas apesar de ainda não responder por grande parte da área plantada, o sorgo é uma cultura que produz silagens com boas características fermentativas e depois do milho é a cultura anual mais importante para produção de silagem, variando de 72 a 92% do valor nutritivo do milho quando fornecido como único volumoso ou 85 a 90% quando ingrediente de uma dieta.
Devido à sua maior produtividade em condições adversas, principalmente deficiência hídrica e menor fertilidade do solo, a cultura do sorgo deveria ser mais freqüente em condições de baixa tecnologia, onde o milho levaria desvantagens. Além disso, a variabilidade dentro da espécie é muito grande, havendo, portanto, a oportunidade de se explorar o seu enorme potencial genético, que muito tem a contribuir para o desenvolvimento da pecuária nacional.
Origem e distribuição do sorgo
O sorgo (Sorghum bicolor (L.) Moench) tem como provável centro de origem a região central do continente africano, mais especificamente o Sudão, em função da grande diversidade de formas selvagens encontradas naquela localidade. Após a sua descoberta na África, a cultura se expandiu para a Arábia, Índia e China. Por ser uma espécie recentemente domesticada pelo homem ainda é pouco estudada e com grande diversidade genética. A introdução do sorgo no Brasil é relativamente recente, tendo como porta de entrada o Rio Grande do Sul, sendo que desde o ano 1934 consta a entrada do sorgo número 38 no Instituto Agronômico de Campinas, mais tarde denominado como Variedade Santa Eliza.
No Estado de São Paulo, a cultura do sorgo para alimentação animal recebeu grande impulso a partir de 1959, com a execução do “Plano de Fazendas Piloto para melhoria da produção leiteira”, pelo Departamento de Produção Animal da Secretaria da Agricultura, onde foram distribuídas gratuitamente sementes da variedade Santa Elisa, cultivar de ciclo longo (160 a 170 dias), grande produtividade, colmo doce e baixa produção de grãos. É provável que devido à maior semelhança entre esta variedade e os diferentes cultivares de capim elefante do que com o próprio milho, além da presença da durrina na fase inicial de crescimento, provocou muitas reações negativas em termos de difusão e popularidade entre os pecuaristas, mantendo por muito tempo o sorgo à margem dos sistemas produtivos. A cultura do sorgo no Brasil teve significativa expansão a partir de 1970, difundindo-se nas regiões sul, sudeste, centro-oeste e nordeste do país, embora nesta última, ainda se constate uma reduzida área cultivada em relação ao elevado potencial que representa .
O sorgo pode ser cultivado para a produção de grãos e utilizado principalmente como ingrediente nas rações para aves, suínos e bovinos. Na África e na Ásia, a maior parte do sorgo é utilizado na alimentação humana. A Índia, detentora da maior área cultivada do mundo, tem neste cereal base da dieta alimentar de sua população.
O sorgo pode ainda ser utilizado para produção de álcool, confecção de vassouras e produção de forragens, tanto para pastejo como para conservação na forma de feno ou silagem. Onde é encontrado, o sorgo é cultivado preferencialmente em áreas com menor disponibilidade de água do que aquelas destinadas ao cultivo do milho. Aliado a este fator, essa cultura é menos sujeita a roubo em áreas cultivadas próximas a centros urbanos do que o milho, embora suscetível ao ataque de pássaros por possuir grãos expostos.
A cultura do sorgo ainda não atingiu produção suficiente de grãos para que haja maior interesse das indústrias de rações, pois exigem que o ingrediente seja fornecido de modo contínuo e seguro para evitar problemas nas formulações e aparência das rações. Cria-se, então, um ciclo vicioso onde as fábricas não usam porque a produção é baixa e descontínua e não há produção porque o mercado é restrito e o preço mínimo tem-se mantido abaixo do estabelecido para o milho, tanto internamente como no mercado mundial. Isso tem prejudicado sua utilização também como forrageira para alimentação de ruminantes, principalmente na forma de silagem. Atualmente o quadro está se alterando favoravelmente através de parceiras entre produtores de aves e suínos e agricultores interessados na cultura, resultando num aumento significativo da área plantada dessa cultura no Brasil.
Os sorgos de maior interesse podem ser agrupados em dois grandes grupos:
I – Graníferos, cultivados com a finalidade de produção de grãos para a alimentação humana ou animal ou produção de amido, óleo comestível e industrial, álcool, cerveja, cera e outros. É uma planta amplamente estudada e melhorada, apresenta o caráter braquítico (plantas baixas, normalmente inferiores a 1,6 m), o que favorece substancialmente a condução e a colheita de suas lavouras;
II – Forrageiros, com ciclos mais longos e alturas superiores a 2m, vigorosos e com grande capacidade de produção de matéria verde. Subdividem-se em:
a- Forrageiros com baixa produção de grãos e baixo teor de açúcares solúveis, bastante utilizados para conservação na forma de silagem. Possuem altura próxima ou superior a 3m;
b- Forrageiros com baixa produção de grãos, alta porcentagem de açúcares solúveis e altura próxima ou superior a 3m, denominados sacarinos, os quais apresentam colmos com níveis de sacarose entre 10 e 14% e açúcares redutores, o que possibilita a sua industrialização para a produção de álcool etílico. Os colmos fornecem um caldo rico em açúcares fermentecíveis e os grãos, pelo processo de sacarificação, podem transformar seu alto teor de amido em significativas quantidades de açúcares mais simples e passíveis de fermentação, constituindo-se interessante matéria-prima de entresafra para as usinas produtoras de álcool. Grande parte dos cultivares são sensíveis ao fotoperíodo e adaptados para regiões entre 25 e 35 gráus de latitude. Também podem ser utilizados para confecção de silagem, sendo que a maior quantidade de açúcares solúveis no colmo pode favorecer o estabelecimento de fermentação adequada, resultando em melhor valor nutritivo do material ensilado, contudo, a porcentagem de grãos é menor. Muitos autores consideram esse grupo independente dos forrageiros;
c- Forrageiros com boa produção de grãos e menor altura (entre 2,0 e 2,5m), denominados de duplo propósito. Podem ser utilizados tanto para produção de silagem de alto valor nutricional, devido às maiores porcentagens de grãos, como utilizados para produção exclusiva de grãos. Atualmente também estão sendo denominados de silageiros;
d- Forrageiros com pequena porcentagem de grãos (normalmente muito pequenos) e panículas abertas e bem ramificadas, denominadas de tipo vassoura. Suas panículas são utilizadas para fabricação de vassouras e escovas. O grão que sobra da confecção das vassouras pode ser utilizado na alimentação de ruminantes mas deve ser moído para melhorar a sua digestibilidade, que é baixa pela pequena porcentagem de amido. Além do S. bicolor também são citados para fabricação de escovas e vassouras a espécie Sorghum technicus, vulgarmente denominada de piaçaba.
e- Forrageiros especializados para pastejo, corte ou fenação, denominados de sorgo ou capim sudão (Sorghum bicolor subespécies sudanense ou mais atualmente Sorghum sudanense (Piper) ou seus híbridos com o sorgo ). Com relação aos outros tipos apresentam um colmo fino, mais favorável ao processo de fenação.
COMENTÁRIO: O primeiro ponto a ser salientado é a grande diversidade de sorgos existentes e o potencial genético a ser explorado. Fica evidente também, e isso não têm acontecido com freqüência, que há necessidade de certos cuidados quando compararmos o sorgo com outras culturas para silagem, principalmente o milho, já que poderemos estar nos referindo a sorgos que apresentam características muitos distintas daquelas indicadas para esse fim, sendo que apenas o tipo duplo propósito ou silageiro é o que apresenta características similares. Qualquer outro tipo deve ser sempre comparado com ressalvas. Um segundo item que vem chamando a atenção é o incremento de área plantada com essa cultura nos últimos anos através de esforços da iniciativa privada e de instituições de pesquisa.
Fonte: Demarchi, J.J.A.A.; Boin, C.; Braun, G. A cultura do sorgo (Sorghum bicolor L. Moench) para a produção de silagens de alta qualidade. Zootecnia, v. 33, n.3, p.111-136, 1995.