Os exportadores de carne bovina decidiram contratar um escritório de advogados dos Estados Unidos especializado em comércio internacional para questionar o embargo canadense ao produto brasileiro sob o pretexto de falhas na detecção do mal da vaca louca no país. A intenção é exigir uma indenização por danos à imagem da carne nacional e até mesmo possíveis lucros cessantes nos casos dos transportadores de cargas internacionais. É o que informa reportagem de Mauro Zanatta e Alda do Amaral Rocha, publicada hoje no Valor Online.
Apesar do fim do embargo decretado na última sexta-feira, os empresários do setor têm certeza de que as autoridades canadenses passaram por cima de suas próprias leis. Por isso, orientados pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), pedirão indenização pelo embargo na própria Justiça do Canadá. Além disso, os exportadores decidiram entrar com outra ação judicial paralela para questionar a medida em organismos internacionais como a Organização Mundial do Comércio (OMC).
“Vamos usar as facilidades do Programa Especial de Exportação (PEE) da Camex para auxiliar nestas ações”, diz Ênio Marques, diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carnes (Abiec).
Num outro movimento estratégico para recuperar a imagem do produto brasileiro no exterior, os exportadores resolveram aproveitar as negociações para a revisão do grau de risco do gado brasileiro na União Européia para oferecer um almoço a 40 grandes importadores e dirigentes europeus do setor de carnes. A idéia é oferecer, como aperitivo do almoço no próximo final de semana em Bruxelas, informações definitivas sobre o sistema de vigilância sanitária e diagnóstico da vaca louca no país, além do completo rastreamento dos animais importados de Itália e Alemanha, os mais recentes focos do mal da doença na Europa.
Nesse esforço para reaver a confiança no mercado externo, estarão presentes diretores dos maiores frigoríficos nacionais como Bertin, Friboi, Independência e Minerva. “Temos que conversar com os importadores. Lá, ficou a impressão de desorganização do nosso sistema”, afirma o diretor da Abiec.
Segundo Edivar Vilela, presidente da Abiec, a decisão do Nafta de retomar as compras do Brasil, após a visita de uma missão ao país, é um aval para a carne nacional. Vilela afirmou que a meta do setor de exportar US$ 1 bilhão este ano está mantida. “Vamos trabalhar para vender a carne brasileira nas regiões antes atendidas por países da Europa”.
O presidente da Abiec avalia que há um espaço a ser preenchido na própria Europa, já que o surgimento de casos de vaca louca no continente fez recuar o consumo de carne bovina.
Pedro de Camargo Neto, presidente do Fundo de Desenvolvimento da Pecuária (Fundepec), também acha que o momento é bom para o Brasil. Ele ressaltou, porém, que o país errou ao não enviar a documentação sobre o gado dentro do prazo para o Canadá. Camargo Neto considera, contudo, que houve “má vontade” do Canadá por conta do contencioso Embraer-Bombardier.
Os Estados Unidos foram os primeiros a anunciar o fim do embargo na sexta-feira passada. Cerca de uma hora depois, o Canadá também suspendeu a proibição. “Desde o primeiro momento, houve boa vontade dos Estados Unidos, mostrando que não queriam se envolver numa briga comercial entre Brasil e Canadá”, disse Camargo Neto.
Apesar de considerar que não há evidência de BSE no Brasil, para levantar a proibição, os EUA impuseram três condições para que a carne brasileira possa entrar no país: necessidade de comprovar que o produto é proveniente de animais nascidos e criados no Brasil; que a carne é proveniente de gado nascido depois de 1996, quando o Brasil proibiu o uso de ração com proteína animal; e que o gado foi alimentado apenas com pasto.
No governo, a sensação é de que o saldo do embargo foi positivo e o fim da restrição ocorreu num momento favorável ao produto nacional. “Ao levantar a medida, os países do Nafta (Canadá, EUA e México) deram um certificado de qualidade à carne brasileira”, avalia o embaixador José Alfredo Graça Lima, chefe da área econômica do Itamaraty.
Ênio Marques e o secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Luiz Carlos Oliveira, embarcam hoje para Bruxelas na tentativa de reduzir o nível de risco do rebanho brasileiro e vender uma boa imagem para o sistema de diagnóstico da vaca louca. Hoje, o gado nacional está classificado como “risco 2” pelo Comitê Científico da União Européia – o mesmo nível do rebanho dos Estados Unidos. A tentativa é influenciar na confecção do relatório final sobre o sistema brasileiro. No final deste mês, o Brasil pode ganhar a classificação “risco 1” junto com o rebanho argentino e australiano.
Ao mesmo tempo que o governo brasileiro tenta convencer os técnicos europeus, os empresários terão algumas rodadas de negociação com os parceiros locais. “Vamos farejar o que os importadores esperam de nós. Em vez de correr atrás de doenças, daremos um tratamento fundamental à saúde do nosso rebanho”, afirma Marques.
(Por Mauro Zanatta, Alda do Amaral Rocha, com a colaboração de Denise Chrispim, para Valor Online, 28/02/01)